Coronavírus: Imunizante da farmacêutica Pfizer precisa ser armazenado em temperatura de -75 ºC. "Nosso programa nacional de imunizações não está preparado para esse tipo de vacina", diz diretora da SBIm
Giulia Granchi, Viva Bem
Os resultados de testes de duas vacinas com a tecnologia RNA levantaram os ânimos de pessoas em diferentes partes do mundo, que assim como a maioria de nós, estão ansiosas por um imunizante contra o novo coronavírus (Sars-CoV-2).
As criações das farmacêuticas Moderna e Pfizer mostraram ter 95% de eficácia. No entanto, as temperaturas para o armazenamento devem ser baixíssimas: o imunizante da Moderna pede -20 ºC e o da Pfizer, produzida em parceria com a BioNTech, -75 ºC. As informações são do NPR.
As vacinas ainda não foram aprovadas no Brasil — nem em outros países — e não há acordo firmado com órgãos do governo, mas as especulações sobre como elas chegariam até nós já começaram.
“Se houver a possibilidade desse tipo de vacina ser disponibilizada na rede pública, nosso programa nacional de imunizações não está preparado”, explica Mayra Moura, diretora da SBIm (Sociedade Brasileira de Imunizações).
De acordo com Moura, após saírem dos laboratórios, as vacinas vão até um ponto de armazenamento central, que é de gestão federal e contém freezers preparados para atingir até -20 ºC. Mas, ao chegarem aos postos e salas de vacina, de gestão municipal, são armazenadas a 2 ºC a 8 ºC, que é o que permitem os equipamentos e o que pedem todas as vacinas que temos, tanto em rede pública quanto privada, atualmente.
Por que a necessidade de temperaturas tão baixas?
O motivo pelo qual a vacina precisa de temperaturas tão baixas é a sensibilidade da molécula usada como “transportadora” na tecnologia RNA, que embora já esteja em estudo para a criação de vacinas há mais de uma década, ainda não foi aprovada para nenhum imunizante —a corrida para acabar com a pandemia acelerou o processo colocando as criações com esse intuito à frente.
“Em laboratório, você cria uma sequência genética capaz de induzir a produção de proteínas parecidas com a do novo coronavírus e a insere em partículas lipídicas — que são muito delicadas, daí a necessidade da temperatura — e que possibilitam o transporte dessa sequência genética para dentro das células da pessoa vacinada. Quando a sequência genética entra na célula, ela induz a formação de uma proteína idêntica a uma proteína do coronavírus. O sistema imunológico reconhece essa proteína e gera células de defesa ou anticorpos, uma defesa que protege o organismo da infecção real”, indica Flávio Guimarães da Fonseca, virologista do Centro de Tecnologia de Vacinas e pesquisador do Departamento de Microbiologia da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais).
O cientista esclarece, ainda, que embora algumas pessoas temam que a vacina possa alterar o DNA humano por conter sequenciamento genético, ela não tem esse poder. “As informações dos humanos estão no DNA. Para o vírus, o genoma é o RNA, que embora entre dentro das nossas células, não muda nosso DNA, são moléculas incompatíveis”, esclarece Fonseca.
Tecnologias já estão sendo pensadas
Em comunicados, representantes da Pfizer afirmaram que estão criando soluções para viabilizar o transporte e armazenamento de sua vacina, já que, por não existir outra imunização que necessite de temperatura tão baixa, também não há países completamente preparados.
No Brasil, os ultracongeladores, como são chamados os aparelhos capazes de estocar vacinas como essa, só são encontrados em laboratórios de empresas como farmacêuticas ou nas universidades.
Uma das tecnologias já citada pela Pfizer é a criação de compartimentos, mini-congeladores portáteis à base de gelo seco. “Não é uma solução trivial e ainda pode aumentar um pouco o preço da vacina. Além disso, é necessário pensar na produção de gelo seco. Não é uma etapa impeditiva, mas necessita de uma preparação logística”, opina Natalia Pasternak, pesquisadora e doutora em microbiologia pela USP (Universidade de São Paulo).
Por que há diferença entre os dois imunizantes?
A diferença de refrigeração necessária entre as vacinas da Moderna e da Pfizer, que utilizam a mesma tecnologia RNA, se explica por características da produção de cada laboratório.
“Depende de como se estabiliza a molécula, que tipo de nanopartícula lipídica é usada… São especificidades da manufatura de cada vacina”, explica Pasternak.
Aprovação da vacina de RNA será grande marco científico
Se alguma das vacinas que utiliza a tecnologia RNA for aprovada, ainda que não seja a primeira ou não chegue ao Brasil, representará um marco na ciência.
Isso por que os imunizantes são produzidos de forma bem mais rápida, fácil e até mais barata que os outros tipos que temos atualmente.
“A aprovação pode mudar a maneira como pensamos e produzimos vacinas daqui para a frente. Abre espaço e caminho para uma maneira mais rápida e eficiente de produzir vacinas versáteis, que só trabalham com sequências, sem precisar cultivar o vírus em laboratórios”, conclui Pasternak.
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