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Twitter pode banir Bolsonaro se adotar mesmos critérios aplicados a Trump

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Desde a última sexta-feira, o presidente dos Estados Unidos não conta mais com seu principal meio de comunicação: sua conta no Twitter. Bolsonaro pode ser o próximo alvo caso os mesmos critérios sejam adotados

Presidente Jair Bolsonaro ( Foto: Sérgio Lima / Poder 360 )

Guilherme Mendes, Congresso em Foco

Desde a última sexta-feira (8), o presidente dos Estados Unidos Donald Trump não conta mais com seu principal meio de comunicação: sua conta no Twitter. O acesso ao perfil, seguido até então por mais de 88 milhões de pessoas, foi banido pela rede social, e todas as postagens foram tornadas indisponíveis.

A decisão – de influência e repercussão inéditas – ajudou a derrubar as ações da empresa em até 12% nesta segunda-feira (11). Os perfis de Trump também foram banidos em redes como Facebook (que também controla o Instagram e também viu suas ações desvalorizarem), Snapchat, Twitch e outras.

A ação reforçou o debate sobre se a mesma medida poderá ser tomada contra outras autoridades.

Segundo o Twitter, a exclusão da conta do presidente americano foi motivada por dois tuítes escritos na última sexta (8), dois dias após a invasão do Capitólio.

“Os 75.000.000 de grandes Patriotas Americanos que votaram em mim, AMÉRICA PRIMEIRO e FAZER A AMÉRICA GRANDE NOVAMENTE, vão ter uma VOZ GIGANTE por muito tempo no futuro. Eles não serão tratados injustamente em nenhuma maneira, formato ou forma”

Em outra mensagem, Trump esclareceu outro ponto: “A todos aqueles que perguntaram, eu não irei à cerimônia de posse em 20 de janeiro”.

Para o Twitter, a menção do presidente à “VOZ GIGANTE por muito tempo no futuro”, assim como à garantia de que seus eleitores não seriam desrespeitados, seria uma forma do republicano afirmar que não facilitaria uma transição ordeira – como deu a entender no dia anterior.

Para a rede social, as publicações indicaram que Trump pretende proteger aqueles que acreditam que ele venceu a eleição. Os analistas do Twitter também viram na fala de Trump sobre a posse uma ameaça de que o evento não será seguro.

As mensagens de Trump seriam uma infração à “Política de Glorificação da Violência” da rede social: “não se pode ameaçar violência contra um indivíduo ou um grupo de pessoas. Nós também proibimos a glorificação da violência.”, diz a norma da plataforma.

A punição foi o capítulo mais relevante de uma ação de conflito entre o Twitter e Trump que começou em meados do ano passado. Para evitar que Trump se valesse de tweets para passar informações falsas ou distorcidas, a curadoria do site passou a incluir, nas próprias mensagens, comunicados contradizendo ou esclarecendo o que havia dito o presidente. Apenas na última semana que o Twitter passou a restringir o alcance das mensagens de Trump, impedindo que elas fossem curtidas, comentadas ou compartilhadas.

Em linhas gerais, a conta de Trump foi suspensa a partir de argumentos como o questionamento da legitimidade das eleições, indicação de uma transição conturbada e o possível encorajamento de atos violentos por parte de seus apoiadores. Todos esses ingredientes são pautas recorrentes no Twitter do presidente Jair Bolsonaro.

Trump dos trópicos

Poucas horas após a invasão do Capitólio, Bolsonaro reafirmou, novamente sem apresentar provas, que há fraudes no sistema eleitoral brasileiro e que se o voto impresso não for implementado, são grandes as chances de que se repita no Brasil o que aconteceu nos Estados Unidos.

A declaração foi dada a apoiadores em frente ao Palácio da Alvorada, não no Twitter. Porém, se Bolsonaro mantiver esse tom na rede social, estará afrontando diretamente temas que foram decisivos para a exclusão de Trump.

Além de questionar o resultado das eleições e indicar uma eventual transição conturbada, Bolsonaro já demonstrou, diversas vezes, no mínimo desconsiderar a regra de glorificação à violência – e aí dentro do próprio Twitter.

A rede social já tomou, anteriormente, ações contra o presidente Bolsonaro. Em março do ano passado, o Twitter apagou uma postagem do presidente que mostrava fotos suas em uma visita às cidades-satélites de Brasília. A plataforma tomou a decisão de excluir o conteúdo porque este iria contra os preceitos da saúde pública.

O Twitter também tomou medidas contra apoiadores próximos ao presidente: após uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), o site retirou do ar os perfis originais do presidente nacional do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), Roberto Jefferson e do empresário Luciano Hang, envolvido no Inquérito das Fake News. Roberto Jefferson – assim como outro aliado do presidente com contas banidas, o blogueiro Allan dos Santos – hoje usa uma conta alternativa, sem ser novamente cobrado pelas autoridades.

Na rede social, houve quem interpretasse os seguidos ataques de Bolsonaro à esquerda e à imprensa como um maneira de “ameaçar violência contra um indivíduo ou um grupo de pessoas”.

Ainda durante a campanha de 2018, o presidente buscou insinuar as intenções do Foro de São Paulo, organização de partidos de esquerda da América Latina. Para o presidente, os membros que integram o grupo são “este perigo que destrói o Brasil há décadas”. A imagem incluída na mensagem define o Foro como “o maior inimigo do Brasil”.

Outro dos alvos preferenciais de Bolsonaro é a imprensa. Neste caso, a animosidade do presidente com órgãos de comunicação tem apresentado resultados negativos tangíveis. De acordo com a ONG Repórteres sem Fronteiras, o Brasil integrava o rol de países com “situação problemática” em relação à liberdade de imprensa em 2019, o que fez com que o país caísse duas posições no ranking da entidade, indo para a 107ª posição.

“O ‘gabinete do ódio’ que cerca o presidente brasileiro publica ataques em larga escala a jornalistas que fazem revelações sobre políticas do governo”, aponta a RSF em seu relatório. “Desde o início da epidemia de coronavírus, Jair Bolsonaro redobrou seus ataques à imprensa, que ele considera responsável por uma ‘histeria’ destinada a gerar pânico no país.”

Foi pela rede social, que o presidente encontrou outra maneira de emperrar o trabalho da imprensa: bloqueando perfis de jornalistas no Twitter. O STF já iniciou o julgamento virtual sobre a questão no dia 13 de novembro do ano passado – mas um pedido de destaque do ministro Nunes Marques, indicado por Bolsonaro um mês antes, emperrou o julgamento. Enquanto a questão não é concluída pela suprema corte, um número incerto de profissionais da comunicação não pode acessar a conta presidencial.

Nova jurisprudência

Para o professor da Faculdade de Direito da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ) e membro do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio (ITS-Rio), Carlos Affonso de Souza, a decisão do Twitter gera um novo tipo de jurisprudência, com as regras de uso definidas pelas plataformas passando a ser mais conhecidas, aplicadas, e gerando com consequências representativas.

Se as empresas de tecnologias estariam grandes demais e poderosas demais, quem poderia detê-las?

“Primeiramente elas mesmas, com a aplicação coerente e transparente das próprias regras”, argumentou o professor. “Muitos destes cenários de ebulição que existem hoje são causados pelas próprias empresas, que transformaram o processo da moderação de conteúdo em uma coisa escondida, misteriosa, onde não se sabe quem faz, por que faz e como faz, nem onde está esta pessoa. Isso não pode ser um departamento escondido e terceirizado das companhias–ele precisa estar à frente.”

Quanto à capacidade de uma empresa poder silenciar parte ou todo o debate em um outro país, Carlos enxerga no caso Trump um prelúdio do que será o debate sobre a soberania digital – o principal tema no setor para os anos 2020, em sua opinião.

“O primeiro capítulo do debate sobre soberania digital virá quando o Twitter aplicar o ‘Efeito Trump’ em cima de um líder político de outro país”, advertiu. “Considerando que isso não será um caso de excepcionalismo americano, isso não deve tardar a ocorrer, especialmente nesse período de vacinação contra covid e movimentações eleitorais”

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