Anderson Pires*
O primeiro pronunciamento de Lula após a anulação dos seus processos pelo ministro Fachin mexeu com o mundo. O ex-presidente começou sua fala agradecendo aos diversos estadistas que manifestaram solidariedade e apoio durante o período que esteve preso em Curitiba, como também aos seus advogados, amigos e a militância.
Já na abertura, deixou claro que sua fala tem peso internacional e base social para fazer um amplo debate sobre os principais temas que o Brasil precisa enfrentar. Se antes Lula estava amarrado pelas condenações da Lava Jato, que serviram para inviabilizar sua candidatura em 2018 e encerrar possibilidades de projetos futuros, agora, a situação é outra e Bolsonaro tem um opositor com respaldo e posição clara.
A camisa de força que a Lava Jato impôs ao país foi responsável por produzir um período de retrocesso generalizado. Os avanços acumulados durante os governos petistas foram varridos com a justificativa falsa que estavam destinados à corrupção e que esse seria o maior problema do país. Para tanto, precisavam exterminar o protagonista dessas conquistas, no caso Lula.
Lula realmente parecia exterminado
Ninguém imaginaria que um hacker seria o responsável por coletar as provas que mostrariam tudo aquilo que nos bastidores os procuradores e o ex-juiz Sérgio Moro tramaram para dar um golpe na democracia brasileira. Esse foi o fato que permitiu eliminar dúvidas sobre os heróis de Curitiba. Nem Moro ter virado ministro de Bolsonaro foi suficiente para que a máscara caísse.
Mas o jogo jurídico virou. Lula está livre de condenações e qualquer acusação que possa ser feita contra ele terá que seguir os trâmites que deveriam ser os normais em um processo. O lavajatismo finalmente terá que ser extinto. Esse grupo que se apropriou do Estado para manipular os destinos do país fazendo política, negócios e fama deve responder pelos estragos e crimes praticados.
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Mas voltando para a fala do Lula, fazia tempo que não tínhamos no Brasil alguém com legitimidade e coragem para dizer o que era preciso sobre diversos temas. Está claro que haverá uma comparação com o governo Bolsonaro no que diz respeito a economia, aos programas sociais, investimentos, tratamento das minorias e o combate à pandemia.
Lula entrou de sola, lembrou que a Terra é redonda e não plana. Bateu pesado na política armamentista e na total inversão de valores, quando o povo está precisando de emprego, alimento, educação, lazer e, principalmente, saúde. Questionou gastos com cloroquina e não termos vacinas para o Brasil poder retomar o desenvolvimento e resgatar empregos.
O ex-presidente disse com todas as letras que a Petrobras não estaria à mercê dos especuladores. Lembrou que o Brasil é exportador de petróleo, que não existe justificativa para seguir preços internacionais para os combustíveis. Completou que é contra a autonomia do Banco Central. Afirmou que o Banco deve estar sob controle do Governo e não do Mercado. Disse mais, se o mercado tem medo dele, então não está disposto a investir no capital produtivo e gerar emprego. Foi ainda mais duro quando disse que os Yuppies que vivem de ganhar dinheiro vendendo papéis sem produzir um lápis ou um copo, que esses devem ter medo mesmo.
A conjuntura mudou e quem antes passeava fazendo o que queria no mercado, pisando na democracia, desqualificando as instituições e marginalizando as minorias, agora tem um contraponto claro.
Lula fala com a autoridade de quem chegou ao poder em 2003 com o dólar valendo mais de R$ 4, bolsas em queda e todo setor produtivo encolhido. Saiu do Governo com o Brasil entre as maiores economias do mundo, com grau de investimento conferido pelas agências internacionais, fora do mapa da fome mundial, com a indústria de base disputando espaço internacional, a Petrobras liderando a exploração de petróleo e as classes médias e baixas com poder de compra.
A volta de Lula ao cenário político numa conjuntura completamente diferente já produz efeitos. Até mesmo os partidos de direita e o Centrão poderão adotar uma nova postura, na medida que as possibilidades políticas mudaram. O bolsonarismo, que parecia ser o único campo com representatividade numérica para disputar 2022, agora tem um adversário à altura.
No que diz respeito à pandemia, quem antes achava que poderia negar o problema, desdenhar das mortes, incentivar a proliferação do vírus, desrespeitar o uso de máscaras e colocar em dúvida a vacina como forma de imunização, agora já incorpora o discurso “Vacina Já” e passou a ser o novo mascarado.
Se antes Bolsonaro acreditava que iria tripudiar com a desgraça alheia e chegar a 2022 sem precisar rever suas práticas, parece que o roteiro mudou. Não adiantará fingir demência, atropelar a democracia, abarrotar o governo de militares incompetentes e entregar a economia aos interesses do Guedes, haverá contraponto. Agora é Lula.
*Anderson Pires é formado em comunicação social – jornalismo pela UFPB, publicitário, cozinheiro e autor do Termômetro da Política.
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