Com uma mudança de voto, o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou hoje (23) a suspeição do ex-juiz Sergio Moro na condução do julgamento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante a Operação Lava Jato.
Quem mudou seu voto foi a ministra Cármen Lúcia, provocando uma reviravolta no julgamento, que até então negava o habeas corpus impetrado pela defesa de Lula (HC 164.493). Isso depois de uma sessão tensa, em que Nunes Marques votou contra a suspeição e foi duramente criticado por Gilmar Mendes.
A sessão foi retomada após intervalo de meia hora, para manifestação de Cármen Lúcia. Ela fez questão de afirmar que seu voto era para um caso específico e não continha juízo de valor sobre corrupção. Lembrou que, em dezembro de 2018, acompanhou o relator, Edson Fachin, porque na ocasião não parecia haver elementos suficientes para atender o pedido da defesa, nem nenhuma diferença em relação a vários outros habeas corpus analisados pela Corte.
“O que se impõe é algo para mim basilar: todo mundo tem direito a um julgamento justo, aí incluída a imparcialidade do julgador”, afirmou a ministra. Ela comentou que agora existe uma “série de dados” que não havia no primeiro momento. Isso caracterizaria a parcialidade de Moro e, portanto, sua suspeição contra Lula no caso em análise. Houve, segundo a ministra, “quebra de direito” do ex-presidente.
Nunes Marques
Em seu voto, Nunes Marques alegou que não considera as provas, obtidas originalmente por um hacker e reproduzida em parte pela imprensa, como imprestáveis ao caso. “Com a devida vênia dos que eventualmente possam entender de forma diversa, tenho que são absolutamente inaceitáveis tais provas, por serem frutos diretos de crimes”, disse Nunes Marques. “Entender-se de forma diversa, isto é, que resultado de tais crimes seriam utilizáveis, mesmo que para a defesa de alguém, seria uma forma transversa de legalizar a atividade hacker no Brasil.”
Apesar de as mensagens vazadas ao site The Intercept Brasil que comprovariam a suspeição terem sido auditadas na Operação Spoofing, o ministro considerou que as mensagens poderiam ser alteradas, o que inviabilizaria seu uso.
Gilmar Mendes, que lidera a corrente pró-suspeição de Moro na turma, pediu a palavra e fez nova manifestação após o voto de Nunes Marques, rebatendo sua argumentação. “A combinação de ação entre o Ministério Público e o juiz encontra guarida em algum texto da Constituição? Pode se fazer esta combinação?”, questionou o ministro. “Isso é garantismo? Nem aqui nem no Piauí, ministro Kássio!”
Gilmar chegou a se exaltar contra o argumento de Nunes Marques de que a prova é prova ilícita. “O meu voto está calcado nos elementos dos autos! ‘Mas pode ter havido inserções, pode haver manipulação’ mas não se fez!”, disparou. “Ou o hacker é um ficcionista, ou estamos diante, de fato, de um grande escândalo. E não importa o resultado deste julgamento: a desmoralização da Justiça já ocorreu!”
A intervenção de Gilmar Mendes durou uma hora e 38 minutos, e só foi interrompido por Ricardo Lewandowski, que também considerou “inconcebíveis e inaceitáveis” algumas das medidas tomadas pela Lava Jato – defendendo a adoção destas provas obtidas por hackeamento.”Estes são fatos supervenientes, e estamos acostumados a considerá-los”, disse o ministro.
Após a admoestação, Nunes Marques preferiu abrandar a discussão.”Meu contributo é o silêncio. E esse silêncio é justamente em homenagem aos votos divergentes”, comentou. Em seu comentário, porém, acusou que Gilmar poderia estar menosprezando o Piauí, estado natal de Nunes Marques.
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