Idosa vivia em condições subumanas junto a mais de 40 cachorros e dormia em cama sem colchão. Polícia agora investiga quem ficava com o dinheiro da aposentadoria de Maria das Graças
Maria das Graças de Sousa Rodrigues, de 75 anos, deixou o Maranhão em 1969, a procura de uma vida melhor e perdeu o contato com a família, que ainda vive no Nordeste, há mais de 30 anos. Há dois, uma sobrinha deu início a uma longa busca, cujo desfecho na manhã dessa terça-feira (13) provocou um misto de alegria e tristeza na moça.
A idosa foi resgatada pela polícia vivendo em condições subumanas com outra idosa, em uma casa na Praia da Brisa, em Pedra de Guaratiba, Zona Oeste do Rio de Janeiro, junto a mais de 40 cachorros. Além de muitas fezes no quintal, havia até um pequeno cemitério de animais nos fundos do imóvel, com direito a lápides, onde foram encontradas algumas ossadas de bichos. Segundo a polícia, a dona do imóvel vai responder por cárcere privado, entre outros crimes.
“A alegria foi por ter encontrado a minha tia e a tristeza, por saber das condições em que ela se encontrava. Mas, pelo menos está viva. A ideia é trazer ela de volta para o Maranhão para poder aproveitar o final da velhice em paz ao lado das pessoas que gostam dela”, comemorou a enfermeira Raquel Rodrigues de Castro Belfort, de 46 anos.
A idosa foi encontrada na casa de dois andares e muro alto com outra idosa, que seria a dona do imóvel. Ela dormia num quarto onde havia uma cama velha e quebrada, apoiada por tijolos e que sequer tinha colchão. O cômodo era dividido com os cachorros. Ela foi encontrada maltrapilha, suja, com um dos pés descalços e com uma imensa cabeleira coberta por um pano.
A outra mulher, identificada pela polícia como Therezinha da Silva Moraes também foi levada para a delegacia. A policia autuou a mulher por cárcere privado, redução à condição análoga à escravidão e maus tratos a animais, já que os cães que se encontravam no quintal estavam sem alimentação e junto à fezes, segundo o delegado Antônio Ricardo Lima Nunes, titular da 43ª DP (Guaratiba).
O delegado quer saber também se alguém ficava com o dinheiro da aposentadoria de Maria das Graças. Antônio Ricardo disse que ela tinha o cartão do benefício do INSS, mas afirmou que não recebia nenhum valor.
“Ela tem aposentadoria. A gente está com o cartão aqui, mas ela disse que não recebia (o benefício). Vamos apurar aqui quem é que recebia (por ela)”, afirmou o delegado.
Caçula de três irmãs, todas tendo Maria como primeiro nome, Maria das Graças saiu do interior Maranhão em 1969 para viver com Maria Nazaré, a irmã mais velha no Rio de Janeiro. Mas, acabou mudando o roteiro e foi parar em Gravataí, no Rio Grande do Sul, onde morou até 1982.
Após terminar um noivado finalmente foi para o Rio e a última vez que a família maranhense teve notícias dela foi no começo dos anos 1990, por meio de uma ligação de Maria de Nazaré para a irmã Maria da Conceição, a única que nunca saiu do Maranhão nem perdeu as esperanças de reunir novamente as três Marias.
Há quatro anos, Maria da Conceição perdeu um filho para o câncer e entrou em depressão. Para recuperar sua alegria, a filha Raquel, que não era nascida ainda quando as tias saíram de casa, prometeu realizar o sonho da mãe e iniciou sua busca dois anos depois. Uma prima que mora no Rio e trabalha na área da saúde, mas também não tinha contato com as parentes desaparecidas, recorreu a um sistema de cadastramento de usuários do SUS para tentar descobrir o paradeiro das duas mulheres. Encontrou informações apenas de uma. A outra já havia falecido.
Descoberto o endereço, essa parente do Rio bateu na casa de Guaratiba, mas não foi atendida. Procurou informações com os vizinhos mas também não obteve nenhuma informação. Voltou outras vezes deixou contato, mas também não obteve sucesso.
Enquanto isso, no Maranhão, Raquel não perdia as esperanças e seguiu nas buscas, agora por telefone. Ela mapeou o bairro de Guaratiba com ajuda da internet e passou a ligar para números aleatórios, que podiam ser de uma igreja, um comércio ou um órgão público e perguntava pela tia. Mas, ninguém sabia dela.
Foi numa dessas ligações aleatórias que Raquel encontrou do outro lado da linha a cozinheira Leandra da Costa Maria, de 50 anos. Atenciosa, disposta a ouvir a história da interlocutora e, o mais importante, com vontade de ajudar, Branca, como Leandra é mais conhecida no bairro, foi fundamental para o desfecho da história. Primeiramente, fez uma busca nas suas redes sociais, mas como não obteve nenhum retorno resolveu ir pessoalmente no endereço passado pela sobrinha da mulher.
“Cheguei lá achando que ia encontrar apenas uma pessoa saudosa da família e me deparei com esse quadro horrível. Nunca imaginei encontrar uma coisa dessas tão perto de mim. A gente ouve falar, mas não acha que vai presenciar. Mais triste ainda é saber que uma pessoa está fazendo isso com outro ser humano. Minha vontade era invadir a casa na marra para tirar ela de lá. Mas a gente não pode fazer isso sem a polícia”, contou a cozinheira que pediu ajuda à PM-RJ e foi aconselhada a registrar um boletim de ocorrência na delegacia da área.
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No boletim feito na segunda-feira (12), ela relatou que Maria das Graças seria mantida, supostamente, em cárcere privado por Therezinha da Silva Moraes. No registro feito na DP, a cozinheira relata que foi recebida pela mulher que era procurada pela família e ela teria dito que não tinha acesso às chaves da casa e que não era permitido que ela saísse ou conversasse com ninguém.
Resgatada pela polícia, Maria das Graças deve passar os próximos dias na casa de parentes que moram em Pilares e também não sabiam o paradeiro dela. No começo da semana que vem, Raquel pretende viajar para o Rio para buscar a tia, garantindo o final feliz para uma história que começou bem antes de ela ter nascido, mas que só teve desfecho após sua intervenção.
“Minha mãe não vai ver as duas irmãs como eu prometi, porque Deus sabe o que faz. Uma delas está com o Senhor mas a outra vai voltar para a gente”.
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