Jovem negro ligou para a esposa antes de ser executado pela PM: "Vão matar a gente"
Em poucos segundos de ligação, jovem informou localização e disse que amava sua filha, de apenas um ano de idade. Imagens da execução repercutiram até na imprensa internacional. Corpos tinham mais de 20 perfurações e vítimas não possuíam antecedentes criminais. PMs publicaram vídeo das mortes como “troféu”
Vinícius Alves Procópio, 19 anos, e Felipe Barbosa da Silva, 23, foram assassinados à queima-roupa por policiais militares com mais de 20 disparos. Os autores do crime são o sargento André Chaves da Silva e o soldado Danilton Silveira da Silva, ambos da Força Tática do 1º Batalhão de Polícia Militar Metropolitana.
O vídeo que mostra trechos da execução repercutiu até em veículos da imprensa internacional, como Daily Mail e The Independent. As imagens (ver abaixo) foram gravadas por uma testemunha que passava pelo local — cruzamento das ruas Doutor Rubens Gomes Bueno e Castro Verde, em Santo Amaro, na zona sul de São Paulo.
De acordo com a investigação, Felipe Barbosa ligou para a esposa às 19h20, momentos antes de ser assassinado. Ele forneceu a ela sua localização e disse que amava a sua filha, de apenas um ano de idade. “Eles vão matar a gente”, disse o jovem. Antes de desligar, Felipe pediu que ela avisasse a família de Vinícius, jovem que estava com ele no carro.
Felipe e Vinícius não tinham antecedentes criminais. O primeiro trabalhava como entregador de aplicativos e, ao contrário do que disseram os policiais, não possuía arma de fogo. Vinícius, por sua vez, trabalhava como monitor de perua escolar.
Testemunhas disseram que os corpos dos jovens foram retirados dos veículos “como se nada fossem e atirados no meio-fio da via”. O vídeo da execução dos jovens chegou a ser compartilhado no Instagram da própria Força Tática, exibido como um ‘troféu’. No entanto, a publicação foi apagada horas mais tardes.
“As informações são de que Felipe foi atingido por 27 disparos e Vinícius por 23 disparos. Esses dados por si só já configuram fuzilamento. E os jovens, conforme os próprios PMs, não efetuaram nenhum disparo. Os PMs dizem que um teria descido do veículo com arma na cintura e o outro teria tentado fazer um disparo e a arma falhou. Ficou provado que a versão dos PMs era mentirosa. Os jovens foram fuzilados”, disse o advogado Ariel de Castro Alves.
Os PMs estão detidos no Presídio Militar Romão Gomes, no Tremembé, desde a noite de domingo (13). Na tarde desta segunda-feira, eles passaram por audiência de custódia, em que o juiz Ronaldo Roth decidiu manter a prisão preventiva. Ao decretar a prisão, o juiz Roth apontou que os policiais “se afastaram do seu dever funcional, com a abordagem de veículo em descumprimento ao POP [Procedimento Operacional Padrão], realizando mais de 15 disparos cada, causando 27 perfurações em um civil e 23 perfurações no outro, colocando em dúvida a credibilidade da instituição Polícia Militar, o que demonstra a necessidade da prisão para a garantia da ordem pública”.
Em seu depoimento à Polícia Civil, os PMs disseram que mataram Felipe porque ele desceu do carro com uma arma na cintura e apresentava “iminente” risco de agressão, enquanto Vinícius, que ficou no banco traseiro do veículo, teria tentado atirar contra os policiais, mas a arma falhou.
As investigações também apontam para uma possível fraude processual, uma vez que os PMs teriam plantado dois revólveres na cena do crime. Além disso, um cartucho de calibre ponto 380 íntegro foi encontrado nas vestes de Felipe.
No início da noite de segunda-feira, o Ministério Público se pronunciou sobre o crime, designando o promotor Thomas Mohyico Yabiki “para acompanhar o caso em que dois PMs são investigados sob a suspeita de perseguir e executar dois homens, com aproximadamente 30 tiros, dentro de um carro parado na zona sul de São Paulo. As vítimas eram suspeitas de assalto e não dispararam, mas foram encontradas mortas com mais de 50 perfurações de projéteis”.
Além do pedido de prisão feito pelo Comando da Polícia Militar, o Ministério Público pediu para que o caso fosse encaminhado ao Tribunal do Júri, para que os policiais fossem julgados pela Justiça comum, já que “há várias provas de que o caso se trata de crime doloso contra a vida de civis”. No entanto, este pedido não foi aceito pela Justiça Militar, com a alegação de o inquérito policial militar ainda não foi concluído. O crime também é investigado pelo DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa), da Polícia Civil.
com informações de Ponte Jornalismo