Defesa de Sarí Corte Real tenta culpar Miguel pela própria morte: “Criança traquina”
Após 1 ano e 3 meses da morte do menino Miguel, Sarí Corte Real foi ouvida em audiência de instrução. A mulher reforçou a linha da defesa de responsabilizar a própria criança pela morte
Victor Lacerda, Alma Preta
A culpabilização de Miguel Otávio, menino de cinco anos que caiu de um prédio no Recife após ser abandonado em um elevador, tem sido a principal linha assumida pela defesa de Sarí Corte Real, ex-patroa da ex-empregada doméstica Mirtes Renata.
A ré compareceu ao Centro Integrado da Criança e do Adolescente (CICA) na manhã deste quarta-feira (15), na área central do Recife, acompanhada de seu advogado e mais duas testemunhas para prestar depoimento na última audiência de instrução do processo, que está sob a condução da 1ª Vara de Crimes contra a Criança e o Adolescente da Capital.
Nem manifestantes, familiares – entre eles o pai de Miguel, o agricultor Paulo Inocêncio e a avó, Marta Santana -, e nem mesmo a imprensa conseguiram acompanhar a chegada da ré.
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Presentes com carro de som, representantes de movimentos sociais estiveram na porta do local onde Sarí seria ouvida desde às 9h. Com cartazes e faixas, entidades cobraram por celeridade no processo após 1 ano e 3 meses da morte do menino.
Antes da escuta da principal acusada, duas testemunhas estiveram presentes no centro integrado. A primeira testemunha, segundo os advogados de Mirtes, uma pessoa do município de Tamandaré, que passou um curto espaço de tempo na presença da vítima, afirmou que Miguel Otávio se tratava de uma criança excepcionalmente “traquina” e chegou a insinuar que a educação dada à criança seria falha. A segunda testemunha surpreendeu ao comparecer, por se tratar de um psicólogo que, supostamente, teria atendido o menino Miguel e saberia falar sobre seu comportamento. Além do desconhecimento da família sobre o acompanhamento do profissional, por ferir o Código de Ética do Psicólogo, a testemunha teve seu depoimento impedido pelo magistrado.
Por volta das 10h40, de acordo com informações obtidas pela Alma Preta Jornalismo, Sarí Corte Real foi ouvida. De acordo com o advogado de Mirtes, Rodrigo Almendra, em fala realizada durante coletiva no Gabinete Assessoria Jurídica Organizações Populares (GAJOP), a ré, em seu depoimento, tirou a responsabilidade de si enquanto adulta, se dizendo incapaz de agir por conta da filha que teria a distraído de tal modo em que ela, por acidente, deixou a porta do elevador fechar.
Almendra ainda destacou que, no tempo que foi ouvida, um dos poucos momentos em que pareceu abalada emocionalmente foi quando retratou certa perseguição sobre ela por parte dos veículos de comunicação. “O único momento em que ela parece se emocionar, em relação às acusações, é quando ela diz que está sendo perseguida por vocês da imprensa, por ela estar sofrendo muito com tudo que está acontecendo”, comentou o advogado.
Ainda em coletiva, a segunda advogada de assistência, Maria Clara, ressaltou que, após o Ministério Público realizar as perguntas para a ré, a defesa de Sarí Corte Real decidiu por não responder às perguntas de acusação dirigidas à ela, questções que foram, segundo a advogada, propositalmente ocultadas. “O salto que sai dessa audiência, para mim, são as perguntas que não foram respondidas por Sarí, mas que podem ser constatadas em vídeo”, disparou a advogada.
Entre as questões não respondidas, segundo a advogada, estão: “por qual motivo ela decide abandonar Miguel no elevador?”, “o que levou ela a retirar a sua mão do elevador, algo que foi comprovado em vídeo?”, “o que a teria motivado a não tocar em Miguel, dentro e fora do elevador, para conduzi-lo de volta ao apartamento?”, “por que acreditou que, por duas vezes, a sua filha não poderia ficar sob o cuidado de outras pessoas dentro de seu apartamento?” e, por fim, “por qual motivo ela não deixou nenhuma escolha a Mirtes, para que pudesse tirar folga no dia, ou deu outras alternativas para que Miguel pudesse ficar em segurança, mesmo que sua mãe estivesse trabalhando em plena pandemia?”.
Em seguida, Mirtes, mãe do menino Miguel Otávio, falou sobre suas impressões e afirmou estar descontente com a postura da ré e de sua defesa. “O que me deixa muito chateada, diante do que aconteceu, é a estratégia de defesa deles [de Sarí Corte Real] querendo de, alguma forma, tirar a culpa dela e querer colocar em mim questionando a minha educação, que eu dava ao meu filho, que a minha mãe dava. Eles falam de uma forma como se eu fosse a pior mãe do mundo. Se eu fosse a pior mãe do mundo, eu não estaria aqui lutando para que ela seja responsabilizada pela morte do meu filho”, desabafou.
Após a escuta de Sarí Corte Real, o processo entra na fase de alegações finais, em que os atores processuais resumem todo o ocorrido e apresentam seus pontos de vista ao magistrado e volte ao júri, comandado pelo Dr. Renato Bezerra, para que possa ser sentenciado.
Segundo o advogado de Mirtes, Rodrigo Almendra, apesar dessa etapa concluída, o processo deve não ser resolvido com a celeridade em que se espera. “Estamos todos cientes, incluindo Mirtes e sua família, que esse processo não terminará em primeiro grau, por ser assim em casos específicos e sensíveis como este. Porém, a expectativa é que a sentença ocorra ainda este ano”, finaliza.