Além da pandemia o país vive seu pior momento histórico de visibilidade internacional. Passa por dificuldade para atrair investimentos estrangeiros para formação bruta de capital fixo, ou seja, formação de indústria, grandes obras de infraestrutura e não capital especulativo no mercado financeiro
Dieslyn Santos*
Inflação oficial brasileira volta ao patamar de dois dígitos, com IPCA de 2021 em 10,06% nos últimos 12 meses. Muitos perguntam, mas por que a inflação se mantém quase o dobro do teto da meta do Banco Central, que é 5,25% ao ano, em uma economia com baixo crescimento, sem aquecimento da demanda agregada e alto desemprego. Existem vários fatores, no entanto vou citar aqueles que ao meu ver são os principais.
Primeira coisa do mundo globalizado que afeta diretamente a inflação de quase todos os países, é o câmbio do dólar americano em relação a moeda doméstica de tal país. Pois as commodities agrícolas e minerais, máquinas e equipamentos que são negociadas no mundo todo, são cotadas na moeda norte americana. Logo, mesmo se os salários e alguns insumos cotados no real, por exemplo, de uma cadeia produtiva se mantenham estáveis, mas o câmbio desta moeda local se desvaloriza em relação ao dólar, seus custos de produção vão se elevar devido ao uso de commodities agrícolas e minerais. Grosso modo agrícolas são milho, soja, café, algodão, carne bovina, suína e frango, minerais incluem ferro, petróleo, gás, ouro, cobre e alumínio.
Janeiro de 2017 o câmbio real por dólar era R$ 3,28, em 2019 câmbio de R$ 3,85 e 2022 cotado a R$ 5,55, todos com referência no início de janeiro. Percebam a variação da cotação do dólar em 69,20%, um aumento médio de 11,10% ao ano. Em contrapartida a este cenário o salário mínimo teve variação positiva no mesmo período de 29,34% (FETAPERGS) e o IPCA aumentou 27,92% (IBGE). Desde 2015 o país tem cenário de alto desemprego e baixo crescimento do PIB, após mudança de postura no governo Dilma II, com austeridade fiscal, aumento dos juros e flutuações dos preços administrados de energia e petróleo, produzindo inflação e desemprego.
Isoladamente o petróleo que é insumo fundamental para indústria e transporte, com ligação indireta em todos os outros setores subiu 42,55% (INDEXMUNDI), sendo 26,97% para mais, só nos últimos dois anos. Como que o preço do petróleo subiu quase 30% nos últimos 2 anos com a economia mundial em baixa devido a pandemia? No início da pandemia entre março e abril de 2020 o barril de petróleo chegou a preços mínimos batendo US$ 23,34 por barril, hoje US$ 78,25 (INDEXMUNDI). Com a paralisação de boa parte das economias do mundo, a queda da demanda pelo insumo fez os preços despencarem por ora, até zerarem seus estoques.
No entanto, para recuperarem os bilhões ou trilhões de dólares por causa dessa queda no preço do barril, os países membros da OPEP se reuniram e fizeram um acordo para restringirem a oferta do insumo para os próximos anos, provocando aumento de preço da commoditie no período de retomada das economias globais no pós-pandemia, até que seus lucros retornem a patamares dos períodos normais ou superiores, e os consumidores paguem por essa correção de preço via mercado. Lembrando que o preço da gasolina no Brasil é afetado de forma direta pela cotação do barril do petróleo e taxa de câmbio. Neste caso as duas variáveis são desfavoráveis para o país no momento.
Terceiro ponto, com a necessidade do isolamento social para a contenção do coronavírus em 2020 e 2021 no Brasil, o governo injetou bilhões de reais na economia para que as pessoas de baixa renda, trabalhadores informais e formais pudessem ficar em casa no período de isolamento. Acontece que essa injeção de bilhões de reais na economia, frente a uma indústria que passou a produzir menos pelos mesmos motivos para não acumularem estoques e baixa de preços, gerou um choque de demanda temporária frente a uma oferta restrita o que também gerou inflação principalmente na parte dos alimentos.
Para sair deste cenário e ver um Brasil sorrindo, gerando emprego e renda para seu povo é preciso muito trabalho, seriedade, competência e segurança política e institucional. Além da pandemia o país vive seu pior momento histórico de visibilidade internacional. Passa por dificuldade para atrair investimentos estrangeiros para formação bruta de capital fixo, ou seja, formação de indústria, grandes obras de infraestrutura e não capital especulativo no mercado financeiro, que não produz um parafuso e tem altos ganhos via valorização de ações, aumento da taxa de juros e variação no câmbio. Infelizmente nem com o anúncio de maior plano de desestatização de empresas animou os olhares de investidores externos. Ainda falta o aumento de imposto dos anos seguintes para cobrir o rombo das contas públicas devido a pandemia, que trará mais inflação.
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Precisamos de projetos para grandes expansões em ferrovias, rodovias, portos, hospitais e escolas. Aprimorar, incentivar e aumentar as pequenas e médias empresas, valorizar o trabalho e empreendedorismos dos brasileiros. Para isso é preciso saber dialogar, negociar e fazer. Coisa que este governo não tem mostrado habilidade.
*Dieslyn Santos é economista pela Universidade Federal de São Carlos e Invoice Consulting.
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