Os ex-bolsonaristas ou dissidentes da família, mesmo que continuem sendo ideologicamente bolsonaristas, não têm todos o mesmo perfil. Há nuances entre eles. Alguns foram abandonados deliberadamente pelo clã, outros se rebelaram porque passaram a ser desprezados
Moisés Mendes*, em seu blog
É um dado estatístico preocupante para quem já tem muitas preocupações. O bolsonarista com algum destaque na extrema direita só morre quando começa a atacar, a ser atacado ou a se afastar da família no poder.
Não é palpite ou suposição, é a realidade. Já morreram Gustavo Bebianno, Adriano da Nóbrega, Major Olímpio e agora Olavo de Carvalho.
↗ Negacionista da pandemia, Olavo de Carvalho morre vítima de Covid-19
Alguns foram abandonados deliberadamente pelo clã, outros se rebelaram porque passaram a ser desprezados.
Ser ex-amigo da família não habilita ninguém a morrer, mas é estranho que só morram os que se afastaram do núcleo duro ou mole que circula em torno dos Bolsonaros.
Não há nenhum morto de destaque do bolsonarismo que ainda esteja ligado à facção. Morrem de Covid artistas e intelectuais de esquerda, mas não morre ninguém entre as celebridades ativas da extrema direita, com raríssimas exceções que ninguém lembra. Só morrem os dissidentes.
Olhando-se de longe, é possível fazer uma lista grande de ex-bolsonaristas, todos em confronto direto com a família. Que eles se protejam da sina que acomete os que Bolsonaro expulsa da sua turma.
São muitas as divisões e classificações de ex-bolsonaristas, a maioria militando politicamente. Há os que se mantêm dentro do esquema da extrema direita, como Sergio Moro, e há os que saltaram fora, como Alexandre Frota.
Os ex-bolsonaristas ou dissidentes da família, mesmo que continuem sendo ideologicamente bolsonaristas, não têm todos o mesmo perfil. Há nuances entre eles.
O caso de Olavo de Carvalho pode ser enquadrado no perfil médio da maioria. Olavo se sentiu abandonado, como muitos que decidiram se rebelar e partir para o ataque.
São dissidentes porque não conseguiram o que pediram, não tiveram acesso a cargos do primeiro time, não emplacaram indicados para mamatas ou deixaram de ser reconhecidos pela família como extremistas importantes.
A traição é a marca das relações com os Bolsonaros, o que significa que muitos outros ressentidos ainda cairão fora. A única fidelidade sem riscos é a dos militares, que desfrutam de mais de 6 mil empregos.
Mas é uma fidelidade que só vale enquanto existir poder. Quando Bolsonaro estiver na sarjeta, esses vínculos serão rompidos de forma traumática.
A morte de Olavo de Carvalho tem alcance maior do que as anteriores. Morre o guru, o orientador de agressões, loucuras e ódios. É a morte mais impactante entre eles.
Abraham Weintraub deseja ser, mas nunca conseguirá ser seu sucessor. Porque Olavo sabia escrever e organizar seu caos mental terraplanista para que a confusão tivesse utilidade para o fascismo.
Weintraub talvez seja, como dissidente recente da família, apenas a próxima etapa do bolsonarismo extraviado. Atrapalhado, analfabeto e sem condições até de produzir caos mental, porque o caos não tem onde se acomodar.
*Moisés Mendes é jornalista em Porto Alegre. Foi colunista e editor especial de Zero Hora. Escreve também para os jornais Extra Classe, Jornalistas pela Democracia e Brasil 247. É autor do livro de crônicas ‘Todos querem ser Mujica’ (Editora Diadorim).
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