Com maiores facilidades para as demissões, as mudanças conduziram à troca de trabalhadores mais bem remunerados por profissionais que, diante das difíceis condições econômicas, viram-se constrangidos à aceitação de salários mais baixos para obterem postos de trabalho
João Gabriel Lopes*
Ao longo das últimas semanas, entrou em pauta a possibilidade da revogação da reforma trabalhista aprovada em 2017. Isso porque, recentemente, entidades representativas de empresas e trabalhadores da Espanha concordaram em revogar parte das regras trabalhistas aprovadas em 2012 naquele país, as quais inspiraram a legislação aprovada no Brasil durante o governo de Michel Temer.
A reforma trabalhista brasileira foi justificada por seus idealizadores como uma norma que tinha o objetivo de reduzir o alto número de desemprego no país. Entretanto, além de não criar postos de trabalho, ampliou a precarização do emprego, reduziu a renda do trabalhador e prejudicou negociações coletivas e entidades sindicais.
Importante destacar que o nível de desemprego no Brasil fechou em 12,6% no terceiro trimestre de 2021, último dado divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). No entanto, mesmo quando há geração de vagas e redução no índice, o movimento é puxado pela informalidade e por empregos com salários mais baixos, o que indica piora nas condições para os trabalhadores.
Na Espanha, o recente movimento de resgate parcial de direitos dos trabalhadores promovido pelo governo da Espanha colocou em pauta a necessidade de reversão das reformas trabalhistas precarizantes efetuadas ao longo da última década em diversos países. Em 2012, o país europeu promoveu a mais ampla alteração do Estatuto dos Trabalhadores desde a sua promulgação, em 1980. Foram ampliados os poderes unilaterais das empresas, os sindicatos tiveram a atuação duramente restringida e foram incentivadas formas de contratação que beiravam a informalidade, sob o pretexto de se buscar reduzir o nível de desemprego e assegurar maior segurança jurídica e maior flexibilidade na contratação e dispensa de trabalhadores.
No Brasil, em 2017, a reforma espanhola foi utilizada como uma das principais fontes de inspiração para a reforma efetuada pelo governo Temer. De fato, algumas das alterações promovidas se assemelhavam àquelas empreendidas no país europeu cinco anos antes. A título de exemplo, em ambos os países os acordos por empresa passaram a prevalecer sobre convenções coletivas. Também em ambos os contextos, foram impostos constrangimentos à negociação coletiva, com a vedação da ultratividade das normas pactuadas por sindicatos.
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Anos após a adoção dos novos marcos regulatórios do trabalho, verificou-se que o resultado prometido não foi alcançado. Na verdade, a participação da renda obtida pelo trabalho na riqueza nacional foi reduzida em ambos os países. As reformas trabalhistas levaram a uma deterioração das condições de quem vive do trabalho, com um aumento do grau de informalidade, das desigualdades e da concentração de renda.
Com maiores facilidades para as demissões, as mudanças conduziram à troca de trabalhadores mais bem remunerados por profissionais que, diante das difíceis condições econômicas, viram-se constrangidos à aceitação de salários mais baixos para obterem postos de trabalho.
O que se busca resgatar na Espanha é uma visão que coloca no centro das preocupações políticas a proteção ao estatuto jurídico dos trabalhadores. É um dos pressupostos para uma sociedade minimamente inclusiva e comprometida com a redução das desigualdades e a progressiva melhora das condições sociais.
É interessante notar, inclusive, que a nova reforma laboral espanhola é decorrente de consensos alcançados entre governo, trabalhadores e empresários e agora enfrenta o desafia de obter a aprovação política perante o Parlamento. Diante do fracasso das políticas implantadas desde 2017 no Brasil, é indispensável que se pensem estratégias de reversão da perda de direitos, ampliando a participação dos trabalhadores na renda nacional.
Para tanto, é essencial a integração das instâncias representativas desses trabalhadores no diálogo sobre as reformas necessárias para a ampliação de direitos, já que as entidades sindicais foram flagrantemente ignoradas no processo que resultou na reforma implementada no governo Temer.
*João Gabriel Lopes é advogado, coordenador da Unidade Salvador do escritório Mauro Menezes & Advogados e mestre em Direito, Estado e Constituição pela Universidade de Brasília – UnB.
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