Autoproclamado príncipe lamenta tragédia em Petrópolis e oferece "orações" às vítimas
Há 179 anos recebendo impostos em Petrópolis, herdeiros da família real oferecem "orações" às vítimas da tragédia e são criticados
Autoproclamado príncipe imperial do Brasil e membro da família que já liderou o país, Dom Bertrand de Orleans e Bragança lamentou as fortes chuvas que atingiram a cidade de Petrópolis, na Região Serrana do Rio de Janeiro. Até agora, a Defesa Civil já confirmou o número de 136 mortos em decorrência do temporal.
No comunicado, publicado em seu site e nas redes sociais, Orleans e Bragança classifica o momento como o “de grave dificuldade” e agradece pelo “trabalho incansável” de bombeiros, policiais, médicos e enfermeiros, bem como o de beneméritos particulares.
“A Família Imperial, tão estreitamente ligada a Petrópolis, encontra-se sempre disposta a servir ao seu povo, oferecendo ainda nossas orações e solidariedade a todos os que vêm sofrendo. Rogo a Deus Nosso Senhor, por intercessão do Padroeiro São Pedro de Alcântara, que proteja e dê alento à boa gente petropolitana nesta hora de aflição e necessidade”.
As palavras não foram muito bem recebidas nas redes sociais, e internautas lembraram que um imposto imobiliária (denominado “laudêmio”) é pago a herdeiros da família imperial há 179 anos. No comunicado, o príncipe não diz se fará algum tipo de doação à cidade.
O que é o laudêmio
Após a tragédia em Petrópolis, repercutiu nas redes sociais a descoberta por muitos de que os moradores da cidade (inclusive os mais pobres) ainda pagam o laudêmio, um imposto para a Família Imperial brasileira.
A cidade foi refúgio de lazer de Dom Pedro II durante o Brasil Império, por isso recebeu o apelido de Cidade Imperial. O laudêmio foi criado nesse período. A taxa foi estabelecida depois que a coroa distribuiu lotes da Fazenda do Córrego Seca a imigrantes, em troca, eles deveriam pagar uma taxa caso revendessem o imóvel. Apesar do Brasil viver uma República desde 1889, a cobrança ainda existe.
Conhecida como “taxa do príncipe”, o imposto consiste no pagamento de uma taxa de 2,5% do valor do imóvel, para os descendentes da Família Imperial, toda vez que ele for revendido. O imposto é recolhido pela Companhia Imobiliária de Petrópolis, administrada por herdeiros da antiga família real.
Na Câmara dos Deputados, tramitam alguns projetos de lei que tentam acabar com a cobrança. Um dos mais recentes é o PL 553/2020 do deputado federal Rogério Correia (PT/MG).
Outro herdeiro da família real
João Henrique de Orleans e Bragança também se manifestou e disse que há culpados pela tragédia em Petrópolis. “Esse desastre tem culpados que todos conhecem. São os vários prefeitos e vereadores da cidade que incentivaram a ocupação dos morros da região”.
“Falava-se abertamente disso nos anos 1970. Os políticos traziam gente de Nova Iguaçu e Caxias, davam terrenos em áreas de risco, sem escritura nenhuma, em troca de as pessoas mudarem o domicílio eleitoral para a cidade. ‘Venham para Petrópolis que tem terreno para construir’, diziam na época. E até hoje é assim”, afirma.
Questionado sobre o laudêmio que ele e seus familiares recebem, João Henrique disse ser a favor da extinção do imposto. “Acho que esse sistema deveria acabar, isso já está ultrapassado como ideia”.
Freixo pede o fim do laudêmio
O deputado federal Marcelo Freixo (PSB-RJ) protocolou nesta sexta-feira 18 um projeto de lei para anular a cobrança do laudêmio dos cidadãos de Petrópolis. Na proposta, o parlamentar ainda pede que a receita obtida da taxa imobiliária seja revertida ao poder público do município para investir em políticas de prevenção e combate a desastres naturais.
Freixo aponta que “em pleno século 21, não faz sentido que uma taxa imobiliária criada pelo Imperador Dom Pedro II continue onerando a população em benefício de seus descendentes” e reitera a necessidade de que a taxa de 2,5% recolhida pela Companhia Imobiliária de Petrópolis seja revertida à cidade, sobretudo no contexto da recente tragédia.
“Ao Congresso Nacional cabe debater esta legislação arcaica, ainda do período colonial, que certamente não seria recepcionada pela Constituição da República, de 1988, que prima por princípios como o da impessoalidade, por exemplo, ou, até mesmo, da igualdade, não merecendo os herdeiros da era colonial tratamento diferente dos demais cidadãos”.