Em qualquer outra época, ministro da Educação já teria sido demitido por conta do áudio escandaloso. Governo Bolsonaro teme que Milton Ribeiro saia 'atirando' e revele mais podres se sentir que foi abandonado. Após muita pressão, procurador-geral Augusto Aras decidiu parar de se fingir de morto e afirmou que irá pedir ao STF abertura de inquérito
A revelação de que dois pastores sem cargo no governo atuam como espécies de lobistas entre prefeituras e o Ministério da Educação já seria grave por diversos aspectos. O caso ganha ares de escândalo à medida que fica evidente que a função dos amigos do presidente não era criar facilidades, mas vendê-las.
Na ausência de critério técnico para liberação das verbas, está para ser revelado ainda por que algumas prefeituras eram beneficiadas mesmo não informando sequer a existência de um terreno onde seriam realizadas as obras para as quais solicitavam os recursos.
Ao menos um prefeito que precisou lidar com um dos pastores contou que, para ter a vida facilitada no MEC, era exigido o pagamento de propina. No caso, um quilo de ouro. Foi o que disse ao jornal O Estado de S.Paulo o prefeito de Luís Domingues (MA), Gilberto Braga (PSDB). O pedido teria ocorrido em um restaurante em Brasília. As negociações à luz do dia ocorrem em um contexto de cortes e total ausência de política pública séria para o setor.
Em qualquer outra época, ou se vivêssemos uma situação de normalidade, o ministro Milton Ribeiro já estaria demitido ou seria pressionado a pedir demissão. O temor no governo Bolsonaro é de que ele possa sair “atirando” e revele mais podres se sentir abandonado.
O silêncio dos aliados do governo no Congresso Nacional e do próprio Palácio do Planalto é um indicativo da gravidade da situação envolvendo o ministro da Educação. Nas palavras de um dos líderes do Centrão, o ministro não podia negar o ocorrido porque o áudio existe. Mas fez um gesto para salvar Bolsonaro.
“Em qualquer outra situação, o ministro já teria sido forçado a pedir demissão imediatamente. Mas não está claro qual será a reação dele (Milton Ribeiro) se perceber que foi abandonado. Se ele confirmar que cumpria ordens do presidente (como está no aúdio), o estrago será grande”.
O grande problema é Bolsonaro
O governo enferrujou e a corrosão é visível em toda a Esplanada — da pasta da Saúde à do Meio Ambiente, Itamaraty à Educação, avalia o jornalista Josias de Souza.
“Se a encrenca se chamasse Eduardo Pazuello, a saída do general da pasta da Saúde teria saneado o setor. Se o nome da confusão fosse Ernesto Araújo, a queda do pior chanceler que o Itamaraty já conheceu teria evitado o vexame da visita presidencial ao Kremlin às vésperas da invasão da Rússia à Ucrânia. Se o descalabro pudesse ser batizado de Ricardo Salles, a fuga do personagem pela porta dos fundos teria restaurado o Meio Ambiente”, diz.
“No Ministério da Educação, se o transtorno se chamasse Ricardo Velez Rodrígues ou Abraham Weintraub, a chegada do pastor Milton Ribeiro teria resolvido tudo. É evidente que a degradação do governo não se chama Pazuello, Araújo, Salles, Rodrígues ou Weintraub”, acrescenta.
“A decomposição se chama Jair Bolsonaro. Chegou ao Planalto como solução dos quase 58 milhões de brasileiros que o elegeram. Virou um problema ao fazer opção prioritária pela ideologia da crise, da trapalhada e do trambique. Dedica-se há mais de três anos à destruição do Estado”, conclui.
Após muita pressão, O procurador-geral da República, Augusto Aras, decidiu parar de se fingir de morto e afirmou que irá pedir ao STF (Supremo Tribunal Federal) a abertura de inquérito para investigar a conduta do ministro da Educação.