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Porque o Oriente Médio não se unirá aos Estados Unidos no isolamento da Rússia

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Israel fez o movimento mais emblemático ao interferir diretamente com os EUA, seu principal aliado, para evitar que fosse transferido para a Ucrânia seu Domo de defesa anti-mísseis, que teria feito enorme diferença, argumentando que não queria se indispor com os russos. Por envolver a ascensão de forças neonazistas, a guerra atual é complexa sob o ponto de vista israelense

Imagem: Eduard Kornienko | URA

Texto: M K Bhadrakumar* <> Tradução: Pedro Galhardo** | NegoPB

A comunidade internacional está horrorizada com o agravamento das tensões entre os Estados Unidos e seus aliados da OTAN, por um lado, e a Rússia do outro, ambos à beira de um confronto militar direto, coisa que o mundo nunca viu nem mesmo durante os anos da Guerra Fria.

O mais chocante é que a escalada do conflito ainda não mostra limites, sendo disputado com unhas e dentes à medida que preconceitos raciais e religiosos da cultura ocidental vêm à tona.

É impressionante assistir a defesa que canais de TV do Ocidente fazem de uma política de fronteiras abertas aos refugiados da Ucrânia nos países da Europa e como ela escancara conflitos culturais subterrâneos escondidos por baixo da fina camada de verniz da modernidade.

Jornalistas ocidentais têm argumentado apaixonadamente que estes refugiados não são como aqueles subumanos vindos de países muçulmanos que batem à porta dos europeus em busca de ajuda, outrossim, são ucranianos que antes de mais nada são cristãos e, ainda por cima, têm cabelos loiros e olhos azuis!

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Somente em tempos extremos que o véu da cultura e da modernidade europeia vem abaixo e podemos contemplar a verdadeira natureza humana em sua cruel nudez. Não é questão de educação ou saúde.

Até mesmo António Manuel de Oliveira Guterres está mudado esses dias. Ele se comporta muito mais como uma marionete ocidental da Igreja Católica Romana do que como secretário-geral das Nações Unidas.

Depois de Dag Hammarskjöld, Guterres é o primeiro secretário-geral das Nações Unidas a se chocar diretamente contra um membro permanente do Conselho de Segurança, ou, mais precisamente, ele foi o primeiro a assumir abertamente a posição de um membro do Conselho de Segurança contra outro.

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O desentendimento de Hammarskjöld com os EUA não foi pessoal, foi antes baseado em princípios e ideologia, enquanto os motivos de Guterres são duvidosos. Será coincidência que seus representantes especiais em lugares problemáticos onde o interesse ocidental está em jogo (como em Myanmar, Somália, Sudão, Afeganistão ou Venezuela), sejam justamente de países ocidentais?

A quietude dos países muçulmanos

É claro que Guterres muito provavelmente não irá encontrar o trágico destino de Hammarskjöld. Mas Guterres diminui o papel de uma organização onde a grande maioria dos países não são ocidentais.

Nem um único país muçulmano levantou a voz em apoio a Washington em seu confronto com a Rússia. E muito embora eles sejam acionistas de uma possível Terceira Guerra Mundial, eles preferem não pensar nisso.

O cerne da questão é que eles veem o conflito como mais uma cruzada cristã, baseada em valores como ‘lei e ordem’ que eles já experimentaram com tanta frequência. Sua visão é de que os países ocidentais estão de volta com suas guerras bestiais tão endêmicas na história da Europa.

Acredita-se que a Arábia Saudita recusou abertamente os pedidos da administração Biden de romper a aliança com a Rússia conhecida com OPEP+ que realiza um ajuste fino no suprimento mundial de petróleo.

O Irã e a Síria, rivais da Arábia Saudita, apoiaram abertamente a Rússia. A Turquia, por sua vez, ofereceu mediação entre a Rússia e a Ucrânia e têm grande participação nas conversas com Belarus.

No entanto foi Israel quem fez o mais notável movimento em direção à Rússia, repleto de uma profunda carga histórica. Israel interferiu diretamente com os EUA e evitou que fosse transferido para a Ucrânia seu Domo de defesa anti-mísseis, que teria feito enorme diferença no cenário atual, argumentando que não queria se indispor com os russos.

Tanto Washington como Tel Aviv travaram esta batalha antes que fosse de conhecimento público. Então veio o pedido da administração Biden em busca de apoio junto ao Conselho de Segurança para aprovação da resolução com respeito à Ucrânia. Israel se recusou a apoiar. Os Estados Unidos deixaram claro seu descontentamento.

Depois disso, em conversa com o ministro das Relações Exteriores em Moscou, o embaixador russo perguntou ao seu colega israelense se ele estava ciente do que estava acontecendo na Ucrânia – onde o poder se encontra nas mãos de grupos neonazistas com o apoio de potências do Ocidente.

Sem sombra de dúvidas que Israel estava ciente da situação. A Ucrânia não é qualquer país sob o ponto de vista israelense. Foi lá que, em fins de setembro de 1941, o exército nazista, juntamente com a SS, a polícia de Hitler, cometeu um dos maiores massacres da Segunda Guerra Mundial.

O massacre aconteceu na ravina de Babi Yar, nos arredores da capital Kiev.

De acordo com Enciclopédia do Holocausto, “os alemães continuaram a realizar massacres no lugar até que o exército soviético retomou o controle de Kiev em 1943”. Durante este período, os alemães massacraram judeus, civis ucranianos e prisioneiros de guerra soviéticos.

“Décadas após a guerra, Babi Yar ainda representa a luta pela preservação da memória da Segunda Guerra Mundial e do holocausto na União Soviética”.

Nós nunca saberemos a reação do embaixador israelense à provocação, mas com certeza os russos tiveram uma bela surpresa quando o primeiro Ministro de Israel Naftali Bennett chamou o presidente russo Vladimir Putin no domingo em uma tentativa de mediação do conflito na Ucrânia.

Em breve nota, a declaração do governo russo: “O primeiro ministro Naftali Bennett ofereceu os serviços israelenses de mediação na tentativa de parar as ações militares”.

Claro que Putin atualizou Bennett sobre o andamento da operação militar especial para defender Donbas e explicou que Moscou “está pronta para conversar com representantes do governo de Kiev que até agora mostraram abordagem inconsistente e ainda não fizeram uso desta oportunidade”.

Israel está em posição delicada. Os EUA são seus aliados mais próximos e Bennett está se equilibrando na corda bamba para que as diferenças com administração Biden não se tornem disputas, como aconteceu no caso de seu antecessor Benjamin Netanyahu.

Por outro lado, Israel tem uma relação especial com a Rússia uma vez que os mesmos também sofreram enormemente nas mãos dos invasores nazistas. Não esqueçamos que mais de 20 milhões de cidadãos soviéticos perderam suas vidas no decurso da Segunda Guerra Mundial.

Israel está igualmente consciente que a Rússia está comprometida na campanha contra o fascismo em um momento que o Ocidente decidiu não só virar as costas ao problema, como passou também a ser conivente com a ideologia nazista na Europa.

Com toda certeza que a inteligência israelense está ciente do envolvimento da Alemanha com neonazistas na Ucrânia. Mas o que pode Israel fazer sozinha? É uma realidade extremamente dolorosa, tanto para os israelenses quanto para os russos que no ecossistema político ocidental a ideologia nazista agora é tolerada.

Não é impressionante que três religiões abraâmicas estejam num dilema sobre a guerra que aflige o mundo cristão? Esta crise na Ucrânia fez, de fato, estranhos companheiros.

Os Emirados Árabes Unidos, um dos mais ferrenhos aliados dos americanos na região, se abstiveram duas vezes nos últimos dias de apoiar as resoluções que condenam a Rússia no Conselho de Segurança da ONU.

*M K Bhadrakumar é um ex-diplomata indiano
** Pedro Galhardo é tradutor pedrogalhardotraducoes@gmail.com

Acesse aqui o TEXTO ORIGINAL COM FOTOS | PUBLICADO NO PORTAL ASIA TIMES

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