União Europeia e gigantes da web censuram as agências RT e Sputnik
Se a guerra da informação já era desigual, com todos os gigantes conglomerados de mídia condenando apenas um lado e divulgando uma única narrativa, essa disparidade se acentua com a censura às agências RT e Sputnik. Além dos países da União Europeia, gigantes da web estão limitando o alcance das publicações de veículos de comunicação que ousam não reverberar a versão ocidental do conflito
O Conselho Europeu anunciou, nesta quarta-feira (2), a decisão de proibir todas as atividades dos canais russos Russian Today (RT) e Sputnik News. A medida vale para o território da União Europeia, sob acusação de que os veículos de espalham desinformação. A RT é um canal internacional de televisão, e a Sputnik, uma agência de notícias. Os dois veículos são estatais, ligados ao governo russo.
De acordo com o comunicado, a proibição permanecerá em vigor “até que a agressão à Ucrânia seja encerrada e até que a Federação Russa e seus veículos associados deixem de realizar ações de desinformação e manipulação de informações contra a UE e seus estados membros”.
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O órgão ligado à União Europeia afirmou ainda que as duas organizações de notícias eram “essenciais e instrumentais” para “levar adiante e apoiar” a ofensiva militar russa na Ucrânia.
A editora-chefe adjunta da RT, Anna Belkina, se manifestou sobre a decisão. Ela condenou a medida e disse que os críticos do veículo não “apontaram para um único exemplo, um único grão de evidência de que o que a RT relatou ao longo desses dias, e continua a relatar, não é verdade”.
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Nos últimos dias, antes mesmo da decisão da UE, grandes plataformas tomaram decisões que restringiram acesso aos veículos.
YouTube suspendeu canais digitais
No domingo (28/02), o YouTube, que pertence ao Google, suspendeu a operação dos canais digitais da RT e Sputnik ao redor da Europa. A empresa não se aprofundou na justificativa da decisão, mencionando apenas que foi motivada “pela atual guerra”.
Due to the ongoing war in Ukraine, we’re blocking YouTube channels connected to RT and Sputnik across Europe, effective immediately. It’ll take time for our systems to fully ramp up. Our teams continue to monitor the situation around the clock to take swift action.
— Google Europe (@googleeurope) March 1, 2022
Meta bloqueia Facebook e Instagram; TikTok bane canais temporariamente
Na mesma data, a Meta, dona do Facebook e do Instagram, também bloqueou RT e Sputnik. “Recebemos pedidos de governos que querem um bloqueio do acesso às mídias estatais. Vamos continuar trabalhando com eles”, disse a empresa em nota.
Mesmo o TikTok tomou a mesma decisão que Google e Meta. O aplicativo de vídeos curtos chinês tem grande popularidade entre jovens e passou a aplicar a restrição aos canais da RT e Sputnik, que operavam na plataforma.
Twitter rotula como “afiliados ao governo”
Em nota enviada ao site Politico nesta quarta (2), o Twitter disse que vai derrubar as contas de RT e Sputnik depois que as sanções da UE entrarem em vigor.
“As sanções da União Europeia provavelmente exigirão legalmente que retenhamos certos conteúdos nos estados membros da UE. Pretendemos cumprir a ordem quando ela entrar em vigor”, disse um porta-voz da rede.
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Nos últimos dias, a rede social já havia tomado a decisão de marcar as páginas como “afiliadas ao governo russo” e acabou estendendo a prática até mesmo a contas pessoais de jornalistas, inclusive da sucursal brasileira da Sputnik.
Lo ha hecho tw calificando a periodistas en sus rrss (ya no solo medios) como “afiliados al gobierno de Rusia”. Ya sea porque son freelance de estos medios o porque usan a estos como fuente. Esto me parece interesante para debatir sobre Libertad de expresión y autorregulación. pic.twitter.com/yXeYig0lxd
— Chiara Sáez Baeza (@gatasaba) March 2, 2022
Decisão é criticada: “Sanção injustificada”
A decisão da União Europeia e das plataformas gerou uma série de críticas de entidades e acadêmicos, que veem “censura” aos veículos. O historiador e jornalista indiano Vijay Prashad, diretor do Instituto Tricontinental de Pesquisa Social, relembrou a morte de um cinegrafista por ataques dos Estados Unidos na invasão do Iraque.
“Em solidariedade aos repórteres da RT que foram bloqueados. Lembro-me de quando os EUA mataram Tareq Ayoub, da AlJazeera, em 2003, em Bagdá. Todos os repórteres devem ficar juntos”, escreveu, em sua conta no Twitter.
In solidarity with reporters for @RT_com & others (incl @Marco_Terugg) that have been barricaded & blocked. I remember when the US killed Tareq Ayoub of @AlJazeera in 2003 in Baghdad. All reporters must stand together.
Picture: when I was with @afshinrattansi on his show. pic.twitter.com/K1lRyS2K0z— Vijay Prashad (@vijayprashad) March 1, 2022
A presidente da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ), Maria José Braga, também criticou a decisão das plataformas em bloquear o acesso aos veículos e rotular seus repórteres como “afiliados ao governo russo”.
“A rotulação do Twitter de jornalistas da Sputnik como ‘mídia controlada pelo Estado do(a)/s Rússia’ é uma sanção injustificada, porque os jornalistas fazem seu trabalho e devem continuar a fazê-lo, ainda mais quando estão em uma situação de conflito”, apontou Braga à Sputnik.
Segundo a presidente da FENAJ, “embora a Sputnik seja estatal, é uma agência de jornalismo de profissionais competentes e comprometidos“.
“É preciso defender o direito profissional de se trabalhar na Sputnik”, disse.