Quando surgiram os áudios, Bolsonaro disse que botava a cara no fogo pelo então ministro. O escândalo derrubou Ribeiro, que ontem foi depor à Polícia Federal. No depoimento, o ex-ministro não botou a cara no fogo pelo presidente: confirmou que foi Bolsonaro quem o orientou a receber os dois religiosos
Chico Alves, em seu blog
Depois que surgiram as denúncias sobre um esquema de pastores que intermediavam obras do Ministério da Educação em troca de propina, o presidente Jair Bolsonaro disse que botava a cara no fogo pelo então ministro Milton Ribeiro. O escândalo derrubou Ribeiro, que ontem foi depor à Polícia Federal. No depoimento, o ex-ministro não botou a cara no fogo por Bolsonaro: confirmou que foi o presidente quem o orientou a receber os dois religiosos.
Ribeiro não fez mais do que reiterar à PF o que já dissera aos próprios pastores no áudio comprometedor divulgado pela Folha de S. Paulo. “O presidente Jair Bolsonaro realmente pediu para que o pastor Gilmar fosse recebido“, disse ele ao delegado. Referia-se a Gilmar Santos, pastor da Assembleia de Deus que não ocupa nenhum cargo público e agia como intermediário do MEC junto a prefeitos. Segundo denúncias, ele fazia isso em troca de propina, juntamente com Arilton Moura, outro pastor.
No depoimento, o ex-ministro fez a ressalva de que “isso não quer dizer que o mesmo ( Gilmar) gozasse de tratamento diferenciado ou privilegiado na gestão do FNDE [Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação] ou MEC, esclarecendo que, como ministro, recebeu inúmeras autoridades, pois ocupava cargo político“.
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Nesse ponto, o ex-chefão do MEC contradiz o áudio e os fatos. Ele diz na gravação: “Porque a minha prioridade é atender primeiro os municípios que mais precisam e, em segundo, atender a todos os que são amigos do pastor Gilmar“. Não há dúvida de que esse é um tratamento “diferenciado ou privilegiado”, ao contrário do que Ribeiro disse à PF.
E esse privilégio não foi apenas uma bravata para agradar aliados, como alegou o ex-ministro. Reportagem do jornal O Estado de S. Paulo mostrou que os dois pastores intermediaram encontros de prefeitos no ministério que tiveram como consequência pagamentos e empenhos de R$ 9,7 milhões apenas alguns dias ou semanas depois.
Como denunciaram vários prefeitos, essa intermediação era feita em troca de propinas de R$ 15 mil a R$ 30 mil em dinheiro ou ouro e também de até R$ 70 mil em compras de bíblias. Uma dessas edições do Livro Sagrado trazia fotos dos pastores Gilmar e Arilton e também do próprio Milton Ribeiro.
Pela lógica, agora seria a vez de Bolsonaro explicar à PF por qual motivo orientou um subordinado seu, o ministro da Educação, a receber dois religiosos que não têm cargo na administração pública por meio de um “pedido especial”, como diz Ribeiro no áudio. Sem essa interferência do presidente, o esquema de corrupção no MEC jamais teria existido.
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O problema é que no Brasil a lógica não tem andado com muito prestígio. O mais provável é que o procurador-geral da República, Augusto Aras, se mostre mais uma vez aliado do governante que deveria fiscalizar e livre Bolsonaro do ônus de dar explicações.
Assim, diante de mais uma denúncia sem investigação, Bolsonaro continuará a repetir a mentira surrada de que não há corrupção em seu governo.
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