Salva por bilhete: com sistema de câmeras de vigilância, homem manteve esposa e as duas filhas em cárcere privado em SP. Policial que salvou as vítimas diz que "nunca tinha visto nada parecido". Vizinha que encontrou o bilhete se diz aliviada: "Ele disse que iria matá-las quando voltasse do trabalho. Salvei três vidas"
Uma mulher de 23 anos foi resgatada pela polícia após ser mantida em cárcere privado, com as filhas de 2 e 7 anos, na residência da família, em José Bonifácio, no interior de São Paulo. Ela foi socorrida após jogar um bilhete por cima do muro da residência, em direção ao quintal da vizinha, pedindo socorro. O caso foi registrado na tarde de terça-feira (12).
“Oi, sou sua vizinha. Estou presa dentro de casa com duas crianças. Pode chamar a polícia para mim? Estou correndo risco de morte”
Segundo a Polícia Militar, a mulher resolveu escrever o bilhete e pedir ajuda porque tinha sido ameaçada pelo marido, Luiz Sergio do Nascimento Botão, de 64 anos.
“Ela não tinha contato com ninguém. Foi a forma que encontrou para pedir socorro. O homem disse que mataria a esposa quando chegasse do trabalho”, explica o tenente Matheus Maestra.
Ainda conforme a Polícia Militar, a vizinha da mulher leu o recado escrito à mão, ficou preocupada e discou 190.
“Nós fomos para a residência e começamos a escutar a mulher pedindo socorro e agradecendo pela nossa presença. ‘Me ajude, socorro. Graças a Deus vocês chegaram’. Por uma janela, deu para ver a mãe e as crianças. Elas estavam muito assustadas. As crianças diziam: ‘tio, me tira daqui. A gente tá presa. Ajuda a gente’. Elas basicamente clamavam por ajuda”, diz o tenente.
Após a equipe entrar no local, a mulher foi questionada sobre quem a havia prendido junto às crianças e o nome do marido foi apontado. “Foi quando ela disse para mim: ‘Olha, moço. O senhor está sendo filmado. Todo mundo está sendo filmado, ele está assistindo tudo’. Foi aí que descobrimos que ele tinha um sistema de monitoramento com várias câmeras, todas voltadas para a residência”.
Ela relatou que vivia uma rotina de agressões do marido. “Eu estava presa dentro da minha própria casa. Meu marido tem muito ataque de ciúme e estava me matando por isso. Ele tinha ciúme de qualquer homem”, contou.
“A rotina em casa era assim: ele saía de manhã para trabalhar, deixava as portas abertas, só encostadas, e levava a chave do portão. Eu saía para o quintal e lá tinha quatro câmeras controlando cada passo que eu dava. Se eu precisasse ir para a rua, eu ia acompanhada da irmã dele ou dele. Nunca saí para a rua sozinha para fazer nada.”
Na terça-feira (12), o homem a ameaçou na hora do almoço, porque viu o comentário de um homem nas redes sociais.
“Ele me deu quatro tapas na cara, me chamou de ‘vagabunda’, ‘vadia’, olhou no relógio e viu que estava atrasado para trabalhar. Depois falou: ‘quando eu chegar, durante a noite eu te mato. Se prepara'”, afirmou a vítima.
“Entrei em pânico. Não sabia o que ia fazer. Não tinha celular, não tinha como chamar polícia, não tinha como fazer nada. Achei o modo mais fácil que foi tentar gritar para a vizinha. Gritei várias vezes, e ela não escutou. Aí eu amarrei o bilhetinho no papel e joguei pela janela”.
Muro alto, janelas trancadas e câmeras
O tenente Maestra afirmou que, em 18 anos de corporação, nunca tinha atendido a um caso semelhante.
A casa onde as vítimas estavam era cercada por muros altos, cinco câmeras de segurança, janelas trancadas com grades e o portão de entrada estava trancado e os agentes precisaram escalar para verificar a situação e arrombar o imóvel para fazer o resgate.
O suspeito foi detido na bicicletaria que possui na cidade. “Quando a equipe chegou lá, se deparou com o suspeito sentado, como se nada tivesse acontecido, assistindo ao que acontecia na casa pelas câmeras. Um dos agentes perguntou para ele se ele estava monitorando a esposa e ele disse que sim, que trancava e vigiava ela o tempo todo para que ela não fugisse”, afirma Maestra.
“Ele confessou que cometia o crime porque tinha ciúme excessivo. A mulher não soube informar quantos dias foi mantida dentro de casa, porque perdeu a noção do tempo, mas disse que foram meses”, conta Maestra.
O homem foi preso em flagrante por cárcere privado, lesão corporal e ameaça. Ele já tinha anotações policiais por cárcere privado praticado contra outra mulher e por tentativa de homicídio, segundo a polícia.
A mãe e as crianças resgatadas foram encaminhadas para um abrigo. “Às vezes, quando pensava em desistir de tudo, lembrava das minhas filhas. Foi isso que me manteve forte”, afirmou a vítima.
Luiz Sergio do Nascimento Botão passou por audiência de custódia nesta quarta-feira (13) e teve a prisão mantida, sendo encaminhado ao Centro de Detenção Provisória de São José do Rio Preto, onde aguardará julgamento.
A Polícia Civil de José Bonifácio segue investigando o caso.
Vizinha aliviada
A mulher que encontrou o bilhete no quintal da casa da patroa pensou que uma criança tinha jogado o papel, mas decidiu abri-lo. “Achei que podia ser brincadeira. Vi que tinha giz de cera e pilha no chão. Li o papel e fiquei assustada. Peguei o telefone e liguei 190”, disse.
A jovem e as filhas mantidas em cárcere privado foram resgatadas graças à mulher que encontrou o pedido de socorro. “Salvei três vidas. A gente nunca sabe. Vai que lá na frente acontecesse alguma coisa. Graças a Deus deu tudo certo. Estou aliviada”, contou a mulher.
Com G1 e Uol
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