Homem com tatuagem nazista circula sem camisa na orla de João Pessoa
Constituição brasileira diz que é crime veicular símbolos, emblemas, ornamentos ou propaganda que utilizem a suástica nazista: "Ele estava bem tranquilo", diz testemunha
Cida Alves, Brasil de Fato
Um homem foi fotografado em um bar da orla de João Pessoa, na Paraíba, no sábado (03) circulando sem camisa e mostrando uma tatuagem com suástica nazista. A fotografia foi feita por um cliente do bar e enviada para o jornal Brasil de Fato. “Estava no quiosque comemorando meu aniversário com mais dois amigos, quando olho para o lado, vejo isso. Ele estava tranquilo, assim, andando sem camisa e mostrando essa suástica que tava tatuada nas costas dele para quem quisesse ver. Bem tranquilo”, disse a pessoa que fotografou.
A tatuagem nas costas do homem é de um anjo ajoelhado, com a cabeça baixa em oração, reverenciando a cruz da suástica. O regime nazista pregava a supremacia branca, mas na foto podemos ver que o homem tem a pele negra.
É crime no Brasil apologia usando símbolos que remetem ao nazismo: “veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo”, Parágrafo 1 Artigo 20 da Lei nº 7.716 de 05 de Janeiro de 1989.
A propaganda do regime é crime previsto em lei no Brasil, com pena de reclusão. No entanto, com uma frequência cada vez maior vem sendo possível encontrar pessoas circulando com símbolos que remetem ao nazismo em toda a extensão nacional.
“Esse é um assunto que incomoda muita gente e que deve incomodar mesmo. A gente não pode mais aceitar de forma alguma qualquer tipo de violência, seja simbólica, física, sexual, política, histórica-antropológica, ou qualquer tipo de violência simbólica porque dentro desse simbolismo tem uma história que foi real e que matou muita gente, que em nome dessas bandeiras supremacistas elas têm uma representatividade muito forte do jeito mais obscuros da sociedade. É a cultura da violência e eles buscam realmente a morte”, opina Tenente Pereira, que é Coordenador do Movimento Policiais Antifascismo na Paraíba.
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“Evidentemente que isso é muito chocante para uma sociedade como a nossa, ou como qualquer outra no mundo que sofreu bastante em virtude dessa ideias supremacistas do nazismo. Então, é importante lembrar que essa veiculação realmente é crime. A polícia deve ser acionada, deve agir rapidamente e fazer a intervenção para a ocorrência. Ver as partes, se alguém está cometendo algum crime realmente, porque se a pessoa está usando uma suástica nas costas e tá com a camisa, e não tem visibilidade entao fica no privado. Mas se ele sai às ruas, numa atividade pública, se ele deixa muito claro seu posicionamento nazista, evidentemente que ele deve ser conduzido para a delegacia e responder por isso”, completa Pereira.
O que é apologia do nazismo
A Lei 7.716/1989 enquadra a apologia do nazismo como crime da seguinte maneira:
-Praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. Pena: reclusão de um a três anos e multa – ou reclusão de dois a cinco anos e multa se o crime foi cometido em publicações ou meios de comunicação social.
-Fabricar, comercializar, distribuir ou veicular símbolos, emblemas, ornamentos, distintivos ou propaganda que utilizem a cruz suástica ou gamada, para fins de divulgação do nazismo. Pena: reclusão de dois a cinco anos e multa.
Crime inafiançável
A lei classifica o racismo como crime inafiançável e imprescritível e significa que o racismo pode ser julgado e sentenciado a qualquer momento, não importando quanto tempo já se passou desde a conduta.
Inicialmente, não havia menção ao nazismo na legislação, que era destinada principalmente ao combate do racismo sofrido pela população negra.
Apenas em 1994 e 1997 foram incluídas as referências explícitas ao nazismo, por projetos de lei apresentados pelos deputado federal, na época, Alberto Goldman e Paulo Paim.
Precedente no STF
Segundo especialistas, o direito à liberdade de expressão não engloba a apologia do nazismo. Essa questão, inclusive, já foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal em 2003 num julgamento considerado histórico e que ficou conhecido como caso Ellwanger.
O escritor gaúcho Siegfried Ellwanger Castan publicara uma série de obras que negavam o Holocausto judeu, um deles intitulado ‘Holocausto Judeu ou Alemão?’. Foi o primeiro condenado definitivo por antissemitismo na América Latina.
O Supremo, ao negar habeas corpus mantendo a pena do escritor, decidiu que “escrever, editar, divulgar e comerciar livros fazendo apologia de ideias preconceituosas e discriminatórias contra a comunidade judaica constitui crime de racismo sujeito à inafiançabilidade e imprescritibilidade”.
Além disso, a Corte concluiu que “o preceito fundamental de liberdade de expressão não consagra o direito à incitação ao racismo, dado que um direito individual não pode constituir-se em salvaguarda de condutas ilícitas, como sucede com os delitos contra a honra”.
“No estado de direito democrático devem ser intransigentemente respeitados os princípios que garantem a prevalência dos direitos humanos. Jamais podem se apagar da memória dos povos que se pretendam justos os atos repulsivos do passado que permitiram e incentivaram o ódio entre iguais por motivos raciais de torpeza inominável”, diz a decisão do STF.
Desde então, a composição da Suprema Corte mudou, mais dois ministros que hoje compõem o STF já se manifestaram sobre o tema, reconhecendo que a apologia do nazismo é crime.
“A Constituição consagra o binômio: liberdade e responsabilidade. O direito fundamental à liberdade de expressão não autoriza a abominável e criminosa apologia do nazismo”, escreveu Alexandre de Moraes.
Gilmar Mendes declarou: “Qualquer apologia do nazismo é criminosa, execrável e obscena. O discurso do ódio contraria os valores fundantes da democracia constitucional brasileira. Minha solidariedade à comunidade judaica”.
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