Os professores e as eleições
No mesmo Rio Grande do Sul, há um candidato acusando as escolas gaúchas de promoverem “ideologia de gênero”(sic) com nossas crianças. Ganha uma tarde com um sexto ano quem adivinhar quem ele apoia pra presidente.
Delmar Bertuol*, Pragmatismo Político
Não é novidade destas eleições. Desde sempre, os professores são usados por candidatos de ambos os poderes cujos membros são elegíveis e em todos os níveis da Federação. Faz sentido. Defender a prioridade da Educação é simpático e popular. Ninguém em sã consciência refuta a ideia de que uma sociedade só progride com boa educação. Ainda que a discutir o que seria uma boa educação para cada grupo político/ideológico.
À exceção dos bolsonaristas, que desses eu não posso afirmar com certeza, é também consenso que uma boa educação (seja lá o que isso for) passa por melhorias nas infraestruturas das escolas e da valorização dos professores.
E sobre valorização dos professores, é preciso fazer um breve, mas definitivo parênteses: (valorização do magistério é com aumento salarial e com planos de carreira que de fato incentivem a realização de aperfeiçoamento e formações inclusive em nível de pós-graduações. Valorização com discursos bonitos e sensíveis não são mais que falsas gratidões. Escrevi sobre isso neste mesmo espaço há algum tempo “Sou professor, não herói”.
Neste ano, não é diferente. Os discursos relativos à educação estão presentes nas candidaturas ao Senado, aos governos estaduais e à presidência, pelo menos.
Os bolsonaristas defendem que deve continuar o combate “ao método Paulo Freire”. Eles nunca leram uma página do que escreveu Paulo Freire. Aliás, todos que criticam Paulo Freire não o leram. De minha parte, acho que, infelizmente, as escolas de educação básica justamente devem tentar (e é sempre uma tentativa) aplicar ainda mais os reconhecidos métodos freirianos. Os aplicamos pouco. E isso não tem nada a ver com supostos combates a eles dos últimos anos. Faça-se justiça, aliás. O Bolsonaro nunca combateu o método Paulo Freire. E não por concordar com ele, mas por sequer saber do que se trata. Por questões infraestruturais (carência delas) e por outras peculiaridades do quotidiano escolar, nem sempre se consegue pôr em práticas ideias e teorias. Uma das principais dificuldades é o fato que, para ter um salário um pouco melhor, a maioria dos professores lecionam em mais de uma escola, dificultando planejamentos com os colegas.
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Aqui no Rio Grande do Sul, o candidato à reeleição (sim, é reeleição, apesar dele ter pedido afastamento para tentar concorrer à presidência e refutar o rótulo) garante que investiu nas estruturas das escolas e valorizou os professores. Não sou mais professor da rede estadual, mas a se constatar se os prédios estão mesmo nas condições que ele alega.
E quanto à propagada valorização, o que ele fez foi literalmente o mínimo: garantiu o salário mínimo dos professores, o Piso do Magistério. Além disso, passou seus quatro anos sem realizar concurso público para o cargo. Aliás, aqui no Rio Grande, o último pleito foi em 2013, no governo do petista Tarso Genro. Após ele, Sartori e Leite governaram com concurso expirado e só chamaram profissionais via contratos emergenciais, um limbo jurídico, com trabalhadores sem direitos de servidores efetivos e nem as prerrogativas de celetistas.
No mesmo Rio Grande do Sul, há um candidato acusando as escolas gaúchas de promoverem “ideologia de gênero”(sic) com nossas crianças. Ganha uma tarde com um sexto ano quem adivinhar quem ele apoia pra presidente.
Eu, de verdade, não sei o que é ideologia de gênero. Mas, já vou adiantando, se tiver que fazer isso em aula, não vou conseguir dar conta das outras habilidades que, segundo a BNCC, tenho que dar conta até o fim do ano. Já tô com os prazos quase atrasados. E ainda marquei prova pra semana que vem.
Na âmbito presidencial, o candidato do Partido Novo deu a entender que quer privatizar todas as escolas. Segundo essa turma, as instituições particulares são melhores que as públicas. A se comparar resultados, um leigo faz diretamente esse julgamento mesmo. Mas o que não é levado em conta é a situação social e econômica dos estudantes da educação privada, que têm obviamente mais chances e oportunidades extraclasse. Além disso, nesses locais há de fato uma infraestrutura bem melhor e que os pais podem cobrar diretamente da mantenedora.
A cada dois anos fico mesmo esperançado. São todos os candidatos, de vereadores a presidente garantindo que a Educação e eu (professores) seremos agora valorizados de fato. Do Eduardo Leite ao Bolsonaro, todos garantem que estão e vão continuar investindo forte em Educação. Não vemos isso na prática, mas eles juram que fazem/farão.
Acho que, se a leitora ou o leitor é professor ou somente um cidadão de fato preocupado com a Educação do Brasil (ou só do seu filho, também é legítimo), visite uma escola. Pergunte à direção sobre os investimentos. Questione um professor sobre quem de fato lhe deu um digno aumento salarial. Faça isso despretensiosamente, sem, na medida do possível, enveredar para a política partidária.
Impressionem-se (ou não) com as respostas e percebam como a maioria dos discursos estão desconexos com a realidade.
*Delmar Bertuol é professor de história da rede municipal e estadual, escritor, autor de “Transbordo, Reminiscências da tua gestação, filha”
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