Biden recebe documento para "se preparar" caso Bolsonaro rejeite resultado da eleição
A defesa da democracia é uma das agendas prioritárias da gestão Biden, que chegou a realizar um encontro com quase uma centena de países - incluindo o Brasil - para debater e cobrar compromissos em relação à promoção dos princípios democrático
Mariana Sanches, BBC
A menos de 48 horas do início da eleição presidencial no Brasil, 31 congressistas dos Estados Unidos enviaram, na manhã desta sexta-feira (28) uma carta ao presidente americano Joe Biden em que expressam “preocupação crescente” em relação à disputa eleitoral no Brasil e recomendam que a Casa Branca reconheça o resultado da eleição assim que anunciado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), na noite do próximo domingo (30).
Na carta, os congressistas — independentes ou democratas — dizem que Luiz Inácio Lula da Silva (PT) terminou o primeiro turno na frente de Jair Bolsonaro (PL), que atrelou o reconhecimento dos resultados a um relatório das Forças Armadas. Depois de pronto — e sem encontrar indícios de fraude — o relatório dos militares não foi divulgado.
O Ministério da Defesa afirmou que pretende tornar público o material apenas após o segundo turno eleitoral. Além dos militares, o Tribunal de Contas da União (TCU) e observadores internacionais, como a Organização dos Estados Americanos (OEA), não encontraram qualquer indício de irregularidades na votação e apuração dos votos no primeiro turno.
“Dada a recusa do presidente Bolsonaro em admitir que respeitará o resultado da eleição e, na ausência de denúncias fundamentadas de irregularidades por observadores eleitorais independentes credíveis, os Estados Unidos e a comunidade internacional devem estar preparados para reconhecer prontamente os resultados anunciados pelo autoridade em 30 de outubro”, escreveram os parlamentares a Biden, às vésperas do pleito no Brasil.
Entre os signatários da carta estão estrelas da política americana, como os presidentes das Comissões de Relações Exteriores do Senado, Bob Menendez, e da Câmara, Gregory Meeks.
Bolsonaro tem insistido na possibilidade de fraude — mesmo sem evidências — e agora afirma que nem mesmo os militares podem certificar a lisura do processo.
“O que nos traz certa confiança é que as Forças Armadas foram convidadas a integrar uma comissão de transparência eleitoral. E elas têm feito um papel atuante e muito bom neste sentido”, disse, há alguns dias, quando questionado sobre a confiabilidade do pleito. “Contudo, eles me dizem que é impossível dar um selo de credibilidade, tendo em vista ainda as muitas vulnerabilidades que o sistema apresenta”, completou.
Bolsonaro venceu todas as eleições que disputou com às urnas eletrônicas ao longo de sua carreira política de mais de 3 décadas. Embora já tenha dito que, caso perdesse a disputa, “não teria mais nada para fazer na Terra” e que passaria a faixa presidencial, Bolsonaro tem sistematicamente atacado o TSE, que organiza as eleições, e lançado dúvida sobre as urnas. Ele já disse, sem apresentar qualquer prova, que ganhou no primeiro turno de 2018.
As reiteradas afirmações de Bolsonaro em desafio à eleição acenderam alertas entre as autoridades dos EUA.
Na mensagem ao presidente americano, os congressistas citam ainda que Bolsonaro estaria atuando de modo semelhante a Donald Trump, que contestou a vitória de Biden em 2020 com alegações jamais comprovadas. As afirmações do republicano, que não admitiu a derrota nem compareceu à posse de seu sucessor, desaguaram na invasão do Congresso dos EUA por trumpistas durante a certificação da vitória de Biden. O episódio resultou em cinco mortes e em uma investigação no Congresso sobre os atos de Trump e seus aliados no episódio.
“Há fortes temores de que, se Bolsonaro perder, ele vá contestar os resultados do segundo turno, quando a diferença entre Bolsonaro e Lula pode vir a ser reduzida. Segundo aliados de Bolsonaro, ele já está supostamente trabalhando em um ‘projeto de resistência ao estilo Donald Trump’ no caso de perder a eleição. Se esses temores se confirmarem e Bolsonaro rejeitar ativamente os resultados das eleições, devemos estar preparados para nos posicionar inequivocamente em defesa da democracia no Brasil”, escrevem na mensagem.
O texto menciona ainda a alta da violência política no país no período eleitoral e diz que será papel dos americanos denunciar qualquer “incitação à violência política” no dia da eleição ou depois disso.
Monitoramento
A BBC apurou que a Casa Branca e o Departamento de Estado monitorarão de perto o decorrer da votação e o anúncio do vencedor ainda no domingo.
Poucos dias antes do primeiro turno, por iniciativa do senador Bernie Sanders, o Senado dos EUA aprovou uma recomendação para que o governo dos EUA rompesse relações com o Brasil em caso de tentativa de ruptura democrática.
A manifestação às vésperas do segundo turno se soma a uma série de mensagens enviadas pela administração Biden, direta ou indiretamente, ao governo Bolsonaro, expressando preocupação com a saúde da democracia no Brasil e desencorajando eventuais comportamentos golpistas dos atores políticos e militares do país.
A defesa da democracia é uma das agendas prioritárias da gestão Biden, que chegou a realizar um encontro com quase uma centena de países – incluindo o Brasil – para debater e cobrar compromissos em relação à promoção dos princípios democrático.
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