Apoiadora de Bolsonaro fez vídeo queimando rosto de bezerro com o '22' e jingle do presidente. Após ser alvo de denúncia, a mulher justificou que fazia marcação de rotina, mas Conselho de Medicina Veterinária afirma que ela não seguiu padrão exigido por órgãos oficiais. "Não se pisa na cabeça do animal e é ilegal marcar dois números, como ela fez. Além disso, queimar o rosto é uma prática cada vez mais em desuso, uma vez que se trata da área mais sensível do animal. As fazendas hoje já utilizam técnicas que causam menos sofrimento"
Uma apoiadora do presidente Jair Bolsonaro (PL) divulgou um vídeo nas redes sociais onde aparece queimando o rosto de um bezerro com o ’22’ — número de urna do atual candidato à reeleição. O caso aconteceu no Tocantins.
A mulher que aparece nas imagens é Fernanda Paula Kajozi. O vídeo causou grande repercussão nas redes e provocou muitas críticas para Paula. Denunciada, ela justificou que fazia apenas uma ‘marcação de rotina’ relacionada ao ano corrente.
O Conselho Regional de Medicina Veterinária do Tocantins contesta a versão da mulher. “A marca está fora do padrão da Agência de Defesa Agropecuária”.
Ao som de ‘vota, vota e confirma, 22 é Bolsonaro’, o vídeo postado nas redes sociais mostra Fernanda marcando o bezerro com ferro quente enquanto o animal é imobilizado com um pé sobre seu focinho — também de maneira incorreta, segundo os órgãos oficiais.
De acordo com o Ministério da Agricultura, os animais são marcados para controle de rebanho, porém a ação adotada pela bolsonarista está totalmente fora do padrão. “As fêmeas vacinadas de 3 a 8 meses devem, obrigatoriamente, ser marcadas com ferro candente ou nitrogênio líquido, no lado esquerdo da face. Fêmeas vacinadas com a vacina B19 deverão ser marcadas apenas com o algarismo final do ano de vacinação. Fêmeas vacinadas com a amostra RB51 deverão ser marcadas com um V”, diz trecho do regulamento.
Ou seja, no caso de fêmeas vacinadas contra a brucelose, o que especialistas apontam ser o caso filmado, o padrão é usar a sigla ‘V’ ou o último algarismo do número do ano da vacinação, no caso ‘2’.
Fernanda apagou o vídeo das redes e gravou um novo para tentar justificar o caso. Ela confirmou apoio ao atual presidente da República. “Eu não marquei 22 na cara do bezerro por conta do Bolsonaro, não. É porque você marca na cara do bezerro o ano, na paleta você marca o mês e atrás, na anca do bezerro, você marca a marca da propriedade, no caso a do meu pai é F1. Então não tem nada a ver com Bolsonaro. Mas eu sou Bolsonaro”.
Especialistas falam em irregularidade e maus-tratos
“A marcação com número do ano [no caso 2], só no caso das fêmeas vacinadas. Nesse caso é no lado esquerdo da face. Esse lado das fêmeas bovinas é destinado para controle da vacinação de brucelose. É controle de serviço oficial”, disse o veterinário Eudes Vieira Castro, mestre em reprodução e sanidade animal.
O zootecnista e professor de etologia e bem-estar animal na Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da UNESP, Mateus Paranhos da Costa, também analisou o vídeo. Segundo ele, além de estar fora do padrão, a imobilização do animal não foi feita da forma correta.
“Essa marcação é totalmente anormal. Além do que a prática com o que ela foi feita pode caracterizar maus-tratos aos animais porque a moça que aplicou a marca está pisando na cabeça do bezerro. A contenção mal feita e a aplicação de uma marca que não é normal. Muito provavelmente foi com interesse político. A prática foi totalmente equivocada”, disse o especialista.
O especialista também explica que apesar da marcação a fogo no couro dos bovinos ser um procedimento antigo e tradicional, é desgastante para o bem-estar animal. Algumas fazendas pelo Brasil têm substituído a técnica.
“Esse tipo de procedimento hoje está sendo alterado. A ‘Redução da Marca a Fogo’ é um projeto que estamos liderando, já com várias fazendas aderindo ao projeto. Substituindo a marca a fogo por tatuagens, ou brincos eletrônicos ou visuais, que podem ser identificados pela cor”, disse Mateus Paranhos da Costa.
Ele conta que foi necessário pensar na mudança por causa do sofrimento dos animais. “Vale destacar que a face dos bovinos em geral é uma das áreas mais sensíveis do animal. A marca a fogo é uma queimadura de segundo ou terceiro grau e, quando colocada na face, que ai no caso foram duas marcas, gera dor aguda no momento da aplicação e depois no processo inflamatório”, explicou Mateus Paranhos.
O Conselho Regional de Medicina Veterinária do Tocantins informou que vai abrir uma investigação para adoção das medidas cabíveis. “Caso fique provado ilícito, a profissional poderá responder Processo Ético que será analisado e julgado em Plenária, podendo ser punida”, disse o órgão.
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