ELEIÇÕES 2022

Lula é o presidente eleito que recebeu mais votos na História; Bolsonaro é o 1º a não conseguir reeleição

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Na eleição de ontem, Lula bateu o recorde de presidente mais votado da história do Brasil: nunca ninguém havia alcançado a marca dos 60 milhões de votos. Bolsonaro, por sua vez, entrou para a história como o primeiro presidente brasileiro a fracassar em uma tentativa de reeleição, mesmo sendo também o primeiro autorizado a comprar votos "legalmente"

A vitória de Lula na eleição deste domingo (30/10) quebrou alguns recordes na história da democracia brasileira. É a primeira vez que um candidato à Presidência da República consegue alcançar a casa dos 60 milhões de votos. O recorde anterior foi em 2006 e também pertencia ao próprio Lula, ao derrotar o tucano Geraldo Alckmin com 58,3 milhões de votos.

Neste ano, o petista obteve 50,90% dos votos válidos. A diferença percentual a favor de Lula é a menor de um presidente eleito desde 1989. Até então, a eleição mais apertada do período havia sido a de 2014, entre Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB). A petista ganhou o segundo turno com 51,64% dos votos, contra 48,36% do tucano. A diferença foi de apenas 3,28 pontos percentuais.

Recorde de votos recebidos por presidentes eleitos:

2022: 60.345.999 de votos | Lula (PT)- 2° turno
2006: 58.295.042 de votos | Lula (PT)- 2° turno
2018: 57.797.847 de votos | Bolsonaro (PSL) – 2° turno
2010: 55.752.529 de votos | Dilma (PT) – 2° turno
2014: 54.501.118 de votos | Dilma (PT) – 2° turno
2002: 52.772.592 de votos | Lula (PT)- 2° turno
1998: 35.936.918 de votos | FHC (PSDB) – 1° turno
1989: 35.090.206 de votos | Collor (PRN) – 2° turno
1994: 34.314.961 de votos | FHC (PSDB) – 1° turno

Primeiro a não conseguir reeleição

Jair Bolsonaro (PL) entrou para a história como o primeiro presidente brasileiro a fracassar em uma tentativa de reeleição. Desde que a possibilidade de um segundo mandato consecutivo foi criada, há 25 anos, todos os três presidentes que se candidataram foram reeleitos.

Fernando Henrique Cardoso (PSDB) foi o primeiro, em 1998: matou a disputa em único turno, com 53,06% dos votos válidos, contra 31,71% do segundo colocado, Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Oito anos depois, em 2006, foi a vez do próprio Lula se reeleger, com 60,83% no segundo turno. Ele concorreu com Geraldo Alckmin (então no PSDB, hoje no PSB e, agora, eleito vice-presidente), que teve menos votos naquela votação do que no primeiro turno e terminou com 39,17%.

Passados mais oito anos, Dilma Rousseff (PT) enfrentou em 2014 uma eleição disputada contra Aécio Neves (PSDB), que ficou bem perto de virar, mas acabou com 48,36% contra 51,64% de sua adversária. Em 2018, o então presidente Michel Temer (MDB), altamente impopular, optou por não se candidatar, e Bolsonaro foi eleito pela primeira vez.

Bolsonaro chegou a prometer durante a campanha de 2018 a fazer uma reforma política e, entre outras medidas, acabar com a reeleição. Em entrevista recente à CNN, Bolsonaro explicou que não cumpriu a promessa para impedir “a volta da esquerda”.

“O que me fez mudar de ideia? O quadro oposto para disputar uma eleição minha. Não tínhamos um nome, um perfil parecido com o meu. Estaríamos entregando o Brasil para o PT, o PDT ou o PSB. Seria a volta da esquerda. Isso fez a decisão minha de tocar nesse assunto”, afirmou.

O presidente chegou perto de seu objetivo, mas não conseguiu os votos necessários para vencer, mesmo com as vantagens de um presidente no exercício na disputa pela reeleição.

Bolsonaro já não havia chegado à frente no primeiro turno, algo inédito desde a redemocratização, quando a eleição em dois turnos foi instituída, e não conseguiu reverter a desvantagem no segundo.

Bolsonaro usou a máquina pública de forma inédita

A derrota de Bolsonaro é incomum porque presidentes que tentam um novo mandato têm muitas coisas a seu favor. Presidentes controlam a máquina pública, ou seja, estão no governo e podem usar isso a seu favor para conseguir apoio político e popular.

O Executivo elabora e executa parte do orçamento e pode direcionar os recursos de acordo com seus interesses eleitorais, de forma legal, e tomar medidas que conquistem a simpatia dos eleitores.

O controle da máquina também facilita a costura de alianças no Congresso — que assumiu o controle de uma parte dos recursos distribuídos que antes eram geridos pelos ministérios com as chamadas emendas de relator, também conhecidas como Orçamento Secreto — e com lideranças locais de Estados e municípios, que depois farão campanha a seu favor.

“Houve um alinhamento muito forte entre Bolsonaro e a presidência do Congresso, o que permitiu o uso do orçamento a seu favor de uma forma muito capilar e que ficou no limite entre o legal e o ilegal, contornando as garantias estabelecidas em lei para que a eleição ocorra com um minimo de equilibro”, diz a cientista política Flávia Biroli, professora da Universidade de Brasília (UnB).

“O uso da máquina pública pelo governo Bolsonaro foi além de tudo que conhecíamos, dispondo de recursos públicos às vésperas da eleição de uma forma que só foi possível com uma emenda constitucional, e concedendo empréstimo consignado atrelado ao Auxílio Brasil de forma absolutamente irresponsável”, diz Biroli.

Com amplo apoio no Congresso Nacional, Bolsonaro foi autorizado a colocar em prática a chamada ‘PEC Kamikaze’. Além do consignado do Auxílio Brasil, o presidente aumentou o valor do Auxílio às vésperas da eleição, concedeu auxílios emergenciais para taxistas e caminhoneiros e congelou artificialmente o preço da gasolina.

O presidente Bolsonaro também recebeu mais de R$ 70 milhões em doações para gastar na campanha (Lula arrecadou apenas R$ 5 milhões) e contou com o esforço criminoso de empresários por todo o Brasil, que coagiram e ameaçaram funcionários para manipular seus votos. As igrejas evangélicas também cumpriram um papel muito agressivo na coação de votos pró-Bolsonaro.

Todas essas medidas acabaram revertendo um pouco, durante os últimos meses, a enorme impopularidade de Bolsonaro. Mas não o suficiente para impedir a sua derrota para Lula neste domingo.