Direita

Jovem Pan publica retratação após fake news sobre ‘Auxílio-Reclusão de Lula’

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'Auxílio-Reclusão' turbinado pelo governo Lula é a mais nova fake news da praça. Farsa ganhou tração nas redes sociais com a ajuda de bolsonaristas como Regina Duarte, Carlos Jordy e até da emissora Jovem Pan, uma concessão pública

Menos de três semanas após Jair Bolsonaro (PL) abandonar o país e deixar o governo federal, uma das fake news mais conhecidas da extrema-direita brasileira ganhou nova roupagem para atacar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT): a mentira de que o Auxílio-Reclusão teria sido reajustado para um valor superior ao salário mínimo.

A informação mentirosa, que circulou pelos canais tradicionais para esse tipo de conteúdo, como grupos de WhatsApp e Telegram, chegou à mídia comercial. Nesta terça-feira (17), a Jovem Pan News, veículo com fortes tendências à direita, publicou um pedido de desculpas e uma reparação por ter divulgado a mentira.

Após resumir como o auxílio funciona efetivamente (saiba detalhes abaixo), o âncora Tiago Pavinatto afirmou que “a confusão” divulgada pelo canal “é inadmissível”. Ele disse ainda que o redator responsável pelo texto tinha deixado a equipe de produção da emissora e toda a equipe tinha sido advertida “pela imprudência”.

O tema é como doce na boca de analistas, eleitores e líderes políticos de extrema-direita. Foi uma das bandeiras de campanha de Bolsonaro, então no PSL, quando foi eleito presidente em 2018. Já no poder, chegou a editar Medida Provisória limitando o benefício. O assunto, porém, sempre foi apresentado de forma distorcida – inclusive nesta nova investida, em que o assunto foi compartilhado por dezenas de parlamentares, em exercício ou recém-eleitos.

Com ajuda de bolsonaristas como Regina Duarte e Carlos Jordy, ganhou tração nas redes sociais, a notícia falsa de que o Auxílio-Reclusão teria passado a pagar R$ 1.754,18 por apenado – um valor acima do salário mínimo (hoje de R$ 1.302).

A fake news, que “culpava” Lula pela mudança inexistente, foi compartilhada em tom de alarde, inclusive por advogados.

A corrente levou a advogada Ariane Maria Blum, especialista em direito previdenciário, a gravar uma série de vídeos, em uma rede social, para esclarecer a confusão.

Ela disse ser triste ver colegas de profissão espalhando desinformação. “Sei que pouca gente se interessa por direito previdenciário, mas não custa pesquisar”, disse.

A especialista afirma que o tom das postagens, que chamam o direito de “Bolsa-Bandido”, dá a entender que “todo mundo quer ser preso” para ter acesso ao Auxílio-Reclusão, como se a pessoa apenada tivesse uma conta bancária dentro do presídio com cartão magnético para sacar dinheiro quando quiser.

“Muita gente acha que Auxílio-Reclusão é um benefício pago a pessoas em situação de cárcere, um auxílio mensal, e não é nada disso. É um benefício previdenciário, e não assistencial. Para ter acesso a ele é preciso preencher uma série de requisitos para a família receber o auxílio”, explica.

Entre esses requisitos estão a contribuição em dia para a Previdência Social e possuir uma média mensal de rendimentos familiares de até R$ 1.754,18 (daí a confusão) para que seus integrantes sejam considerados em situação de vulnerabilidade social e possam receber um valor de no máximo um salário mínimo ao mês durante o cumprimento da pena.

“Quem recebe esse salário mínimo é o dependente do segurado porque ele vai deixar de contribuir para a rotina da casa. A pessoa tem filhos, pais, irmãos, esposa ou marido e uma situação dessas vai fazer falta no orçamento familiar. Se ela contribui para a Previdência, esse valor fica disponível”, conclui.

Como sempre, fica difícil entender como uma fake do tipo, tão fácil de ser desmentida com uma simples busca, pode ser compartilhada por formadores de opinião e alcançar tanta gente.

Seria má-fé, ignorância ou as duas coisas?

O defensor público Clovis Bozza Neto, da defensoria pública do Rio Grande do Sul, afirma que o discurso reacionário tem duas “balas de prata” para tentar impor sua política: a pauta econômica (geralmente apresentada com terrorismo em relação à esquerda) e a segurança pública. Nesse contexto, há um território fértil para fake news sobre o sistema prisional.

“Qualquer assunto relacionado ao sistema prisional é usado como margem para indicar um suposto futuro caos na segurança. Eles etiquetam esses assuntos com terrorismo, como se a esquerda fosse uma promotora da violência social. É por essas razões que o tema volta sempre dessa forma”, lembra.

Para Bozza Neto, é preciso um “trabalho de formiguinha” com pessoas próximas, como familiares, amigos e colegas de trabalho, visando desconstruir essas mentiras. E é preciso ter consciência de que o processo é demorado. Notícias falsas sobre o Auxílio-Reclusão, por exemplo, circulam na internet há cerca de duas décadas, pelo menos.

O defensor lembra ainda que é preciso saber identificar os públicos com os quais se vai dialogar. Ele afirma que quem inicia o processo de divulgação de desinformação é pautado por uma “ética do mal”. Mas muitas pessoas que recebem, e eventualmente compartilham, podem estar dispostas a ouvir e assimilar as informações corretas.

“O Auxílio-Reclusão não é uma bolsa, não é uma assistência, é um contrato de seguro. As pessoas que têm direito ao auxílio contribuíram, pagando a Previdência Social. O primeiro ponto quando questionam o auxílio é que estão negando um contrato que a pessoa fez com o serviço público e está pagando, todos nós. Eu pago, outras pessoas pagam, então nem é uma relação meramente assistencial”, complementa.

Como funciona?

Ao contrário do discurso mentiroso propagado por políticos, “influenciadores” e pessoas comuns entusiastas da extrema-direita, o Auxílio-Reclusão não é pago diretamente a pessoas presas, e sim a dependentes de contribuintes da Previdência que tenham sido presos. Nesse caso, entram companheiro ou companheira, cônjuge, filhos menores de 21 anos ou com deficiências, pais, irmãos menores de 21 anos ou com deficiência. É o mesmo grupo que tem direito à pensão em caso de morte.

“O primeiro ponto é que todo mundo por exemplo pensa que o Auxílio-Reclusão é pago para pessoas que estão presas. Já começa a discussão sob uma premissa que não existe, porque ele é pago para os dependentes, que estão soltos. Isso é uma coisa que tem que ser esclarecida”, destaca Bozza Neto.

Para que os dependentes tenham direito ao benefício, a pessoa precisa ter contribuído com a Previdência nos 24 meses que antecederam à prisão e ser considerada de baixa renda, ou seja, ter recebido rendimentos mensais de até R$ 1.754,18. O valor máximo do auxílio é equivalente ao de um salário mínimo (atualmente R$ 1.302).

O pedido do auxílio é feito pelo sistema Meu INSS, e os beneficiários precisam apresentar documentos de identificação da pessoa segurada e de seus dependentes, como CPF e Declaração de Cárcere. O pagamento do benefício é interrompido a partir do momento que a pessoa deixa o sistema prisional.

Sistema carcerário

Com Yahoo e Brasil de Fato

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