Rogério Marinho tem o apoio político do bolsonarismo, do lavajatismo e a simpatia de parte significativa do chamado 'mercado'. Para essa parcela da Faria Lima, uma vitória do candidato de Bolsonaro seria importante para barrar as reformas estruturais pretendidas por Lula
Eduardo Maretti, RBA
Senado e Câmara dos Deputados elegem nesta quarta-feira (1°) os presidentes que comandarão as Casas nos próximos dois anos. A definição ocorrerá depois da posse dos parlamentares eleitos ou reeleitos em outubro – 513 deputados e 27 senadores (um terço do total de 81).
Na Câmara, a reeleição de Arthur Lira (PP-AL) está virtualmente assegurada, após negociação bem sucedida com o governo Lula e sua base. Já no Senado, setores da imprensa ainda levantam dúvidas sobre o favoritismo do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), ao aventar alguma chance para o bolsonarista Rogério Marinho (PL-RN).
Porém, o atual presidente da Casa deve ser reconduzido ao posto com margem segura, na opinião do consultor e analista político Antônio Augusto de Queiroz. Ex-integrante do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), Queiroz agora atua em empresas de consultoria em relações institucionais e análises de políticas públicas.
Para o analista, Rodrigo Pacheco deve ter pelo menos 45 votos, mesmo com algumas defecções em seu próprio partido e alguns votos de tucanos. O voto é secreto e, se não houver vencedor (com ao menos 41 votos) em uma primeira votação, a decisão vai para segundo turno. O presidente do Senado preside também o Congresso Nacional.
Para Queiroz, o candidato de Bolsonaro poderia até ser competitivo, mas perdeu essa condição depois dos ataques golpistas de 8 de janeiro. “Esses episódios o inviabilizaram”, avalia. Mesmo assim, as chances de Rogério Marinho vêm sendo alimentadas por setores da imprensa, que, na verdade, reverberam a simpatia pelo bolsonarista de parte significativa do chamado mercado. Como secretário especial de Previdência e Trabalho de Jair Bolsonaro, Rogério Marinho conduziu a “reforma” da Previdência. Como deputado, foi relator da “reforma” trabalhista na gestão Temer.
Bolsonarismo e lavajatismo
“O mercado tem uma boa vontade acentuada com Marinho, e por isso há uma ‘torcida’ forte por ele que, em certa medida, limitaria os movimentos de Lula no Congresso”, acrescenta Queiroz. Para essa parcela da Faria Lima – avenida da capital paulista onde está baseada a comunidade financeira nacional –, uma vitória do candidato de Bolsonaro seria importante para barrar as reformas estruturais pretendidas pelo atual presidente – muitas das quais contrariam os interesses dos rentistas. Até porque, na Câmara, Lira não deve, pelo menos a princípio, ser problema para Lula.
Marinho tem o apoio político do bolsonarismo e do lavajatismo, o que também explica uma simpatia que, na realidade, deveria ser injustificável. Na opinião de Queiroz, esse apoio ao senador do PL é um claro desejo de enquadrar o Supremo Tribunal Federal. Ao contrário, Pacheco – um constitucionalista e democrata – tem relações institucionais consolidadas com os Poderes e, em particular, com o Supremo.
Já os bolsonaristas sonham com a liberação geral para a disseminação de fake news e em contrapor o peso do Senado ao governo Lula. Ele também seria colocado como ameaça permanente sobre o STF, em especial o ministro Alexandre de Moraes. Isso porque o presidente da Casa pode, por exemplo, pautar um processo de impeachment contra um ministro do Supremo.
Pacheco é adversário declarado do golpismo e das fake news. Em setembro de 2021, ele devolveu a Bolsonaro medida provisória que alterava pontos do Marco Civil da Internet e, se fosse aprovada no Congresso, dificultaria o combate à desinformação e às fake news, que o bolsonarismo golpista chama de “liberdade de expressão”. Ele também rejeitou pedido de impeachment contra Moraes protocolado por Bolsonaro.
Em defesa das urnas
Apesar de seu estilo considerado fleumático, ou seja, excessivamente calmo ou lento, o atual presidente do Senado adotou posicionamentos firmes em defesa do processo eleitoral sempre atacado pelo então presidente. Ao abrir os trabalhos legislativos no segundo semestre de 2022, a poucos meses da eleição, declarou que “as eleições existem para assegurar a legitimidade do poder político, pois o resultado das urnas é a resposta legítima da vontade popular”. Defendeu que a legitimidade das urnas deveria “ser reconhecida assim que proclamado o resultado”.
Se Rodrigo Pacheco teve o apoio de Jair Bolsonaro para se tornar presidente do Senado, por outro lado foi o principal freio ao bolsonarismo no Congresso. “Como democrata que é, percebeu a tempo, pulou fora desse barco e passou a fazer o contraponto juntamente com o Supremo, para segurar o autoritarismo de Bolsonaro”, avalia Antônio Queiroz.
O PSD de Rodrigo Pacheco tem a maior bancada do Senado, com 15 parlamentares, após a adesão à legenda de Mara Gabrilli (SP) – que deixou o PSDB – e Eliziane Gama (MA), que segundo o Congresso em Foco está de saída do Cidadania. O senador Otto Alencar (PSD-BA) garante que o novo endereço de Eliziane é o PSD.
Dissidentes e tucanos com o bolsonarismo
Dois ou três votos do PSD, porém, são contabilizados como dissidentes que devem votar em Marinho, entre os quais Nelsinho Trad (MS). No domingo, Trad esteve em um almoço de apoiadores de Bolsonaro na casa do senador Izalci Lucas (PSDB-DF), em que esteve também o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ).
O tucano Izalci não se bandeou sozinho para o bolsonarismo no Senado. Alessandro Vieira (PSDB-SE), que na CPI da Covid se colocou como oposição ao então presidente, anunciou ontem que votará em Rogério Marinho amanhã. “Não tenho a menor pretensão de convencer ninguém, mas apontar o Marinho como representante dos golpistas que invadiram a sede dos Poderes me parece equivocado”, escreveu em suas redes sociais. Em sua campanha pelo cargo, Marinho vem dizendo que quer “resgatar a independência e o protagonismo do Senado”.
Na Câmara, acordo com Lula
Já na Câmara dos Deputados, na avaliação de Antônio Queiroz, não há no momento nada que indique uma relação conflituosa entre o presidente Lula e o virtualmente reeleito deputado Arthur Lira, de quem Bolsonaro foi refém.
“As relações de Lira com Bolsonaro e agora com Lula são completamente diferentes. Bolsonaro dependia muito de Lira, porque Lira podia abrir processo de impeachment e, nessas condições, tinha do presidente tudo o que queria, inclusive o orçamento secreto”, avalia Queiroz.
“Agora, há um acordo e Lula está sendo leal com Lira, não deixando inclusive o PT lançar candidato da base e fazendo com que a base vá junto (votando em Lira).” O próprio Lira tem motivo para estar mais tranquilo, já que não poderá ser reeleito outra vez em 2025, lembra o analista. O deputado federal Chico Alencar (Psol-RJ) também se candidata, mas é visto como um anticandidato e sem nenhuma chance. No Senado, outro “independente” é o também bolsonarista Eduardo Girão (Podemos-CE), que ainda deve retirar a candidatura.
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