Depoimentos de segurança, enfermeira e policial apresentam novos detalhes sobre o estupro e morte da aluna de jornalismo na UFPI durante calourada. Vítima foi encontrada com o agressor em sala do mestrado em matemática; Thiago Mayson tinha a chave do local. Delegado diz que a versão apresentada pelo estudante do mestrado é incompatível com as lesões de Janaina e com o laudo do IML
O depoimento de um segurança da Universidade Federal do Piauí (UFPI) encaixa novas peças para solucionar o quebra-cabeças do assassinato de Janaína Bezerra, 22, estudante de jornalismo da instituição de ensino superior. O único suspeito do crime é Thiago Mayson da Silva Barbosa, 28, aluno do mestrado em matemática.
A jovem morreu na madrugada de sexta-feira (27) para sábado (28) durante uma festa de calourada. Na manhã de sábado, às 9h40, o segurança da UFPI relatou que realizava vistoria no setor de matemática da instituição e avistou dois rapazes. Um deles, Thiago, estava com uma jovem nos braços.
O segurança abordou os rapazes e disse ter percebido que a jovem não tinha pulsação e que estava com as pupilas “viradas”. O segurança perguntou “essa moça está morta, o que houve?” e Thiago respondeu que a estudante havia bebido muito. O colega de Thiago, que não teve o nome revelado, repetia diversas vezes: “bebida mata”.
Em seguida, o segurança conta que notou um hematoma no rosto de Janaina. Thiago, então, teria dito que “achava” que ela tinha sofrido uma queda. Por fim, questionou sobre a mancha de sangue que notou na região da virilha da vítima. “O rapaz respondeu que a jovem estava menstruada”, disse.
O segurança destacou que Thiago aparentava estar muito nervoso e apreensivo. O colega de Thiago tentou pedir um Uber, alegando que era para levar a jovem ao hospital, mas foi impedido. Foi quando um responsável pelo curso foi chamado e, de acordo com o segurança, os direcionou para o Hospital Primavera.
O que dizem a enfermeira e o PM que efetuou a prisão
O depoimento dado pelo policial militar que efetuou a prisão de Thiago ajuda a entender o que teria acontecido em seguida, poucas horas depois. O agente afirma que ele e um outro colega militar estavam em ronda quando, por volta das 10h28 de sábado, foram chamados para dar apoio a uma ocorrência no Hospital Primavera. Eles haviam sido chamados pela equipe médica, que notou os sinais de violência no corpo de Janaina.
Ao chegar, ele narra que foi recebido por uma enfermeira, que descreveu a forma como Janaina chegou à unidade. “Já chegou sem vida e com suspeita de violência”, teria dito a mulher. “Havia sangue nas vestes e nas partes intimas, e na vagina da jovem havia uma lesão”.
“Possivelmente a vítima teria sido agredida, pois apresentava lesões no rosto e nos olhos; estava vestida com uma roupa masculina, sendo uma bermuda e uma camisa por cima da sua; a blusa da vítima estava rasgada”.
Em seguida, o PM ainda recebeu da equipe do hospital o celular cor-de-rosa da vítima, que estava sujo de sangue, e foi apreendido. Foi neste momento que foi informado pelos médicos sobre onde estava Thiago, que foi ouvido e preso em flagrante.
O que diz a investigação da Polícia Civil
De acordo com o delegado Francisco Costa, a jovem foi violentada em uma sala do Programa de Pós-Graduação em Matemática, no Centro de Ciências da Natureza (CCN) da UFPI. Acontecia uma festa em um espaço próximo no momento.
Na sala, foram encontrados uma mesa e um colchão com vestígios de sangue. Os materiais foram apreendidos. Segundo o delegado, embora Thiago tenha sido visto com um colega, as investigações apontam que a jovem foi violentada e morta por apenas uma pessoa.
Ainda segundo o delegado, um laudo preliminar do Instituto de Medicina Legal de Teresina (IML) confirmou violência sexual contra a jovem.
O IML emitiu uma declaração de óbito em que aponta que a causa da morte de Janaína foi trauma raquimedular por ação contundente, uma contusão na coluna vertebral a nível cervical, que provocou lesão da medula espinhal e morte. Ou, seja, teve o pescoço quebrado.
O órgão reforçou que a ação contundente pode ter sido causada “por pancada, torcendo a coluna vertebral ou traumatizando, ação das mãos no pescoço com intuito de matar ou fazer asfixia, queda, luta, dentre outras possibilidades que estão sendo analisadas junto às investigações do caso”.
O que diz Thiago
Thiago relatou à Polícia Civil que participava de uma calourada na UFPI quando, por volta de 2h da manhã de sábado (28), encontrou Janaína. Segundo ele, os dois já haviam “ficado” e “transado” antes — fato que é negado por uma amiga de Janaina.
Após conversar com ela, Thiago disse que os dois “ficaram” próximo a um dos corredores do setor de matemática da instituição e, depois, resolveram seguir para uma sala de estudos. Ele disse ter a chave da sala, pois, “esporadicamente” madrugava no lugar.
Thiago afirmou que a jovem aceitou o convite e os dois mantiveram relação sexual consentida. Na primeira vez, Janaína dormiu e acordou uma hora depois. Thiago aproveitou e também cochilou. Quando acordou, ouviu o telefone de Janaína tocando.
Segundo ele, a vítima atendeu o telefone e falou brevemente com uma amiga – que é uma das testemunhas-chave do caso. Durante outro ato sexual, Thiago disse ter sentido que a estudante desmaiou e que acredita que nessa hora ela tenha batido a cabeça no chão. Ele achou que Janaína tivesse dormido e deitou ao lado dela. Thiago acordou e afirmou que Janaína estava suja de sangue em suas partes íntimas e que seu corpo estava frio.
Thiago alegou que um amigo lhe enviou mensagem perguntando onde estava. O estudante disse que relatou o que aconteceu e o amigo sugeriu que Janaína fosse levada para o hospital. O amigo de Thiago teria ido até a sala. Logo que saiu do local com Janaína nos braços, Thiago e o amigo se depararam com os seguranças da UFPI.
A estudante foi levada para o Hospital do bairro Primavera. A equipe médica teria feito massagem cardíaca, mas Janaína já estava morta.
Thiago está preso preventivamente pelos crimes de estupro e feminicídio. A UFPI divulgou comunicados oficiais sobre o caso, onde afirma que não havia autorização para a festa acontecer no campus e que, já na manhã de sábado, o reitor determinou a imediata instauração de processo administrativo para apuração dos fatos, bem como a responsabilização dos envolvidos e que disponibilizará todo o apoio que possa auxiliar no trabalho das autoridades policiais.
Origem humilde
De origem humilde, Janaína era filha de um mecânico e foi a primeira da família a conseguir entrar numa universidade. A jovem chegou a vender bolos de pote para comprar um computador para seus estudos.
“Eu me senti muito mal, fui pro hospital, pensava que minha filha tinha desmaiado, sofrido um acidente. Quando cheguei, ela já estava morta. Estava bem machucada, cheia de hematomas. Ainda estou abalado. Quero justiça!”, desabafou o pai da vítima.
Janaína fazia jornalismo pois tinha o sonho de trabalhar na televisão. Nas redes sociais, a última publicação da jovem foi uma matéria de sua autoria sobre literatura negra.
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