O que aconteceu com golpistas de 8 de janeiro e quais crimes devem responder
Em todas as instâncias, há a preocupação de definir a atuação dos investigados em quatro frentes: a participação "in loco" das invasões e responsabilidade por atos de vandalismos, o financiamento dos golpistas, a omissão de agentes públicos que deveriam zelar pela segurança pública e o incentivo aos manifestantes por meio das redes sociais
Fernanda Alves, Extra
Um mês após apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro invadirem e depredarem os prédios do Congresso, do Supremo Tribunal Federal (STF) e o Palácio do Planalto, mais de 1.400 pessoas foram presas por conta da participação nos atos de terrorismo. Desse total, após audiências de custódia, o STF converteu 942 detenções em prisões preventivas e outras 20 pessoas foram alvos de mandados de prisão na Operação Lesa Pátria. A Procuradoria-Geral da República também já denunciou 653 suspeitos de participação nos atos golpistas e investiga o possível envolvimento do ex-presidente Jair Boslonaro.
Em todos os órgãos, há a preocupação de definir a atuação dos investigados em quatro frentes: a participação “in loco” das invasões e responsabilidade por atos de vandalismos, o financiamento dos golpistas, a omissão de agentes públicos que deveriam zelar pela segurança pública e o incentivo aos manifestantes por meio das redes sociais.
É neste último grupo que se enquadram os deputados federais eleitos André Fernandes (PL-CE), Silvia Waiãpi (PL-AP) e Clarissa Tércio (PP-PE), também alvos da PGR. O órgão pediu a abertura de um inquérito para apurar a atuação do trio, por suspeita de incitar os atos golpistas na Praça dos Três Poderes pelas redes sociais.
Entre os presos, também há nomes de autoridades, como o do ex-ministro da Justiça Anderson Torres, que no dia dos ataques estava à frente da Secretaria de Segurança do Distrito Federal. Ele estava de férias com a família nos EUA no momento do ato e foi exonerado do cargo logo após os ataques em Brasília. No pedido de prisão emitido pelo ministro do STF Alexandre de Moraes, o magistrado argumentou que o conjunto de crimes praticados durante a invasão dos prédios do Palácio do Planalto, do STF e do Congresso Nacional só poderiam ocorrer “com a anuência, e até participação efetiva, das autoridades competentes pela segurança pública e inteligência, uma vez que a organização das supostas manifestações era fato notório e sabido, que foi divulgado pela mídia brasileira”.
Há ainda outros personagens envolvidos nos ataques que se destacam seja pela inconsequência de seus atos, como os casos dos manifestantes que destruíram itens do patrimônio histórico do país, ou pela certeza da impunidade com transmissões ao vivo e a gravações de vídeo nas redes sociais durantes o ataque.
Confira os principais nomes:
↗ Fátima de Tubarão
A idosa Maria de Fátima Mendonça Jacinto Souza, conhecida como “Fátima de Tubarão”, foi presa em Santa Catarina, no dia 27 de janeiro, na terceira fase da operação Lesa Pátria. Em vídeo que viralizou nas redes sociais, a idosa de 67 anos ameaça o ministro do STF Alexandre de Moraes.
“Vamos para a guerra, é guerra agora. Vamos pegar o Xandão agora”, afirmou a idosa.
Antes de participar dos atos golpistas em Brasília, Maria de Fátima foi condenada por tráfico de drogas. Em 2014, ela se tornou alvo de um processo que corre em sigilo no Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Além de tráfico, ela também responde pelos crimes de estelionato e falsificação de documento público.
↗ Léo índio
O sobrinho do ex-presidente Bolsonaro participou e fez transmissões ao vivo em suas redes dos atos golpistas em Brasilia, no dia 8 de janeiro. Ele não chegou a ser preso pela atuação nas manifestações, mas foi alvo de um mandato de busca e apreensão no dia 27 de janeiro.
Após a ação, o primo de Eduardo, Flávio e Carlos Bolsonaro solicitou gratuidade de Justiça ao Supremo Tribunal Federal (STF) e anexou uma declaração de hipossuficiência ao processo. Na ação da Corte, ele é acusado pelos crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e de Golpe de Estado.
“Não tenho condições de arcar com as despesas decorrentes do presente processo e honorários advocatícios sucumbenciais, sem prejuízo do meu próprio sustento e da minha família, necessitando, assim, da gratuidade de justiça a qual há de abranger a todos os atos do processo”, diz Léo índio em trecho do documento que será analisado pelo relator, o ministro Dias Toffoli.
Sem ensino superior, Léo índio informou à Corte que sua ocupação atual é de vendedor. No passado, ele chegou a ser assessor do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) e ocupou cargos de confiança nos gabinetes do senador Chico Rodrigues (União Brasil-RR) e da liderança do PL no Senado Federal, pelo qual recebia um salário de R$ 5,7 mil. Em julho passado, ele foi exonerado, e se candidatou a deputado distrital no Distrito Federal, mas não conseguiu se eleger.
↗ Pâmela Bório
A ex-primeira-dama da Paraíba, Pâmela Bório, após participar dos atos golpistas, se tonou alvo de uma ação judicial por parte do ex-marido, o ex-governador Ricardo Coutinho (PT). O movimento se justifica pelo fato de Bório ter levado o filho do ex-casal, de 12 anos, para as manifestações que culminaram na depredação das sedes dos Três Poderes. Com isso, Coutinho pede a guarda da criança.
A ex-primeira-dama compartilhou fotos e vídeos dentro da área do Congresso Nacional ao lado de outros apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Após a repercussão dos atos, ela tentou justificar sua presença como parte de uma “cobertura jornalística”, já que é formada em jornalismo pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB).
“A trajetória de ativismo da jornalista Pâmela Bório por mais de uma década mostra que jamais apoiaria atos terroristas e vandalismo, algo que sempre repudiou publicamente. Bem como jamais poderia ser condescendente com tais atitudes vindas de quaisquer grupos ideológicos”, afirmou em nota, alegando também que o filho não estava com ela no momento dos atos. Após os atos, ela também desativou seu perfil nas redes sociais.
↗ Antônio Cláudio Alves Ferreira
O mecânico Antônio Cláudio Alves Ferreira, de 30 anos, flagrado por câmeras de segurança jogando no chão o relógio de Dom João VI durante a invasão golpista foi preso no dia 23 de janeiro, em Uberlândia, em Minas Gerais.
Após os atos terroristas, ele deixou às pressas a casa que alugava em Catalão, no Distrito Federal, deixando para trás uma série de elementos que ajudam a traçar seu perfil. No interior da residência foram encontrados uma Bíblia, um boné com o nome de Jair Bolsonaro e uma faca do tipo tático militar.
Ferreira foi flagrado pelas câmeras de segurança do Palácio do Planalto destruindo um relógio do século XVIII que veio para o Brasil com a família real portuguesa. A peça foi fabricada pelo relojoeiro francês Balthazar Martinot – há uma assinatura dele gravada na máquina – com design de André-Charles Boulle. Ambos atendiam a corte de Luís XIV, na França, apelidado de “o Grande” e “Rei Sol”. A peça teria sido fabricada no fim do século XVIII e vindo para o Brasil com D. João VI, em 1808.
↗ José Ruy
O vereador de Inhumas, Goiás, José Ruy (PTC), que apareceu em um vídeo nas redes sociais caminhando e acenando para a câmera enquanto estava na área interna da Praça dos Três Poderes, está sendo investigado por quebra de decoro parlamentar após ter sido alvo de um pedido da Defensoria Pública (DPE-GO).
↗ Adriano Castro
O ex-BBB, depois de participar dos atos golpistas, gravou um vídeo em seu canal no Youtube onde afirmou ter saído do Brasil por ser sentir inseguro.
“Estou fazendo esse vídeo para tranquilizar o coração de vocês, porque sei que vocês estão muito preocupados sobre o meu paradeiro. Vamos lá: não estou no Brasil, estou bem longe, estou em segurança. E agora que me sinto seguro, eu posso fazer esse vídeo, antes não dava. Saibam que eu estou bem. O canal não está com o vídeo, assim que o YouTube liberar, voltaremos com a nossas lives, sim. Se acharam que iam me calar, não conseguiram e não vou conseguir. A gente se vê em breve. Espalhem aí que estou bem. E assim que o Youtube liberar, a gente volta”, falou.
Adriano, de 54 anos, foi considerado o vilão da primeira temporada do “BBB”, que foi ao ar na TV Globo em 2002. À época, ele inventou o termo “paredão”, em referência ao local onde regimes ditatoriais mandavam fuzilar seus inimigos, para batizar as eliminações no programa. Após a publicação do vídeo em seu canal, não houve mais notícias sobre seu paradeiro.
↗ Gilbet Klier
O tenista brasileiro Gilbet Klier, de 22 anos, que esteve nos atos terroristas no Distrito Federal e postou uma foto em suas redes sociais no momento da invasão, continua afastado das quadras. Ele foi suspenso por 12 meses por conta do uso de doping pela Agência Internacional de Integridade no Tênis (ITIA).
Durante os atos, o atleta estava acompanhado da namorada, Vitoria Gonçalves. Com a repercussão negativa do caso, Klier apagou o registro e se retratou publicamente, afirmando que não compactua com as ações de bolsonaristas radicais.
“Lamentavelmente fiz um registro de um ato que não compactuo. Peço desculpas àqueles que me interpretaram de forma a apoiar algo lamentável. Eu não imaginava os desdobramentos do que se passaria ali. Tão logo tomei conhecimento que se tratava de ato criminoso de depredação de prédios públicos e tentativa golpista contra a democracia brasileira, fiz questão de retirar as imagens do meu perfil”, escreveu o atleta em suas redes sociais.
↗ Ana Priscila Azevedo
Apontada como uma das líderes dos ataques na Praça dos Três Poderes, Ana Priscila Azevedo foi presa em Luziânia (GO), três dias após os atos terroristas. Após sua detenção, apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) passaram a classificá-la como “infiltrada”, “militante de esquerda” e “petista”.
Líder de um grupo no Telegram com milhares de membros, Ana Priscila Azevedo compartilhou registros nos ataques em Brasília. Em um dos vídeos ela aparece dentro do STF e no Congresso, com o patrimônio dos prédios públicos depredado.
Ela coletava contribuições financeiras entre pares extremistas desde 6 de outubro, pelo menos. A bolsonarista publicava vídeos falando em “resistência”, “intervenção militar urgente”, “fraude eleitoral” e “desobediência civil”. E junto das postagens disponibilizava uma chave PIX para pedir dinheiro que seria usado para financiar suas ações.
↗ Willian da Silva Lima
Willian da Silva Lima, de 25 anos, que ficou conhecido como o “golpista togado” após aparecer nas imagens das câmeras de segurança do prédio do STF circulando pelos corredores usando a toga de um dos ministros do Supremo, continua preso. Ele inclusive usava a vestimenta no momento que foi detido em flagrante, no dia 8 de janeiro, dentro do prédio do tribunal.
Morador de Campinas, ele é funcionário de uma empresa de temperos que pertence à sua família, e disse, em depoimento prestado à Polícia Federal, que entrou no prédio do STF “por curiosidade”, tendo ficado no local por “dez minutos”. Relatou ainda que, como havia muita fumaça no térreo da Corte, tentou sair do lugar por uma rota alternativa, mas acabou sendo detido.
A versão apresentada aos investigadores não explica como, ao longo dos dez minutos que teria ficado no Supremo, Willian teria conseguido obter uma das vestimentas oficiais usadas pelos magistrados. Após a destruição das peças, a Corte precisou fazer uma compra emergencial de onze novas togas ao custo de R$ 17 mil.
↗ Karol Eller
Flávia Caroline Andrade Eller, conhecida como Karol Eller, foi exonerada do cargo que ocupava na Empresa Brasil de Comunicação (EBC) após participar dos atos terroristas. Ela, que é amiga do filho 04 do ex-presidente, Jair Renan, e já apareceu em cliques ao lado do rapaz em postagens no Palácio do Alvorada e em carros oficiais da Presidência, também tinha um canal de youtube onde publicava vídeos em apoio ao ex-presidente.
Karol Eller foi nomeada pela Diretoria de Jornalismo no final de 2019 em um cargo de confiança pelo qual recebia um salário de R$ 10.700. No Instagram, ela fez transmissões ao vivo, enquanto participava da invasão ao Congresso Nacional ao lado de outros bolsonaristas.
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