Violência

O que já se sabe sobre o assassinato do fotógrafo Felipe ‘Terremoto’, do Jornalistas Livres

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Testemunha do crime diz que fotógrafo foi assassinado de maneira covarde, pelas costas, enquanto o agressor alega que agiu em legítima defesa. Delegado responsável pelo caso afirma que a briga que levou à morte de Terremoto ocorreu por motivo banal

Felipe Terremoto

O assassinato do fotógrafo Felipe Ary de Souza ‘Terremoto’, de 25 anos, está sendo investigado pela Polícia Civil de São Paulo. A morte aconteceu dentro do apartamento do artista plástico Vinicius Eduardo Santos Saavedra, de 23 anos, autor do crime. Terremoto trabalhava no coletivo ‘Jornalistas Livres’.

Vinícius estava preso, mas foi liberado após prestar depoimento e alegar ter agido em legítima defesa. Uma testemunha do crime contesta a versão do agressor e diz que ‘Terremoto’ foi atacado covardemente.

O delegado Alexandre Dias diz que a briga que levou à morte do fotógrafo ocorreu por motivo banal. Além dos dois homens, estavam no apartamento a namorada de Vinicius e uma quarta pessoa, que prestou depoimento nesta segunda (13).

O que diz o autor do crime

Após a morte do fotógrafo, o autor do crime divulgou o seguinte áudio nas redes sociais: “Minha mulher começou a conversar com o Terremoto. Ela perguntou para o Terremoto se ele ficaria comigo, desde que ela não tivesse como ficar sabendo. O Terremoto respondeu que sim. Eu abordei o Terremoto sobre isso, perguntei para ele [se] também ficaria com ela, desde que eu não tivesse como ficar sabendo. Ele falou que ficaria, sim”.

A resposta teria incomodado Vinicius. “Eu fui para cima dele dentro de casa. Eu fui na porrada. Só que o Terremoto, por ser mais forte, mais gordão, conseguiu levar a melhor, ele conseguiu me derrubar no chão, ele conseguiu me enforcar. Só que no meio da confusão tinha uma faca que caiu no chão. Eu furei ele com a faca e ele me soltou. Ele pegou uma faca e me furou também”, relatou.

Vinícius fez relato semelhante na delegacia. Disse ainda que, ao fim da briga, trancou o apartamento com a vítima dentro e foi buscar ajuda. O dono do imóvel afirmou ter pedido para que o porteiro acionasse socorro para Terremoto.

De acordo com o delegado, Vinícius possui uma lesão típica de defesa na mão, uma mordida na orelha e dois ferimentos na região torácica, feitos com arma branca.

O que diz a testemunha

De acordo com a testemunha, Vinicius e a namorada tinham consumido clonazepam, um ansiolítico controlado, e bebidas alcoólicas. Em razão disso, o dono do apartamento teria tido pequenos surtos, com comportamento agressivo e paranoico, e dizia que alguém queria matá-lo.

Na versão da testemunha para a conversa que iniciou a briga, Terremoto respondeu que não era “talarico” — gíria para pessoa que se relaciona com outra já comprometida —, mas Vinícius rebateu, duvidando. Na discussão, Vinícius deu um soco no rosto da vítima, que revidou, o derrubou no chão e o imobilizou.

Ao sentir que algo grave poderia acontecer, a testemunha tentava sair do apartamento quando viu Vinícius pegar uma faca e ir em direção a Terremoto, que estava de costas. A testemunha contou que deixou o local às pressas e pediu para o porteiro acionar a polícia.

“O relato da testemunha ouvida na data de hoje revela que o rapaz que tirou a vida do Felipe [Souza] não agiu em legítima defesa, pois partiram dele todas as iniciativas de agressão física. Felipe foi atingido pelas costas de maneira covarde, tentou se defender e não conseguiu, perdeu a vida por um motivo fútil”, disse a advogada Maira Pinheiro, que representa a família de Terremoto.

Depoimento do porteiro pode ajudar a solucionar caso

O porteiro do prédio onde ocorreu o crime será ouvido nesta semana. Foi ele quem acionou a Polícia Militar logo depois que Vinicius e a namorada, a inglesa Ivy Scarlet, deixaram o local, no Centro de São Paulo.

A namorada de Vinicius, Ivy Scarlet, foi ouvida duas vezes pelos investigadores. Horas depois do crime, ela relatou que consumiu bebidas alcoólicas e drogas na companhia do namorado e de “outros dois homens, desconhecidos”. Contou que Vinicius “ficou nervoso com o indivíduo desconhecido (Felipe)” e, “quando se deu por conta, ambos estavam munidos de faca” — ela disse que não era capaz de indicar quem havia atacado primeiro e quem se defendia.

Em um áudio divulgado nas redes sociais, Ivy contradiz a si mesma ao tratar ‘Terremoto’ como um ‘amigo querido’, e não como um ‘desconhecido’. Ivy e Vinícius também não conseguiram esclarecer por que saíram e trancaram o apartamento com a vítima dentro, esfaqueada.

De acordo com o delegado, a polícia aguardará o recebimento de laudos periciais e o acesso a mais imagens de câmeras de segurança para concluir a investigação ‘o quanto antes’. “Estou aguardando os laudos e a conclusão de outras diligências para que eu possa alinhar os depoimentos e ter o entendimento completo da cena e fazer uma análise final”, afirmou.

O autor do homicídio responderá ao inquérito em liberdade, mas a polícia não descarta voltar a chamá-lo para prestar um novo depoimento ou até mesmo pedir sua prisão preventiva à Justiça, a depender do andamento das investigações. Pessoas ligadas à família do fotógrafo assassinado planejam acionar o Ministério Público para que a promotoria também acompanhe o caso.

Homenagem dos Jornalistas Livres

O coletivo Jornalistas Livres divulgou um texto em homenagem ao fotógrafo. “Idealista, compassivo, gentil, amoroso, engraçado e incapaz de desistir de uma pauta, Terremoto personificou a vivacidade da juventude que ocupou as escolas públicas de todo país em 2016 […]”.

“Era impossível desgostar do Terremoto. Sorriso tranquilo, cabeça a mil, coração batendo. Quando chegava, era um acontecimento. Seus pensamentos superavam a velocidade das palavras. Mas mais que tudo, ouvia. Sempre. Tinha a sabedoria jovem de ouvir. Como poucos”.

“A favela, os Jornalistas Livres e os movimentos de moradia choram. Terremoto, em sua brusca e breve passagem, é tragédia que jamais deverá ficar silenciada”.