Jovem de 18 anos morre em Santa Catarina após ser infectada pelo mesmo microrganismo que causou a morte do neto do presidente Lula em 2019. "Acne no rosto foi porta de entrada", diz mãe da vítima. Cientistas alertam que a proliferação de superbactérias resistentes a antibióticos coloca em risco a saúde de humanos e de animais em todo o mundo
A estudante Dâmilly Beatriz, de 18 anos, morreu na última segunda-feira (12) em Blumenau (SC) após complicações causadas por uma superbactéria. O microrganismo ‘Staphylococcus Aureus’ é o mesmo que matou o neto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em 2019.
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De acordo com a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), a superbactéria pode ser encontrada na pele e em outras partes do organismo humano, e é um dos agentes causadores das doenças mais graves no contexto da pediatria.
Daniela Veiga, mãe de Dâmilly, publicou um relato nas redes sociais para explicar o que aconteceu com a filha. “A minha filha foi atingida por uma bactéria extremamente agressiva e de difícil reversão (Staphylococcus aureus MRSA). O ponto de entrada da bactéria foi uma acne que ela tinha no rosto. Essa bactéria gerou uma infecção generalizada e ocasionou falência múltipla dos órgãos”, disse.
Segundo a mãe da jovem, a estudante procurou atendimento médico no primeiro fim de semana de junho, por causa de dor no pescoço. Na ocasião, recebeu medicação e foi liberada. No sábado (10), as dores continuavam iguais. No dia seguinte, domingo (11), um dia antes de Dâmilly perder a vida, a jovem acordou com o rosto bastante inchado. Foi quando voltou ao hospital e se avaliou a necessidade de uma vaga em Unidade de terapia Intensiva (UTI)
Na publicação, a mãe de Daniela agradece à equipe do hospital. “Os profissionais não mediram esforços na tentativa de reversão do quadro. Com muita agilidade desde a chegada ao hospital no domingo rapidamente direcionando para a UTI, até o momento do seu óbito, na segunda”, afirmou.
Dâmilly era filha única e cursava uma graduação de biomedicina na Universidade Regional de Blumenau (Furb).
Staphylococcus Aureus
De acordo com Jorge Sampaio, médico patologista clínico, responsável pela microbiologia do Laboratório Fleury, cerca de 30% da população saudável abriga a bactéria Staphylococcus aureus. Essa bactéria pode estar presente no nariz, na axila ena região da virilha, entre outros locais do corpo.
“Normalmente a bactéria Staphylococcus aureus só causa doença quando tem alguma porta de entrada no organismo como uma lesão cutânea ou o sistema imunológico deficiente. O exemplo mais comum de proliferação da bactéria é a furunculose”, explica Sampaio.
“Não adianta ficar apavorado porque a bactéria é amplamente disseminada na população e não temos uma vacina específica para contê-la. A melhor maneira de evitar a contaminação é manter os procedimentos básicos de higiene, como lavar as mãos “, orienta Sampaio.
As infecções agudas causadas pela bactéria podem se disseminar no organismo causando episódios mais graves, como pneumonia, endocardite, pericardite e meningite.
Resistência aos antibióticos e fim da espécie humana
As bactérias se multiplicam a cada 20 minutos e às vezes sofrem mutações que são, por acaso, um escudo contra algum antibiótico. E o mais inquietante é que podem transmitir esses novos genes de resistência a outras bactérias próximas, inclusive de outras famílias.
“É como se eu aprender alemão e transmitir essa capacidade a você”, explica González Zorn, catedrático da Faculdade de Veterinária da Universidade Complutense de Madri. Quantos mais antibióticos são usados, mais as bactérias evoluem para resistir a eles.
González Zorn afirma que se formou “uma tempestade perfeita” e mostra os dados dos hospitais espanhóis durante a covid-19. Em 2020, cresceu em 400% o uso de azitromicina, um antibiótico que foi muito receitado, de forma desesperada, para a eventualidade de que funcionasse contra o vírus SARS-CoV-2. O consumo de doxiciclina aumentou 517%.
“Durante a pandemia foram utilizadas tantas carbapenemas [um tipo de antibióticos] que em alguns países, como o Chile, temos os níveis de resistência que esperávamos ter em 2030. Aceleramos 10 anos. Estamos muito alarmados”, afirma o pesquisador.
O microbiologista é um dos 15 membros de um grupo internacional de cientistas recém-criado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para identificar quais antibióticos são essenciais para a saúde humana, com o objetivo de blindar seu uso para que continuem funcionando. Estes fármacos são uma espécie de tropa de elite dos medicamentos. Se forem necessários e não derem conta, depois deles não há nada. São o último recurso. E as carbapenemas são justamente uma destas últimas balas.
O microbiologista clínico Rafael Cantón recorda de quando começou a trabalhar, em 1988, e fazia testes de laboratório para determinar a suscetibilidade de uma bactéria a diferentes antibióticos.
“Antes o habitual era ver tudo S, a letra inicial de sensível. Agora a maioria dos valores é R, de resistente. Costumamos estudar 20 antibióticos [para cada infecção], e 15 vezes por ano nos deparamos com uma situação dramática: tudo R. Não temos opções terapêuticas para estes casos”, lamenta Cantón, chefe de Microbiologia do Hospital Ramón y Cajal, em Madri.
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