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Ex-reitor da UFSC, Luiz Carlos Cancellier é inocentado 6 anos após cometer suicídio

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“Ele se suicidou, mas foi um assassinato [...] Um dos maiores escândalos judiciários e policiais da história do Brasil”. Tribunal de Contas da União comprova inocência de Luiz Carlos Cancellier, seis anos após ele tirar a própria vida. Delegada que prendeu ex-reitor da UFSC é acusada de falsificar depoimento. Em última carta antes de morrer, Cancellier se disse “perplexo” e “amedrontado”

Luiz Carlos Cancellier, reitor da UFSC, morreu em 2017 (Foto: Henrique Almeida/Divulgação)

via RBA

O jurista Lenio Streck, professor de Direito Constitucional, cobrou nesta segunda-feira (10), durante sua participação no ICL Notícias, a imediata reabertura do caso do ex-reitor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Luiz Carlos Cancellier.

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Alvo da operação Ouvidos Moucos, em 2017, que contou com o mesmo modus operandi da Lava Jato, Cancellier foi preso preventivamente, acusado de desvio de dinheiro público. Na última quinta-feira (6), o Tribunal de Contas da União (TCU) descartou qualquer irregularidade cometida no episódio pelo ex-reitor e comprovou sua inocência.

Na época, porém, 18 dias após sua prisão, Cancellier cometeu suicídio em consequência da situação de injustiça que viveu. Preso por 36 horas e impedido de retornar à universidade, o então reitor se atirou do último andar de um shopping center em Florianópolis. No bolso, ele carregava um bilhete dizendo que sua morte tinha sido decretada quando foi afastado da UFSC.

VEJA TAMBÉM: A última carta do reitor da UFSC encontrado morto

Para Lenio Streck, o Estado tem obrigação de realizar uma prestação de contas do caso e punir os responsáveis. A Operação Ouvidos Moucos foi chefiada pela delegada Erika Marena, e a prisão de Cancellier foi autorizada pela juíza Janaina Cassol. A alegação era investigar supostas irregularidades em ofertas de educação à distância no programa Universidade Aberta do Brasil (UAB). O ex-reitor da UFSC e outros seis professores foram acusados de roubar R$ 80 milhões.

Prestação de contas

Poucos dias depois, as inconsistências das investigações começaram a aparecer. Até que, em 2021, cópia dos diálogos entre procuradores da Lava Jato apreendidos pela Operação Spoofing mostraram indícios de que a delegada do caso teria forjado um depoimento falso no processo. Agora, o TCU também confirma que o suposto desvio não aconteceu. A tentativa de criminalizar o ex-reitor, sem o devido processo legal e sem provas, indicam que seu suicídio, na verdade, foi um assassinato, conforme destaca o jurista. “Mataram o Cancellier”.

“Um dos maiores escândalos judiciários e policiais da história do Brasil”, classifica Lenio, representa um “fracasso institucional com tintas de crueldade. E com a frase ‘nós também prendemos professores’. Isso dá um tipo de teatro das tragédias gregas, em que o herói é vitimado no final”, contesta. “Tem que reabrir urgentemente esse caso criminal e fazer uma prestação de contas à sociedade, é isso que está se esperando. É muito mais do que uma indenização, é uma questão do castigo e repressão no sentido de que o Estado e o direito têm que dizer como prevenção geral e retribuição, que isso não pode ser assim. E isso só se faz com a punição dos envolvidos”, exigiu o jurista e professor.

Neste final de semana, o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, anunciou que adotará “as providências cabíveis em face dos possíveis abusos e irregularidades na conduta de agentes públicos federais” no caso do reitor.

ÚLTIMA CARTA

Confira a íntegra da carta escrita pelo ex-reitor poucos dias antes de sua morte:

“A humilhação e o vexame a que fomos submetidos — eu e outros colegas da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) — há uma semana não tem precedentes na história da instituição. No mesmo período em que fomos presos, levados ao complexo penitenciário, despidos de nossas vestes e encarcerados, paradoxalmente a universidade que comando desde maio de 2016 foi reconhecida como a sexta melhor instituição federal de ensino superior brasileira; avaliada com vários cursos de excelência em pós-graduação pela Capes e homenageada pela Assembleia Legislativa de Santa Catarina. Nos últimos dias tivemos nossas vidas devassadas e nossa honra associada a uma “quadrilha”, acusada de desviar R$ 80 milhões. E impedidos, mesmo após libertados, de entrar na universidade.

Quando assumimos, em maio de 2016, para mandato de quatro anos, uma de nossas mensagens mais marcantes sempre foi a da harmonia, do diálogo, do reconhecimento das diferenças. Dizíamos a quem quisesse ouvir que, “na UFSC, tem diversidade!”. A primeira reação, portanto, ao ser conduzido de minha casa para a Polícia Federal, acusado de obstrução de uma investigação, foi de surpresa.

Ao longo de minha trajetória como estudante de Direito (graduação, mestrado e doutorado), depois docente, chefe do departamento, diretor do Centro de Ciências Jurídicas e, afortunadamente, reitor, sempre exerci minhas atividades tendo como princípio a mediação e a resolução de conflitos com respeito ao outro, levando a empatia ao limite extremo da compreensão e da tolerância. Portanto, ser conduzido nas condições em que ocorreu a prisão deixou-me ainda perplexo e amedrontado.

Para além das incontáveis manifestações de apoio, de amigos e de desconhecidos, e da união indissolúvel de uma equipe absolutamente solidária, conforta-me saber que a fragilidade das acusações que sobre mim pesam não subsiste à mínima capacidade de enxergar o que está por trás do equivocado processo que nos levou ao cárcere. Uma investigação interna que não nos ouviu; um processo baseado em depoimentos que não permitiram o contraditório e a ampla defesa; informações seletivas repassadas à PF; sonegação de informações fundamentais ao pleno entendimento do que se passava; e a atribuição, a uma gestão que recém completou um ano, de denúncias relativas a período anterior.

Não adotamos qualquer atitude para abafar ou obstruir a apuração da denúncia. Agimos, isso sim, como gestores responsáveis, sempre acompanhados pela Procuradoria da UFSC. Mantivemos, com frequência, contatos com representantes da Controladoria-Geral da União e do Tribunal de Contas da União. Estávamos no caminho certo, com orientação jurídica e administrativa. O reitor não toma nenhuma decisão de maneira isolada. Tudo é colegiado, ou seja, tem a participação de outros organismos. E reitero: a universidade sempre teve e vai continuar tendo todo interesse em esclarecer a questão.

De todo este episódio que ganhou repercussão nacional, a principal lição é que devemos ter mais orgulho ainda da UFSC. Ela é responsável por quase 100% do aprimoramento da indústria, dos serviços e do desenvolvimento do estado, em todas as regiões. Faz pesquisa de ponta, ensino de qualidade e extensão comprometida com a sociedade. É, tenho certeza, muito mais forte do qualquer outro acontecimento”.

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