Brasileiros em Gaza estão sufocados com tanto fósforo branco, arma proibida por convenções internacionais e cujos efeitos 'ardem até os ossos'. "Cheiramos muito fósforo branco, é terrível, estamos com febre, a maioria das crianças está doente [...] Eu sinto muita saudade de beber água limpa, você não tem noção. É muito ruim beber água salgada", relata Shahd al-Banna, com a voz extremamente debilitada
Agência Sputnink
A ONU afirmou que mais de 10 mil palestinos foram mortos em Gaza desde o dia 7 de outubro. O número de crianças vitimadas já ultrapassa a casa de 4 mil.
Desde o início das agressões, Israel já bombardeou a Faixa de Gaza com, aproximadamente e segundo cálculos de organizações, a potência de explosivos equivalente a duas bombas nucleares. Com os ataques aéreos, portanto, fica quase impossibilitada a locomoção de civis pela região.
VEJA TAMBÉM: Fósforo branco: crianças palestinas são queimadas vivas por Israel em Gaza
É o caso da jovem brasileira Shahd al-Banna, 18, que se encontra na região sul de Gaza após ter sido deslocada do setor norte, onde o maior número de ataques aconteceu nos últimos dias.
“Em Gaza não há um lugar seguro. Os bombardeios não param, em todo lugar. O tempo todo temos entes que morrem. Agora já são 12 mil pessoas que morreram, a maioria são crianças. Eu sei que algumas amigas minhas não conseguiram sair do norte, e agora eu não tenho informações. Tento ligar para elas, mas não há rede, cortaram a conexão, infelizmente”, relata a brasileira.
O drama e a luta para sobreviver são acentuados por conta de um bloqueio marítimo, aéreo e terrestre por parte de Israel, que afeta os quase 3 milhões de residentes da Faixa de Gaza.
“Não temos uma rotina exata. A rotina é esperar sair daqui. Estamos sem gás e sem água mineral. Internet e luz já não temos há um tempão. Eu tô sentindo muita saudade de beber água limpa, você não tem noção. É ruim beber água salgada, é muito ruim”, completa Shahd.
Os esforços diplomáticos para garantir a evacuação de brasileiros pela passagem de Rafah, no Egito, ponto de deslocamento de múltiplos civis, têm sido difíceis.
O assessor para assuntos internacionais da Presidência da República Celso Amorim chegou a declarar que “não houve uma explicação para a não inclusão de brasileiros” na lista de nomes a sair de Gaza.
Fósforo branco
O Itamaraty abandonou os prazos relacionados à saída dos brasileiros por Rafah. Isso porque, no contexto das conversas diplomáticas, nenhuma das promessas foi cumprida por parte das autoridades israelenses e egípcias.
Enquanto isso, o sofrimento dos brasileiros na Faixa de Gaza se prolonga com esse impasse. “A gente tem um contato direto com a embaixada [do Brasil]. Eles falam que estão esperando que até quarta-feira [8] a gente saia daqui, mas eu não sei. De repente a fronteira fecha, depois abre de novo. Os brasileiros estão bem, mas a maioria das crianças estão doentes. Por causa dos bombardeios que aconteceram no norte, cheiramos muito fósforo branco, estão nos matando. É terrível. Eu estou com enjoo a maioria do tempo, e minha irmã também. Estamos com febre”, completa Shahd.
“Eu não sei se você está conseguindo ouvir o F-16. Se eu pensar em sair de casa, serei morta. Eu odeio o som desse avião”.
“A maioria dos ataques ocorre pela noite. Ocorrem muitos ataques de manhã também, de dia, de tarde, de noite. Mas é que de noite fica tudo calmo. Não sei como que eles fazem, mas acho que eles esperam as pessoas ficarem com sono para começar a atacar. Aí ninguém consegue dormir, todo mundo fica assustado. E quando as pessoas morrem de noite, as ambulâncias não conseguem trabalhar muito bem, que nem de dia. E é terrível de noite, terrível”, explica a brasileira.
“Eu quero proteger a minha irmã. Eu quero… Eu quero sair daqui, minha esperança é… dar um jeito para essa guerra acabar. E não ver mais pessoas morrendo. Pessoas que são inocentes.”
O exército israelense usou projéteis de artilharia contendo fósforo branco contra civis, afirmou a Anistia Internacional. A utilização de armas incendiárias é restrita pelo direito humanitário internacional, uma vez que substâncias como o fósforo branco são altamente inflamáveis, pois reagem rapidamente com o oxigênio. Além disso, a fumaça tóxica gerada pelo fogo se espalha com mais facilidade. Nos campos de batalha é utilizado para criar cortinas de fumaça, mas quando é liberado sobre uma população, o contato pode causar queimaduras graves que atingem os ossos, doenças respiratórias ou cegueira. O produto químico se distingue pelo mau odor, comparável ao do alho, e por gerar densas nuvens de fumaça branca.