O show de Silvio Costa Filho no Roda Viva
A velha direita tucana, que vinha votando em Jair Bolsonaro, poderia começar a pensar numa alternativa, com a morte política do sujeito, fora do catálogo de figuras manjadas que andam por aí pra cima e pra baixo de braços dados com Silas Malafaia.
Prestem atenção no moço cujo partido é ligado, não à Assembleia de Deus de Malafaia, mas à Universal de Edir Macedo. O deputado federal pernambucano licenciado Silvio Serafim Costa Filho, ministro de Portos e Aeroportos de Lula, está pronto para alguma coisa maior.
Costa Filho, 41 anos, do Republicanos, deu um show nessa segunda-feira no Roda Viva. Quando foi desafiado por Vera Magalhães a dizer o que os ministros poderiam fazer para divulgar o governo, como Lula havia pedido na reunião do primeiro escalão pela manhã, começou falando de realizações e não parou mais.
Começou uma lista de feitos, elogiou Lula e embalou a fala com tanto entusiasmo que precisou ser interrompido pela apresentadora. Costa Filho estava fazendo o que Lula havia pedido. E respondia à provocação de Vera Magalhães. Defender o governo era com ele mesmo.
Falar bem de Lula foi o que fez do começo ao fim da entrevista. Citou o nome do presidente mais de 10 vezes, algumas com certo carinho. Falou bem de colegas de outros ministérios.
Quando os jornalistas o cercaram, para que abordasse a contradição de ser governo e pertencer a um partido de oposição (o mesmo partido de Tarcísio de Freitas, Hamilton Mourão e Damares Alves), disse que não há conflito nenhum e saiu-se com essa:
“O que hoje a gente está vendo é que setores mais à direita da sociedade brasileira ficam banalizando a fé. Isso é misturar política com religião. É contraproducente para o país”.
Disse que para Lula o Brasil só tem um povo, sem distinções, e garantiu que não pode existir alguém com maior fé do que o presidente (“um homem que saiu de Pernambuco num pau de arrara”). Que Lula respeita todas as religiões “e prega a paz no mundo”.
Defendeu o deputado Marcos Pereira, bispo da Universal e presidente do Republicanos, e admitiu que “a oposição tenta disseminar fake news”. Parecia concordar, ao se referir à oposição, que há propagadores de mentiras dentro do seu próprio partido.
E disse que Lula não investe em controvérsias com a direita, tanto que não encaminhou ao Congresso nenhuma pauta da área dos costumes.
O ministro é articulado, tem uma toada boa e cita números e fatos com desenvoltura. Parece dominar a área e conhecer todo o governo.
É uma figura incomum, pela capacidade de defender o governo e ao mesmo tempo criticar sem volteios a oposição mais antiLula, sabendo que muitos desses ataques partem de líderes religiosos da igreja que tutela o Republicanos.
Claro que está desfrutando da exposição de ser ministro e calibrando sua ascensão em Brasília e no Nordeste, para ser um nome para o governo de Pernambuco, um Estado onde a política já está congestionada pelo poder das famílias Campos e Lyra.
Mas direita e extrema direita podem começar a pensar que o rapaz merece mais. Não é bronco e atrapalhado como Tarcísio, Zema e Caiado. Tem a política no sangue, é filho do ex-deputado Silvio Costa, admirador de Dilma (atacou o impeachment) e de Lula.
O filho também votou em Lula em 2022, mesmo sendo do Republicanos. Em 2016, filiado ao PTB, foi candidato a vice-prefeito do Recife, na chapa liderada por João Paulo (PT). O prefeito Geraldo Júlio (PSB) conseguiu a reeleição.
O ministro deu dribles nas obviedades da bancada do Roda Viva, disse que o ex-vice-presidente José Alencar também era do Republicanos e cravou:
“Desde a época do movimento estudantil, sempre votei no presidente Lula. Eu sou lulista, eu sou de centro. Defendo um Estado inteligente e o equilíbrio das contas públicas. Um Estado que tenha responsabilidade fiscal, mas sobretudo um Estado de bem-estar social. O partido sempre respeitou minha posição política”.
Costa Filho parece ser a mais complexa figura do governo, quando se olha para os conflitos que carrega como metade governo e metade oposição.
Tem toda pinta de que será o Eduardo Leite que dará certo, sem a fala gongórica e rococó do gaúcho. Talvez seja o político de centro que a direita finge procurar, enquanto não desgruda da turma de Malafaia.
Mas a direita supremacista do sudeste e do sul, viciada em fascismo desde 2018, acolheria um nordestino, neto de cortador de cana e pernambucano?
*Moisés Mendes é jornalista em Porto Alegre. É autor do livro de crônicas Todos querem ser Mujica (Editora Diadorim).
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