Eduardo Bonzatto*, Pragmatismo Político
Para Anie
É chegado o tempo das nomeações, em que determinados padrões devem ser reconhecidos para justificar o que não deveria ser padronizado.
A força da nomeação implica na incorporação dos padrões relativos ao distúrbio respectivo.
Partilhar com os seus iguais dos sofrimentos que nos normatizam, fez das patologias da psiquê um modismo nada perigoso.
Para que a conferência de um determinado estado mental seja reconhecida, empregamos o Demônio de Laplace, um experimento mental concebido pelo físico Pierre Simon Laplace: de posse de todas as variáveis que determinam o estado do universo em um instante, ele pode prever o seu estado no instante.
Consideremos as distrações do Tdah. Em geral, o TDAH começa na infância e pode persistir na vida adulta. Pode contribuir para baixa autoestima, relacionamentos problemáticos e dificuldade na escola ou no trabalho.
Os sintomas incluem falta de atenção e hiperatividade.
Mas esse diagnóstico é acrônico como elemento de percepção. Cada um dos sintomas e prejuízos pode ser desfeito com elementos de contorcionismo. Os relacionamentos problemáticos são livramentos de incômodos certos. A escola sempre oferece um tutor que facilita os inconvenientes. O trabalho em si já é um tormento e a síndrome pode eliminar os tormentos erradicando a subserviência.
Mas o problema mais citado é a falta de foco. O foco suga, atrai tudo para si de modo exigente e exterior. O foco é heteronômico.
O foco é uma limitação em si, erradicando universos periféricos infinitamente mais importantes e para muitos, invisíveis.
A hiperatividade como elemento integral do sexo torna sua prática indefinidamente importante e prazerosa.
A indicação dos inconvenientes como dados de realidade oculta fenômenos que são elementais para a vida boa. Cada um impede que a vida desande, que a contingências operem como permanentes situações de sofrimento.
Se enfrentamos cada um dos dados da síndrome, podemos agora apresentá-la sob outro prisma.
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A discrição é uma das mais elegantes posturas do ser, do humano-terra que se afasta voluntariamente da soberania.
Dessa forma, temos como prever os ordenamentos do universo com uma atenção difusa e lateral, capturando manifestações que a calma e a discrição nos permitem presenciar, sem a força que deturpa a percepção em nome de algum esforço normativo.
A exigente normalidade é canhestra e torpe, pois considera que é a linha do pensamento que sustenta o cosmos. Mas vivemos nas curvas, nas entrelinhas, nos cantos mais sigilosos dos ambientes e dali podemos avaliar cada passante, cada ausente, cada pulsante.
A fusão entre a distração e a discrição promove uma ferramenta perceptiva de amplo espectro, capturando movimentos sutis de altíssima complexidade e permitindo uma leitura cujo alcance reverbera por muito tempo na fronte do agente.
A distração é excretora, emite para o mundo seu peculiar feromônio. Está sempre se espalhando para fora e para os lados. É a melhor caçadora a distração, pois contempla todo o espectro sem focar em nenhum ponto.
Esse observador distraído, invadido por informações estendidas, por dimensões conflituantes, por dados minerais de artesania e labor, em dado momento do tempo de exposição se vê observado no círculo perfeito de sua discrição e pode sempre admirar a realidade de dentro.
A realidade, para ele, se torna uma loja de conveniência, que lhe permite acesso a uma variedade grande de opções perceptivas, cada uma abrindo novas portas e novas sinuosidades para dimensões imprevisíveis.
O portador do tdah antes de ser limitado por suas distrações, é tomado por sua discrição com uma elegância fleumática que acompanha sua aura.
Antes de parecer tímido, ele ou ela estão mapeando o ambiente em busca das portas, pois sabem das portas que se dispõem pelo ambiente e só quem não pode ver é porque está focado na redução de sua percepção.
Ambientados por suas portas, eles podem conceber múltiplas realidades por onde eventualmente escapam das chateações do mundo ordinário e único.
O significado de tdah então deve ser redirecionado para a exaltação de seus portadores: Transpondo Dimensões Alternativas de Humanidades.
*Eduardo Bonzatto é professor da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB) escritor e compositor
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