Na entrevista ao Roda Viva na segunda-feira, o prefeito reeleito do Recife, João Campos, atrapalhou-se e deu uma vacilada quando a jornalista Maria Cristina Carvalho perguntou quais foram os três livros que ajudaram a formar a sua visão de Brasil.
Citou ‘Por que as nações fracassam’, do americano Daron Acemoglu e do britânico James A. Robinson, de 2012, que ganharam o Nobel de Economia este ano.
É óbvio que não se trata de um livro sobre o Brasil, mesmo que aborde questões mundiais. Maria Cristina ouvia os comentários do moço meio espantada, com a testa franzida.
Campos respondeu, exaltando a importância das instituições para que os países sigam em frente sem solavancos, um dos temas do livro, e deu o assunto por encerrado.
A jornalista lembrou que pedira três livros e insistiu, como se fosse elaboradora de prova do Enem: e os outros dois? Ele tentou desconversar e citou então ‘Utopia para realistas’, do historiador holandês Rutger Bregman.
Explicou que costuma ler livros sobre políticas públicas e instituições “no momento contemporâneo”. Percebia-se que ele ganhava tempo, depois de citar o segundo livro, e olhava o celular colocado ao lado da perna, como se tentasse espiar uma cola enviada por alguém.
E a última obra, apenas citada, sem comentários, foi a trilogia sobre Getúlio Vargas, de Lira Neto. Esta sim ajuda na compreensão do que é o Brasil República. Mas os jornalistas não se interessaram pelo assunto e ficamos sem saber o que ele teria a dizer.
Apenas como observação, Campos poderia ter citado livros monumentais, de pernambucanos, como ele. Duas obras incluídas na maioria das listas dos 10 mais importantes livros para a compreensão do Brasil. ‘Casa Grande & Senzala’, de Gylberto Freire, e ‘O Abolicionismo’, de Joaquim Nabuco.
Mas o registro aqui é apenas como curiosidade. Campos tem apenas 30 anos e ninguém pode cobrar dele o que nem Sergio Moro tem a oferecer sobre leitura de livros. Mas se tivesse citado esses dois ou João Cabral de Melo Neto, Manuel Bandeira ou Mario Pedrosa, teria arrasado.
O moço do PSB mostrou na entrevista por que é um dos fenômenos recentes da política brasileira. Talvez tenha faltado um pouco de sal, pelo excesso de preocupação em ficar bem com todo mundo.
Mas ficou evidente que é um bisneto em condições de levar adiante a história de Miguel Arraes, mesmo que, claro, não esteja sentado à esquerda do bisavô.
É um político de centro, que alguns consideram de centro-esquerda, com um vasto caminho pela frente. O namorado de Tabata Amaral é antifascista, antibolsonarista e do mesmo Pernambuco de Lula. Tem talento como gestor e é bom de conversa.
*Moisés Mendes é jornalista em Porto Alegre. É autor do livro de crônicas Todos querem ser Mujica (Editora Diadorim).
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