Redação Pragmatismo
Europa 04/Abr/2018 às 13:28 COMENTÁRIOS
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Crescimento de Portugal com governo de esquerda joga Lisboa no mapa da inovação digital

Publicado em 04 Abr, 2018 às 13h28
Crescimento de Portugal com governo de esquerda inovação tecnologia startups
Miguel Santo Amaro, fundador do Uniplaces (reprodução)

Prontos a aplaudir o jovem Miguel Santo Amaro, fundador da empresa, uma centena de funcionários se espalham todas as quartas-feiras pelo chão, por sofás, bancos, degraus de escadas e até por uma rede que decora o ambiente de trabalho da startup portuguesa Uniplaces.

Conectados via web a colegas distribuídos por várias capitais europeias, eles recebem de seu “guru” os dados positivos sobre a performance e as diretrizes para as próximas semanas da companhia, uma das que simboliza a recente retomada econômica em Portugal.

Há seis anos, a empresa, espécie de Airbnb da habitação estudantil, desenvolveu uma plataforma digital que conecta proprietários de imóveis e universitários em busca de alojamento de aluguel durante o ano letivo. A ideia deu certo e atraiu aportes externos, um primeiro de € 3,2 milhões e um segundo de € 24 milhões em 2015. Hoje a companhia já soma 140 funcionários e se tornou referência em seu setor na Europa, atuando em seis países e movimentando € 100 milhões só em transações entre estudantes e proprietários.

O caso de sucesso no universo digital é apenas um em meio a uma economia que, após anos de recessão, reencontrou o caminho da prosperidade. Depois de virar a página do socorro econômico de € 78 bilhões e da consequente intervenção da União Europeia (UE) e do Fundo Monetário Internacional (FMI), Portugal vive hoje seu melhor desempenho econômico em 17 anos. Com o “crescimento do século”, de 2,7% em 2017 – acima da média da UE –, e o desemprego em forte baixa, em 7,8%, o país não só vem saneando suas finanças públicas como já voltou a aumentar o salário mínimo. Antes moribunda, sua indústria cresce e se qualifica, ao mesmo tempo em que o país se transforma em um celeiro europeu de tecnologia, design e economia digital.

Virada

O “milagre português”, como vem sendo chamado por alguns analistas econômicos mais eufóricos, reflete a virada de expectativas em torno do país. Atingido em cheio pela crise financeira global, Portugal enfrentou entre 2010 e 2014 o risco concreto da falência. Com um déficit público de 9,4% do PIB em 2009, o país acabou arrastado pela crise das dívidas da zona do euro, tornando-se, ao lado da Grécia e da Irlanda, um dos primeiros a serem socorridos pelo FMI na história da Europa. De grau de investimento com dívida classificada A+ pela agência Standard & Poor’s, acabou rebaixado a grau especulativo, nível que indica mais risco para investidores.

Nesse período, mais de 500 mil pessoas, a maioria jovens, buscou postos de trabalho no exterior, em países como Brasil, Angola, Moçambique e na Europa.

Hoje a política de austeridade ficou para trás e a situação se inverteu. Em Lisboa, o comércio prospera em bairros como o Alfama, recheado de turistas e também de restaurantes típicos e casas de fado. Na capital e no Porto, as duas maiores cidades do país, prosperam pequenos e médios negócios que vão da cosmética natural e da alimentação orgânica à realidade virtual e à inteligência artificial. Não raro, essas áreas se fundem, como no caso da The Green Beauty Concept, uma loja de cosmética natural via e-commerce criada em 2017 por Joana Parente, 30 anos, na cidade de Estoril. “Havia uma lacuna que podíamos preencher”, conta Joana, referindo-se ao mercado nacional.

Antes fora do mapa da inovação digital, Lisboa tornou-se um dos hubs mais promissores para novas empresas de toda a Europa. Atraídos pela qualidade de vida, pela qualificação da mão de obra jovem e, sobretudo, pelo seu custo baixo, startups têm se mudado para Lisboa. A capital agora atrai grandes eventos do setor de tecnologia, como o WebSummit, espécie de Fórum de Davos do universo digital. De acordo com dados da incubadora público-privada Startup Portugal, 46% dos empregos criados no país estão ligados ao universo das startups. Mais de 2,3 mil estão em incubação nesse momento, e nelas mulheres ocupam postos de liderança em 35% dos casos. “Houve uma oportunidade muito específica durante a crise”, diz Miguel Santo Amaro.

A busca pelo dinamismo também é seguida por multinacionais europeias. Este mês, parte do setor de informática do banco francês Crédit Agricole será transferido para Lisboa, aproveitando uma economia da ordem de 30% nos gastos. Desde 2016, BNP Paribas e Natixis fizeram o mesmo, um movimento também seguido por empresas da Alemanha e do Reino Unido.

A nova fase de Portugal beneficia ainda a “velha indústria”, que também se recupera. Devastado pela concorrência com os países do Leste da Europa e da Ásia, o setor têxtil e de vestuário, um dos mais tradicionais do país, viu quase 50% de suas empresas fecharem entre 2001 e 2009. Hoje reorganizado, bateu seu recorde nas exportações do país – € 5,23 bilhões em 2017.

Ainda há dúvidas se expansão é sustentável

Embora satisfeitos com os números do PIB e do desemprego registrados em 2017, economistas portugueses manifestam dúvidas sobre se o crescimento verificado no ano passado é sustentável. José Reis, diretor da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC), elogia a recuperação, mas entende que a economia portuguesa ainda enfrenta desequilíbrios preocupantes e que o tamanho da dívida pública vai continuar a absorver grande parte do crescimento ao longo das próximas décadas.

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Andrei Netto, Agência Estado

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