A ameaça do Jornal Nacional e a rara sensatez de Noblat
Jornal Nacional usa fala do General Villas Bôas para ameaçar a democracia. Por outro lado, Ricardo Noblat, ex-Globo, tem raro momento de sensatez ao comentar post do Chefe do Exército
Até mesmo jornalistas que são identificados como pertencentes ao campo da direita política brasileira repudiaram o post do Comandante Villas Bôas e o interpretaram como ameaçador.
Reinaldo Azevedo, da Folha, e Eliane Cantanhêde, do Estadão, criticaram a autoridade máxima do Exército brasileiro. Kennedy Alencar, da CBN, foi ainda mais incisivo e chamou o general de “golpista”.
“A informação de Eliane Cantanhêde de que o general Villas Bôas falou pelo Alto Comando do Exército piora e agrava sua manifestação sobre o julgamento de hoje no STF. A fala do general é golpista. É inaceitável na democracia. É resultado da impunidade dos crimes de 64. Ditadura nunca mais!”, declarou o jornalista.
Dentro da mídia corporativa, uma das manifestações mais surpreendentes foi a de Ricardo Noblat (ex-Globo, atualmente na Veja). Nos últimos anos, Noblat tem flertado com o que há de pior na política brasileira. Dessa vez, porém, foi obrigado a se colocar do lado contrário ao autoritarismo.
Em sua coluna, ele escreveu:
Cuidadosamente mal redigida para disfarçar o que diz, alvejar o alvo certo, porém oculto, e ameaçar como se apenas advertisse, a nota assinada pelo general Eduardo Villas Bôas, comandante do Exército, e postada em sua conta pessoal no twitter, porque é de nota que se trata, foi uma clara, descabida e perigosa interferência na vida institucional do país.
O chefe das Forças Armadas, segundo a Constituição, é o presidente da República. É ele, e somente ele, portanto, quem em nome delas pode falar sobre temas políticos de repercussão geral. Aos comandantes das três armas – Exército, Marinha e Aeronáutica -, cabe falar sobre assuntos administrativos e aqueles diretamente afeitos aos cargos que ocupam.
Militar não é igual a civil. O que os distingue não é só a farda que um veste e o outro não. Militar tem acesso a armas pesadas, pilota brucutu, maneja tanques e é treinado para matar. Se um deles fala qualquer coisa, soa diferente do civil que diga o mesmo. Porque um tem a força capaz de pulverizar literalmente quem quer que seja. O outro, só a força da palavra.
A fala do general Villas Boas não foi a de um chefe que se dirige aos seus subordinados. Foi um pronunciamento à Nação em nome do “Exército brasileiro” e a propósito da situação que vive o país. Com o objetivo de assegurar que o Exército compartilha “o anseio de todos os cidadãos de bem de repúdio à impunidade” e de respeito às leis e à paz social.
Não faltou na fala do general a provocação travestida de pergunta que ele dirige diretamente “ao povo” e a instituições não nomeadas: “Quem realmente está pensando no bem do país e das gerações futuras e quem está preocupado apenas com interesses pessoais?” Para, por fim, afirmar que o Exército “se mantém atento às suas missões institucionais”.
A reação do presidente da República à fala do general foi nenhuma. Os políticos a engoliram a seco Em compensação, esbaldaram-se com a fala as novas vivandeiras de quartéis que em nome da ordem pregam a desordem e o colapso da democracia entre nós.
Jornal Nacional
A Rede Globo, por sua vez, usou a mensagem do General Villas Bôas como forma de pressionar o Supremo Tribunal Federal (STF) a rejeitar o habeas corpus da defesa do ex-presidente Lula.
Através do Jornal Nacional desta terça-feira (3) a emissora alardeou, ao vivo, que acabara de chegar uma “notícia de última hora”. Na sequência, em tom de ameaça, William Bonner leu integralmente o tuíte do General.
Em 1964, a Globo divulgou um editorial de apoio e solidariedade ao golpe militar que resultaria numa ditadura de mais de 20 anos no Brasil.