Redação Pragmatismo
Meio Ambiente 06/Set/2018 às 15:02 COMENTÁRIOS
Meio Ambiente

Produtores de grãos (e de veneno), durmam sossegados

Publicado em 06 Set, 2018 às 15h02

AGU derruba liminar que suspendia glifosato: os produtores brasileiros de grãos podem continuar a dormir sossegados. Norte-americanos, alemães e chineses comemoram efusivamente. Com a palavra os candidatos às eleições de outubro para Executivo e Legislativo

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Rui Daher, CartaCapital

E aí produtores de grãos, contentes? Suas churrascadas continuarão regadas a glifosato. Preferem-no como? On the rocks ou straight? Não os avisei que sossegados poderiam estar? Foi só ameaçar comprometer a safra e a Advocacia-Geral da União (AGU) derrubou a liminar que determinava a suspensão do registro do princípio ativo para quando setembro viesse. Norte-americanos, alemães e chineses comemoram efusivamente.

Por outro lado, nos EUA, processos envolvendo o glifosato cresceram mais de 50% depois que a Monsanto foi condenada a indenizar em US$ 289 milhões um consumidor que alega ter desenvolvido câncer após exposição ao herbi-CIDA, terminação de tudo que assassina.

De uma coisa não posso discordar. Vocês têm sorte, lobby e, vá lá, persistência. Continuam confiando nos preços de Chicago e na política cambial brasileira para se protegerem. Agora mais uma: o USDA prevê as vendas agrícolas dos EUA à China despencarem 37%, o que favoreceria outros grandes produtores de grãos, aí incluído o Brasil “In Trump We Trust”.

Agradeço, assim como toda a Federação de Corporações, e felicito-os por mais essa etapa de bonança que vem aí. Já a saúde do planeta não sei o que pensa disso.

É claro que o presidente pele-laranja conta conosco para desordenar o mundo econômico, mas até quando seremos tais prestadores de serviços? Respondo: enquanto formos míseros exportadores de bens primários a preços por eles controlados e custos e competitividade por nós ignorados; enquanto puderem encher as burras de seus agricultores com incentivos e subsídios; enquanto pouco nos importarem os patrimônio, soberania e defesa de valores culturais; enquanto as instituições caminharem em frangalhos até o abismo; enquanto toga for partido, partido fisiologia e fisiologia apenas cocô.

O espetáculo deprimente que assistimos desde o impeachment, em 2016, de uma presidente eleita com 54 milhões de votos, faz-nos motivo de risotas em países estrangeiros. Prende-se por corrupção não comprovada um estadista mundialmente reconhecido e dá-se uma tapinha na bunda de políticos explicitamente corruptos, mas não punidos por pertencerem aos partidos que dão sustentação ao Acordo Secular de Elites. As folhas e telas cotidianas calam-se e miram sempre o mesmo alvo.

O Censo Agropecuário 2017, embora manquitola (críticas já expostas), examinado com a lupa, mostra grandes retrocessos. Sim, nem tudo e todos contam com as Bolsas de Chicago e Nova York ou a política cambial do governo brasileiro. A bonança apenas se explicita em termos de área destinada, produção e produtividade às culturas de exportação de commodities.

Para ser pop, tech e tudo não é para aí que a agropecuária brasileira deveria olhar, mas sim para milhões de propriedades pequenas, médias ou grandes voltadas para o mercado interno e para especializações consonantes com as tendências do novo perfil da nutrição sustentável (ver coluna anterior).

Segundo o Censo, plantamos em 350 milhões de hectares, mais 5% em 11 anos. Poupamos terras? Sim, mas concentradas em áreas de mais de mil hectares (47,5%), voltadas aos grãos exportáveis, enquanto aquelas abaixo de mil hectares caíram para 32% do total, sendo muitas delas fruto de arrendamentos.

Na medida em que aumentam o uso de tecnologia – mecanização e tratamentos nutricionais – e a tomada de financiamentos, eles ocorrem nas áreas maiores e voltadas às commodities.

A área de soja duplicou em relação às dedicadas a arroz e feijão. Assim, 85% das propriedades agropecuárias (4,2 milhões) brasileiras vivem à margem das tecnologias e dos recursos oficiais de financiamento.

Como disse o diretor-geral da FAO, José Graziano da Silva, no que assino embaixo, “a nossa agricultura tem aumentado a partir de uma abordagem de crescimento econômico e não de desenvolvimento”.

Em desenvolvimento, se considere a qualidade de vida dos homens e mulheres do campo, respeito à preservação ambiental, à emissão de gases de efeito estufa, poluição de água, solos e potencial financeiro da biodiversidade.

Com a palavra os candidatos às eleições de outubro para Executivo e Legislativo.

Uai, por que o silêncio?

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