João Miranda
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Política 01/Jan/2019 às 11:37 COMENTÁRIOS
Política

Sobre o boicote à posse de Bolsonaro

João Miranda João Miranda
Publicado em 01 Jan, 2019 às 11h37

A ausência faz parte de um ato de resistência e não significa um desrespeito ao resultado das eleições

João Elter Borges Miranda*, Pragmatismo Político

Líderes do PT, PSOL e PCdoB anunciaram nesta sexta-feira, 28, que seus deputados e senadores não vão participar da cerimônia de posse do presidente eleito, Jair Bolsonaro, no dia 1º de janeiro no Congresso.

Outras legendas que já se declaram como oposição, como o PDT e PSB, não articularam um “boicote”, mas seus líderes tampouco devem comparecer.

Vi muitas críticas à decisão de os partidos de esquerda não participarem da cerimônia. Em grande medida, as críticas versam a partir do pressuposto de que numa democracia não existem inimigos, apenas adversários.

Essa reação me fez pensar em Adorno e Horkheimer, filósofos alemães que, no contexto de ascensão do nazismo na Alemanha, na década de 1920, afirmaram que nessas horas é muito “estúpido ser inteligente”. Eles se referiam aos europeus intelectualizados, modernos e civilizados, que na época adotaram uma série de argumentos de lógica supostamente impecável para afirmar que seria impossível a ascensão do Terceiro Reich.

Contudo, não podemos facilitar as coisas para os bárbaros. Não seria necessário muito para evidenciar que hoje as coisas não estão postas assim. Basta observar que Bolsonaro age de acordo com a lógica oposta: a do amigo/inimigo.

Ao longo de uma eleição repleta de fake news, ele até tentou adotar uma postura mais moderada, principalmente no segundo turno. Procurou suavizar o seu perfil com pele de cordeiro, mas não adianta. Sua personalidade flagrantemente fascista salta aos olhos.

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Bolsonaro prega constantemente o culto da violência, estabelecendo como inimigo qualquer um que discorde dele, principalmente a esquerda brasileira, a qual não é reconhecida como interlocutora e para a qual ele manifesta, sempre que pode, o projeto de eliminá-la.

Ele atacou a esquerda, principalmente o PT, ao longo da campanha e após ela, deixando evidente quão longe está disposto a ir em seu desgoverno no uso explícito da força para caçar a oposição.

Participar da cerimônia significaria, assim, chancelar os “profissionais da violência”. Seria um excesso de elegância com quem não tem elegância nenhuma. A decisão do PT, PSOL e PCdoB de fazerem o boicote é acertada neste sentido. Num contexto de semilegalidade não há como agir como se estivéssemos em uma democracia normal. Fazer isso seria desconhecer a lógica de extermínio defendida pelo nosso autoproclamado inimigo.

Obviamente, isso não significa ser antidemocrático. A decisão das urnas é fato consumado, inclusive. Porém, isso não pode representar aval a um governo que terá à frente um fascista com vínculos orgânicos com a ditadura militar.

Portanto, é evidente que Bolsonaro, em seu governo, não agirá dentro do universo da divergência política aceitável, promovendo uma negação radical dos princípios e ideias de esquerda, com o objetivo de nos exterminar. Neste sentido, os partidos de esquerda nos blindaram com a decisão de não participarem da cerimônia. A ausência faz parte de um ato de resistência e não significa um desrespeito ao resultado das eleições.

*João Elter Borges Miranda é professor de história formado pela Universidade Estadual de Ponta Grossa, trabalha na rede pública do Estado do Paraná e milita na Frente Povo Sem Medo, Frente Ampla Antifascista e Intersindical. Email: [email protected]

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