Carros não são brinquedos
Delmar Bertuol*, Pragmatismo Político
Há tempo que os carros, pelo menos no Brasil, não são meros meios de transporte. Pra falar a verdade, não sei se em algum momento ele o foi tão somente um grande objeto que serve pra nos levar lá e cá.
Os carros são antes uma ferramenta de exibição de status social. O auto do sujeito deve ser proporcional ao seu salário. Ou, mais do que isso, grande parte do salário deve servir pra pagar o financiamento a juros pornográficos. Também há pouco, com o lançamento das chamadas SUVs, esses modelos se tornaram meio de afirmação de masculinidade. Sobretudo para os tiozinhos com mais de quarenta. Os homens querem se impor pelo tamanho das camionetes que dirigem.
Objeto de exibição financeira ou como ratificação de virilidade, os carros devem ser conduzidos com prudência e responsabilidade. E aqui entra outra finalidade dada aos carros, e que muito me incomoda, pois de fato me afeta como motorista e pedestre. Refiro-me aos manos com os autos rebaixados.
Se o fato de cortar as molas das suas saveiros (eles pagaram pelas molas, incluídas no carro, e depois pagaram para retirá-las) e deitar o banco lá pra trás (mas andar curvado pra frente. Não entendo a lógica) não afetasse a vida alheia, até concordaria com as postagens em que reclamam que a polícia ou os fiscais de trânsito os multam. Mas fato é que eles atrapalham a fluência do trânsito, andando em velocidade menor do que a mínima permitida. Sim, provavelmente eles desconhecem a legislação, mas há uma velocidade mínima a ser observada.
E também é regra. Todos os Chevettes com as molas arrancadas se arrastam pela rua com um som ultrapassando os limites dos decibéis permitidos. Sim, provavelmente eles desconhecem a legislação, mas há um volume máximo do som a ser observado. Se não houver esse respeito, isso causa, além de poluição sonora, doenças neurológicas e psiquiátricas nas pessoas submetidas a esse “tut-tut” a toda altura.
E é de se refletir também o que essa gurizada pensa ser um carro. O trânsito! Será que eles acham que agora que já tem dezoito podem brincar de autorama versão adulta?
Os índices de mortes no trânsito em nosso país são bélicos. Guiar um pedaço de metal com quase tonelada exige não só treinamento e perícia como também responsabilidade. Um carro de verdade não pode ser aquele brinquedinho que tínhamos na puerícia.
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Como disse antes, o automóvel está com a sua finalidade deturpada por grande parte dos seus proprietários, não só pelos aficionados pelos tunados (que é estragar a originalidade do veículo. E sim, eles pagam caro pra isso). Mas quando determinado grupo polui o meio ambiente, prejudica a saúde dos transeuntes e atrapalha a finalidade máster do trânsito, a mobilidade, medidas punitivas devem ser tomadas sim.
Se se sentirem injustiçados, que de fato retomem os tempos juvenis. Escutem suas músicas altas nas reuniões dançantes numa garagem e comprem carrinhos de controle remoto. O trânsito não pode ser pracinha.
*Delmar Bertuol é professor de história da rede municipal e estadual, escritor, autor de “Transbordo, Reminiscências da tua gestação, filha”
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