Por Eduardo embaixador, Jair Bolsonaro oferece cargos e regalias
Jair Bolsonaro negocia caro com Senado para aprovar Eduardo na embaixada dos EUA. R$ 2,5 bilhões é o orçamento dos órgãos cujos cargos são oferecidos a senadores em troca de apoio ao filho do presidente. "Todo mundo vai ganhar uma boquinha", admite senador
O ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, tem andado com duas planilhas embaixo dos braços nas últimas semanas. Em uma, contabiliza os senadores que prometem votar a favor da indicação de Eduardo Bolsonaro para a embaixada dos Estados Unidos. Na outra, seleciona cargos em aberto ou por vagar para distribuir a aliados, numa “troca de favores”.
Na mira, órgãos do governo federal cujo orçamento de 2019 soma quase R$ 2,5 bilhões. Até a votação do nome de Eduardo no plenário, ainda sem data prevista (a mensagem presidencial oficializando o nome nem sequer chegou ao Senado), esse número pode aumentar.
Assim é o “jogo político”. Aquele tão rejeitado pelo presidente Jair Bolsonaro e agora colocado em prática, em sua plenitude, para o que se tornou a maior prioridade do presidente neste momento — ver o filho 03 no maior cargo da diplomacia brasileira.
Mas Jair não quer apenas passar o nome, mas também avalizar com uma maioria “robusta”, para “mostrar sua força”. De acordo com pessoas próximas do chefe do Executivo, isso passou à frente até da vontade de aprovar a Previdência no Senado.
Mas pode sair bem caro ao presidente romper as resistências que a situação “peculiar” e “inédita” criou — um presidente indicando o filho ao cargo, rompendo com uma tradição que se consolidou no Itamaraty de colocar na embaixada do Brasil em Washington diplomatas de carreira, o que não é o caso de Eduardo.
Em negociação estão, especialmente, agências reguladoras e cargos de destaque em superintendências e órgãos da União nos estados. Acordos a respeito vêm sendo costurados em conversas pelos corredores, gabinetes, ao pé do ouvido, em reuniões de fachada ou secretas.
Eduardo Bolsonaro
Inicialmente resistente a entrar na “jogada”, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), aceitou fazer parte do tabuleiro. Mas só após muita insistência do Palácio do Planalto e a promessa de que lhe sobrariam cargos-chave em alguns locais importantes.
O primeiro deles, para o qual já começou inclusive a sondar pessoas, é o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica). Também passarão por Alcolumbre vagas em diretorias da Anac (Agência Nacional de Aviação Civil). Lá, por exemplo, um dos atuais diretores que está com a cabeça a prêmio é Ricardo Fenelon Júnior, genro do ex-senador Eunício Oliveira (MDB-CE), antecessor de Davi Alcolumbre na presidência do Senado.
Fala-se ainda em deixar que o senador coloque conhecidos na Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) e na ANA (Agência Nacional de Águas).
Os orçamentos de todos os órgãos que têm entrado nas negociações com o presidente do Senado somam cerca de R$ 1,8 bilhão (veja abaixo o orçamento detalhado de cada um deles).
Porém, embora o Planalto tenha conseguido um aliado de peso na tentativa de convencimento dos senadores em prol de Eduardo embaixador, para que isso se concretize, é necessário reunir votos. E nisso o deputado federal tem desvantagem.
Desde a última semana, antes mesmo que os Estados Unidos confirmassem a autorização a seu nome por meio do agrément, Eduardo começou um “corpo a corpo” com os senadores mais próximos. Seu irmão, senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), também pede em seu favor pela Casa, bem como Onyx e outros integrantes do PSL. Os Bolsonaro contam também com a ajuda do presidente da Comissão de Relações Exteriores (CRE), Nelsinho Trad (PSD-MS).
Mesmo com todas essas forças reunidas, a avaliação é que, se a votação fosse hoje, a maioria do Senado seria contrária à indicação do filho do presidente para a vaga — uma proporção de 60% a 40%.
Barganha
Desde o retorno do semestre legislativo, no início de agosto, Davi Alcolumbre tem feito o que chama de “gabinete itinerante”, por meio do qual vai a cada senador com a justificativa de ouvir demandas individuais. Porém, usa esse espaço numa tentativa de convencê-los a votar em prol de Eduardo.
Leva “bons argumentos”. O principal deles, o voto secreto. Cabe ao plenário do Senado a palavra final em indicação de autoridades, após sabatina em colegiado apropriado – no caso de embaixador, na CRE. Senadores da oposição dizem que vão exigir votação aberta. A confidencialidade, porém, é regimental.
Alcolumbre também se vale da reforma da Previdência como um trunfo. A PEC (Proposta de Emenda à Constituição) teve um calendário especial anunciado, passará por avaliação na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), mas já está em processo adiantado de acordo e tende a ser votada, no mais tardar, até outubro.
Por isso, o presidente da Casa diz a seus pares que o Brasil tem dado demonstrações de avanços no campo econômico e “não pode passar ao mundo uma imagem de que há instabilidade na política”, o que ficaria escancarado com a rejeição ao nome de Eduardo.
A alguns outros, mais próximos, porém, o parlamentar usa um idioma mais persuasivo: as boas e velhas indicações a cargos. A reportagem encontrou três senadores de centro-direita nesta quinta-feira (15) que, sob condição de não terem revelados seus nomes, contaram ter “ouvido sobre o assunto”. Um mais incisivo chegou a afirmar que “todo mundo vai ganhar uma boquinha”.
Possível relator da indicação de Eduardo, o senador Chico Rodrigues (DEM-RR), ressaltou que “o Davi [Alcolumbre] está ajudando bastante”, sem detalhes, contudo. O parlamentar emprega um primo de Eduardo, conhecido como Leo Índio, em um cargo comissionado por mais de R$ 22 mil.
Outras peças
Mais do que os apoios que Alcolumbre tem conseguido reunir, o núcleo bolsonarista sabe que, para cumprir a missão dada pelo presidente, vai precisar de mais. E ampliar a margem de votos, na prática, significa fazer acordos com alguns partidos considerados chave na Casa, como MDB, PP e PSDB. Bolsonaro já teria conseguido seis votos para Eduardo com os cargos prometidos a esses partidos.
É dado como certo que há disposição de oferecer a integrantes dessas siglas vagas em outras autarquias de menor visibilidade, mas com significativa verba à disposição. São os casos de Sudam (Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia), Sudene (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste), Sudeco (Superintendência do Desenvolvimento do Centro-Oeste), Banco do Nordeste e Banco da Amazônia. São ao menos R$ 672 milhões em jogo.
O senador Paulo Paim (PT-RS) não acredita que o nome de Eduardo seja aprovado “apesar da barganha que tem sido feita”. “Todo mundo sabe que, infelizmente, está mais viva do que nunca a política do dando que se recebe”, disse.
Já o senador Marcos Rogério (DEM-RO) considera normal destinar espaço a aliados nos espaço do governo. “Melhor pegar alguém indicado por um aliado do que alguém que você não conhece — naqueles cargos de confiança. Desde que ela preencha os requisitos técnicos, morais, não vejo com maus olhos”, avaliou. Ele, porém, diz desconhecer qualquer acordo nesse sentido e discordar quando isso é “fruto de uma barganha”.
O preço das promessas do presidente
O orçamento da União para 2019 é de R$ 3.382.224.021.819,00 (três trilhões, trezentos e oitenta e dois bilhões, duzentos e vinte e quatro milhões, vinte e um mil, oitocentos e dezenove reais).
Orçamento dos órgãos negociados com Davi Alcolumbre:
Cade – R$ 55.042. 730
Anac – R$ 720.732.933
Anatel – R$ 593.652.324
ANA – R$409.490.606
TOTAL = R$ 1.778.918.593
Também estão em jogo, pelo menos:
Sudeco – R$ 199.172.922
Sudam – R$187.209.010
Sudene – R$ 76.767.813
Banco do Nordeste – R$ 144.379.728
Banco da Amazônia – R$ 64.740.828
Total negociado pela aprovação de Eduardo até o momento: R$ 2.451.188.894
______________________________________________________________
Ps.: Andreia Sadi, repórter da TV Globo, anunciou hoje em seu blog que as manobras no Cade já começaram a ser realizadas. Veja: https://g1.globo.com/politica/blog/andreia-sadi/post/2019/09/10/planalto-troca-nomes-no-cade-por-votos-a-eduardo-bolsonaro-para-embaixada-nos-eua.ghtml