Homem preso no caso Marielle tem fotos com Carlos e Jair Bolsonaro
A proximidade entre os envolvidos na execução da ex-veredora Marielle Franco e a família Bolsonaro nunca ficou tão escancarada
Felipe Betim, El País
Segundo o inquérito, Eliane buscou seu irmão, Bruno Figueiredo, para sumir com as armas do marido, guardadas em um apartamento da zona oeste do Rio de Janeiro. Na tarde do dia 13 de março deste ano, um dia depois da prisão de Lessa, Bruno foi ao local com Márcio Mantovano, o Márcio Gordo, que retirou do apartamento uma grande caixa com pertences, como mostram as imagens das câmeras de segurança. Um dia depois, Márcio encontrou Josinaldo Freitas — o Djaca — no estacionamento de um supermercado na Barra da Tijuca e entregou caixas, bolsas e malas.
As investigações concluíram que Djaca se dirigiu então até a colônia de pescadores do Quebra-Mar, na Barra, e alugou os serviços de um barqueiro. As caixas e bolsas continham armas de grosso calibre e peças de montagem de armas, segundo a investigação. Todo o material foi jogado por Djaca em alto mar. A defesa contesta o Ministério Público e assegura que dentro da caixa que Márcio Gordo foi flagrado carregando havia “tralhas”, e que fuzis não caberiam dentro dela.
Buscas foram realizadas no lugar do descarte em conjunto com o Corpo de Bombeiros e a Marinha, mas nada foi encontrado devido a grande profundidade e as águas turvas, segundo a polícia. Daniel Rosa, chefe da Delegacia de Homicídios da capital, acredita que entre o material o descartado possa estar a submetralhadora HK MP5 utilizada no assassinato de Marielle e Anderson. Ele explica que seis armas foram descartadas, entre elas um fuzil, além de carregadores, lunetas e bandoleiras.
As investigações começaram a partir de uma denúncia de que Lessa guardava suas armas de fogo no apartamento, localizado em Pechincha, na zona oeste da capital fluminense. As autoridades foram ao local um dia depois da prisão de Lessa, mas não encontrou quase nada dentro: apenas um torno e chaves usadas para montagem de armas de fogo. O Ministério Público acredita que o lugar era usado exclusivamente para guardar o armamento do PM reformado, uma vez que não havia móveis e objetos dentro.
Assim, os irmãos Elaine e Bruno Figueiredo, além de Márcio Gordo e Djacca, responderão pelo crime de obstrução de Justiça. A pena pode ir de três a oito anos de prisão. Por sua vez, Ronnie Lessa responderá por posse ilegal de arma de fogo de uso restrito, e pode pegar uma pena de três a seis anos de prisão. Além da prisão dos quatro, as autoridades cumpriram 27 mandados de busca e apreensão relacionados a eles e outras três pessoas — que não foram denunciadas nem presas. A defesa de Elaine e Ronnie Lessa se disse surpresa com a operação, enquanto que o advogado de Márcio Gordo disse que vai pedir a revogação da prisão preventiva assim que tiver acesso aos autos do processo.
Djaca, que é professor de artes marciais, postou em suas redes sociais fotos ao lado do presidente Jair Bolsonaro, na época ainda deputado federal, e outros políticos. A foto foi obtida pela revista Veja, que ainda imagens de Djaca ao lado dos vereador Carlos Bolsonaro e Marcelo Sicilliano. O inquérito não cita qualquer relação entre o suspeito e o presidente. Contudo, não é a primeira vez que a família presidencial se vê ligada ao caso Marielle.
Ronnie Lessa, acusado de ter apertado o gatilho, morava no mesmo condomínio de luxo dos Bolsonaro. Além disso, o mandatário também já apareceu em imagem postada no Facebook ao lado do ex-PM Élcio Queiroz, preso também em março sob a acusação de dirigir o carro de onde saíram os tiros que atingiram Marielle e Anderson.
Por fim, suspeita-se que o Escritório do Crime, um sofisticado grupo de extermínio que faz serviços para milicianos e contraventores, esteja envolvido no caso Marielle. Um de seus integrantes, o ex-PM Adriano Nóbrega, foragido desde janeiro, já foi homenageado por Flávio Bolsonaro quando estava preso por homicídio, em 2004, e possuía duas parentes lotadas no gabinete do então deputado estadual até o segundo semestre de 2018.
Uma lenta investigação
A operação desta quinta-feira, batizada de Submersus, ocorre duas semanas depois de a então procuradora-geral da República, Raquel Dodge, ter pedido ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) que as investigações fossem federalizadas e um novo inquérito fosse aberto para identificar os mandantes do crime —ainda não há decisão a respeito. Além disso, as suspeitas sobre quem é o mandante do crime recaíram sobre Domingos Brazão, conselheiro afastado do Tribunal de Contas do Rio de Janeiro e ex-líder do PMDB na Assembleia Legislativa do Estado. Brazão foi acusado de obstrução da Justiça, falsidade ideológica e favorecimento pessoal.
Dodge apresentou uma ação penal contra Brazão, acusando-o formalmente de obstrução da Justiça, falsidade ideológica e favorecimento pessoal. Além disso, pediu para que ele fosse investigado como mandante do assassinato em novo inquérito tocado pelo STJ. A denúncia teve como base as investigações feitas pela Polícia Federal, que apontou em seu relatório que o conselheiro é o “principal suspeito de ser o autor intelectual dos assassinatos” de Marielle e Anderson e traçou estratégias para afastar de si a linha de investigação. Brazão nega as acusações.
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Os acontecimentos das últimas semanas em torno do caso Marielle se dão meses depois das detenções de Ronnie Lessa — hoje preso penitenciária federal de Mossoró, no Rio Grande do Norte — e do ex-policial Élcio Queiroz, acusado de dirigir o carro de onde saíram os tiros que mataram Marielle e Anderson. Foi o ponto alto de uma investigação lenta e cheia de sobressaltos, marcada por falsas acusações. Um ano foi necessário para que a Polícia Civil chegasse aos principais suspeitos um ano depois do assassinato. Desde então cresceu a pressão para que se descubra os autores intelectuais do crime, algo que parece ainda estar longe de acontecer.