Ausência de cotas na USP é moralmente indefensável
A USP estimula a iniquidade. A falta de cotas raciais na principal universidade brasileira é moralmente indefensável
Paulo Nogueira, em seu blog
Estou aqui de queixo caído.
Não.
Me lembrei de que, segundo os grandes filósofos, perplexidade é atributo dos tolos. “Não se espante com nada”, escreveu Sêneca. “Porque tudo se repete o tempo todo.”
Coloquemos assim.
Me chamou a atenção, negativamente, a notícia que li hoje na Folha. As três faculdades mais concorridas da USP não têm sequer um calouro negro.
Vou repetir: nem um. Zero.
Estamos em 2013. Em que ano está a USP?
Não existem cotas raciais lá, em nome de uma distorção criminosa e cínica da palavra meritocracia.
Mérito estaria na obtenção das notas necessárias para entrar na USP, pura e simplesmente.
Ora, ora, ora.
Que mérito existe nisso tão intransponível assim quando você estuda em escolas caras e concorre com alunos que enfrentaram o ensino público e jamais tiveram dinheiro para comprar livros, recorrer a professores particulares, fazer cursinhos e trocar de computador regularmente?
O sistema da USP, na verdade, perpetua a iniquidade.
É a negação da meritocracia.
Vejo que o novo reitor tem falado a favor de cotas raciais, mas sem poder de influência. Vejo que o governador Alckmin também já manifestou apoio, igualmente sem influência.
Há uma força inercial terrível que congela as coisas na USP e impede a modernização do pensamento.
Quero ver quem está por trás da negação da meritocracia, e pesquiso.
Claro.
Vou dar em Demetrio Magnolli, uma das cabelas mais reacionárias do país – e por isso mesmo uma personagem com presença frequente na mídia brasileira.
Magnolli dá, sobretudo à mídia das Organizações Globo, um pretenso verniz acadêmico a teses primitivas que significam, essencialmente, a manutenção de privilégios.
É uma daquelas pessoas que, estivéssemos na década de 1780, estariam se batendo por Versalhes, e que seriam tomadas de estupor reprobatório quando caísse a Bastilha.
Nada, a não ser o conservadorismo petrificado, justifica que seja mantido na USP um sistema que beneficia minúscula uma fração da sociedade já suficientemente privilegiada.
É um tapa na cara de todos nós a ausência de um só calouro negro nas três faculdades mais concorridas da USP.