Primeiro morto por coronavírus no Brasil não estava sequer em lista de suspeitos
Primeira vítima do coronavírus não estava sequer na lista de casos suspeitos. Episódio evidencia fracasso no método como o governo brasileiro está contabilizando a pandemia
Tatiana Farah, BuzzFeed
A primeira morte por Covid-19 no Brasil é de um paciente que não estava sequer a lista de casos suspeitos da doença do governo. O homem de 62 anos morreu no hospital Santa Maggiore, do grupo Prevent Senior, em São Paulo, na segunda-feira (16).
Os órgãos de saúde só foram informados no dia seguinte, nesta terça-feira (17). Outros quatro óbitos no mesmo hospital estão sob suspeita de coronavírus, mas ainda não existe confirmação.
A Covid-19 não é de notificação compulsória, ou seja, os órgãos de saúde dependem da decisão dos hospitais privados de notificar ou não os casos da doença. Isso dificulta não só a contabilização da pandemia, como a identificação e o monitoramento das pessoas que tiveram contato com o infectado.
“Temos algumas áreas do setor privado de saúde que não estão notificando [as autoridades]. Este caso foi típico. Um caso agravado que não tinha sido notificado nem mesmo depois da morte”, disse o secretário municipal de Saúde de São Paulo, Edson Aparecido.
O secretário afirmou que a morte do paciente do Santa Maggiore surgiu como um “boato” na noite de ontem na prefeitura de São Paulo. A confirmação só pode ser feita na manhã de hoje.
Segundo Aparecido, a falta de notificação atrapalha o mapeamento dos casos da pandemia: “Diante de um caso notificado, faz-se a cadeia inteira dele. Com isso, foram [mapeadas] 8 mil pessoas, o que tem sido fundamental para a gente acompanhar o que precisa ser feito.”
Ao saber que havia outros quatro casos de morte suspeita no mesmo hospital, a prefeitura enviou fiscalização da vigilância sanitária e epidemiológica, mas descartou a contaminação do local.
Edson Aparecido confirmou que o protocolo do Ministério da Saúde não estabeleceu a notificação compulsória para o Covid-19. A notificação só é obrigatória quando o paciente chega à Síndrome Respiratória Aguda Grave, uma condição mais grave que pode atingir 20% dos doentes com coronavírus.
Coordenador do centro de contingenciamento do coronavírus no estado de São Paulo, o epidemiologista David Uip confirmou que o óbito registrado é de um paciente que estava fora da lista de doentes. “A confirmação do vírus só foi ontem à noite. Pelo que nos passaram, foi isso”, disse o médico em entrevista coletiva.
Brasil na contramão
A Organização Mundial da Saúde (OMS) informou nesta segunda-feira (16) que a realização de testes em larga escala em casos suspeitos do coronavírus e o isolamento dos doentes são a fórmula para se conter a pandemia.
“A mensagem central é: testar, testar e testar”, afirmou a médica Maria Van Kerkhove, do programa de emergência sanitária da entidade, durante uma entrevista coletiva.
“Você não consegue parar essa pandemia se não souber quem está infectado”. A mensagem vai na contramão de tudo o que o Governo Bolsonaro vinha adotando até o momento, de testar somente os casos mais graves e com necessidade de internação.
Testes em massa foram realizados por países que conseguiram controlar a pandemia. É o caso da Coreia do Sul, que, desde o primeiro momento da doença no país, adotou um agressivo plano para fazer exames que identificassem o SARS-CoV-2 (nome do vírus que causa a doença Covid-19).
Por isso, realizou testes não somente em quem apresentava os sintomas da doença, como também em qualquer pessoa que tivesse tido contato direto com algum caso confirmado.
O Governo sul-coreano também passou a ir até a casa dos pacientes possivelmente infectados para tentar barrar o contágio aos demais. Assim, realiza mais de 15.000 testes por dia.
Além dessa experiência no país asiático, uma pesquisa realizada por cientistas chineses e norte-americanos apontou que os infectados não detectados aceleraram a explosão dos casos da doença na China. Por meio de um modelo matemático, os cientistas conseguiram mostrar que a maioria dos contágios na China foi realizada por doentes não detectados.
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