Redação Pragmatismo
Saúde 01/Mai/2020 às 12:49 COMENTÁRIOS
Saúde

Médico contaminado com coronavírus relata hostilidade dos vizinhos em SP

Publicado em 01 Mai, 2020 às 12h49

Acostumado a aplausos por atuar na linha de frente da pandemia, jovem médico diagnosticado com coronavírus relata hostilidade dos vizinhos em São Paulo. Mesmo debilitado, o profissional precisou lidar com ligações anônimas intimidatórias

Jonatas (imagem/divulgação)

O médico Jonatas Villa, de 26 anos, atuava na linha de frente do combate ao coronavírus em São Paulo, mas acabou infectado durante o trabalho.

No final de março, o jovem precisou se isolar no apartamento onde mora sozinho, na Vila Clementino, Zona Sul de São Paulo. Ao invés de solidariedade, ele tem recebido intimidações.

“Quando soube que estava com a doença, procurei o síndico do prédio para avisar sobre o meu quadro e pedir apoio para que os porteiros recebessem as minhas compras e deixassem na minha porta, para que eu não precisasse usar o elevador e as áreas comuns do edifício”, conta.

“Ele [o síndico] colocou um comunicado no elevador alertando os demais sobre um morador que tinha sido positivado e, dois ou três dias depois, as ligações anônimas pelo interfone começaram no meu apartamento”, afirma Villa.

Segundo o médico, os vizinhos não ligavam para prestar solidariedade, mas para fazer críticas contra ele e pedir que o rapaz se mudasse do edifício para não contaminar os demais moradores.

“Eu fiquei chocado, porque foi no período em que eu estava mais debilitado. Sentia muitas dores pelo corpo, perdi o olfato, mas tinha que ficar argumentando no interfone sobre a falta de conhecimento das pessoas a respeito da doença”, lembra o médico.

Apesar de não ter tido complicações sérias de saúde em virtude do coronavírus, o médico paulista disse que viveu tempos de pesadelo durante os 16 dias em que ficou isolado em casa, esperando o ciclo completo da doença.

“Foram momentos de terror, porque eu pensava que, se meu quadro piorasse e eu precisasse sair de casa, corria o risco de encontrar alguém nos corredores ou na garagem que iria me hostilizar ou me agredir. Eu não tinha ninguém para me ajudar, já que a minha família vive em Americana e a minha namorada também é médica e não podia correr o risco de se infectar comigo e ter que desfalcar o plantão num período tão difícil para todo mundo. Tive que enfrentar os dias de isolamento sozinho, temendo pela minha saúde, sem ajuda de ninguém”, lembra.

Os sintomas

“No início achei que eu estava com dengue, por causa das dores tão fortes pelo corpo. A sorte é que o hospital onde trabalho está lidando com muita competência em relação a isso. Eles me afastaram no primeiro dia que comecei com as reações e já fizeram os testes para coronavírus. Os médicos que trabalham comigo me acompanharam durante todo o período por telefone ou pela internet e todos ficaram chocados quando falava sobre as ligações anônimas que recebia”, relata Villa.

“Pela voz de uma das pessoas que me ligou, percebi que era uma senhora idosa. Tentei explicar pra ela que o coronavírus pode ser controlado com cuidados de higiene, uso de material de proteção, máscara, enfim. Apesar das hostilidades, os porteiros foram muito parceiros e pessoas incríveis. Nós estabelecemos um código para eu não precisar atender o interfone. Se chegasse alguma comida ou remédio, eles ligavam e tocavam duas vezes, desligando o interfone. Eu retornava em seguida e eles subiam com as compras”, conta o médico.

Apesar do susto, o médico já está bem e voltou à linha de frente, atendendo pacientes com síndrome respiratória grave no hospital Santa Paula, na Zona Sul de São Paulo. “A gente sabe que o momento é difícil. Mas é agora que a gente precisa mostrar solidariedade real às pessoas. Na hora que precisei, contudo, não tive essa solidariedade, que precisa ser genuína. Sem se recolher em casa e sem se colocar no lugar do outro, a gente não vai aprender nada com essa pandemia”, desabafa.

Siga-nos no InstagramTwitter | Facebook

Recomendações

COMENTÁRIOS