Padre é preso após assaltar três estabelecimentos comerciais no RS
Querido pela comunidade e com conduta que não levantava suspeitas, padre católico realizou três assaltos no mesmo dia em Passo Fundo (RS)
Poucos dias antes de completar seu 18º mês de ordenação, o padre de Tapejara Elizeu Lisboa Moreira, 27 anos, surpreendeu a comunidade do norte do Rio Grande do Sul ao cometer três assaltos em sequência em Passo Fundo na tarde da última terça-feira (2). O arrastão aconteceu no intervalo de uma hora, entre 17h e 18h.
O sacerdote usou uma arma de brinquedo para levar mercadorias e dinheiro de um supermercado do bairro Lucas Araújo, em uma farmácia do bairro São Cristóvão e em outro supermercado no bairro Petrópolis — o último fica em frente à Delegacia de Pronto Atendimento de Passo Fundo (DPPA).
Ele foi capturado por volta das 20h em uma abordagem da Brigada Militar (BM) no centro da cidade quando estava a bordo de um Hyundai ix35 que pertence a Arquidiocese de Passo Fundo. Em seguida, foi reconhecido pelas vítimas dos três estabelecimentos.
De boné vermelho, máscara branca, camiseta azul, jeans e tênis chegava aos locais, comprava itens, ia até o caixa, pagava em dinheiro e quando a operadora se preparava para dar o troco, tirava a arma da cintura e pedia o que estava no caixa.
Os assaltos foram registrados por câmeras de segurança. Agiu da mesma forma nos dois supermercados e na farmácia. Roubou R$ 1,4 mil e foi preso com R$ 655. O destino do restante do valor ainda é um mistério, segundo o delegado Diogo Ferreira:
“Não sabemos se ele tinha alguma dívida ou comprou algo”.
A BM localizou o veículo pelas câmeras da cidade. Ao revistarem, viram que tinha carteira de identificação de padre e que o veículo estava em nome da arquidiocese.
A prisão preventiva foi decretada pela Justiça na tarde desta quarta-feira (3). O padre, que não tem antecedentes, seguirá no presídio de Passo Fundo. Também foi solicitada a quebra de sigilo do telefone, para que os investigadores possam averiguar seu envolvimento em outros delitos. No entanto, é aguardada a manifestação do Ministério Público a respeito do pedido.
O veículo da arquidiocese está apreendido no depósito do Detran. Em depoimento, o padre disse apenas que os crimes foram cometidos em um momento de loucura.
“Foi a única frase que ele disse. Estava totalmente calmo, parecia que não tinha caído a ficha do que ele fez e que estava no mundo da lua. A arma de brinquedo que ele usou não deve pesar 10 gramas, é de plástico e oca. Um fato sem explicação”, diz o delegado.
Responsável pela defesa do sacerdote, a advogada criminalista Maura da Silva Leitzke conversou com o padre no final da manhã desta quarta-feira. Segundo ela, Elizeu está em tratamento psiquiátrico e, há três semanas, deixou de tomar, por conta própria, remédios de uso contínuo. Maura fará o pedido de relaxamento da prisão.
“As pessoas que convivem com ele relataram que nos últimos dias estava mais quieto e arredio”, diz a defensora.
Nesta terça-feira, o padre foi a Passo Fundo celebrar a missa de falecimento da irmã de um amigo. Ao final da celebração, segundo a defensora, ele teria comprado a arma de brinquedo em uma loja e praticado os assaltos.
Leia também: Padre celebridade é acusado de se apropriar de R$ 60 milhões doados por fiéis
“Ele disse que efetivamente só se deu conta do que fez hoje pela manhã, tanto que ele me pediu para pedir desculpa as vítimas. Ele não tinha noção do que estava fazendo tanto que usou o carro da mitra. Está muito fragilizado. Ele não representa qualquer perigo à ordem pública. Vai ficar muito melhor em um local onde possa ter tratamento médico”.
“O mais chocado de todos sou eu”, afirma arcebispo
Natural da pequeno município de Ciríaco, o padre Elizeu é o caçula de cinco filhos. Vindo de uma família evangélica, optou por seguir carreira na Igreja Católica quando, no final do Ensino Fundamental, conheceu o Seminário Nossa Senhora Aparecida, em Passo Fundo. Ao concluir o Ensino Médio, deixou a cidade natal e passou a estudar para ser padre. Foi ordenado em 9 agosto de 2019 pelo arcebispo dom Rodolfo Luís Weber.
A celebração, transmitida à época em vídeo pelas redes sociais, lotou a paróquia Santa Terezinha, em Ciríaco, com padres, seminaristas, amigos e familiares. Já como padre, assumiu a paróquia São Judas Tadeu, em Passo Fundo, e atualmente atuava nas igrejas de Tapejara e Vila Lângaro.
A partir de agora, a curta carreira religiosa do padre Elizeu ficará prejudicada. A arquidiocese de Passo Fundo irá afastá-lo provisoriamente de suas funções. Internamente, o trâmite é denominado ato de cautela, usado para esclarecer os fatos e dar oportunidade para que o sacerdote apresente sua defesa e manifeste seus argumentos.
“O mais chocado de todos sou eu, que acompanho a formação desses jovens. Ele era recém-ordenado, uma pessoa que estava indo bem nos seus trabalhos. E de uma hora para outra acontece um fato desses. É chocante. É triste. É muito sofrido”, afirma o arcebispo.
O líder religioso afirma que, assim que tiver oportunidade, quer conversar pessoalmente com o padre para ouvir dele a versão do que aconteceu:
“Quero saber como chegou a isso, qual a justificativa. Se é que tem justificativa. O fato é grave mas todo ser humano tem direito a defesa. Tenho 30 anos como padre e 12 como bispo, não lembro de outro fato nessas condições”.
Conforme o relato do arcebispo, nada no comportamento do padre Elizeu até esta terça-feira indicava que ele pudesse ter uma atitude criminosa. Tinha uma rotina discreta, morava na paróquia junto com outro padre e era bem aceito pela comunidade.
“Ele atendia dois municípios que estão tão chocados como eu. Chama atenção não ter motivo nenhum pra fazer isso, nunca deu sinais. Era muito benquisto. É injusto nesse momento levantar hipóteses ou especulações sobre o que levou ele a fazer isso”, afirma.
Jeniffer Gularte, Gauchazh