Redação Pragmatismo
Mulheres violadas 13/Mai/2021 às 16:16 COMENTÁRIOS
Mulheres violadas

Defensor agrediu advogada para tentar provar inocência de Manvailer

Publicado em 13 Mai, 2021 às 16h16

VÍDEO: Demonstração bestial ocorreu no último dia do julgamento do feminicídio de Tatiane Spitzner

advogado agride tribunal juri

com Ponte Jornalismo

No último dia do julgamento do feminicídio da advogada Tatiane Spitzner, a defesa de Luis Felipe Manvailer decidiu fazer uma demonstração das agressões que ele praticou contra a vítima. Usando a própria colega, o advogado Claudio Dalledone Junior apertou com força o pescoço da advogada Maria Eduarda Lacerda, chacoalhando-a. Depois, simula um enforcamento e repete o movimento no pescoço, cuja força a faz cair no chão.

Manvailer foi condenado em primeira instância a 31 anos, nove meses e 18 dias de prisão por homicídio qualificado, com a qualificação de feminicídio, além de fraude processual por ter agredido e jogado a esposa do quarto andar do prédio onde moravam, em Guarapuava (PR), e deve indenizar a família da vítima em R$ 100 mil. O caso aconteceu em 2018 e a condenação se deu por quatro votos contra três de um júri formado por sete homens. Cabe recurso à decisão.

Na gravação, Claudio alega que Tatiane não morreu por causa das agressões e sim pela queda e que, por isso, o crime não poderia ser configurado como feminicídio.

Para a presidente da Comissão da Mulher Advogada da OAB-SP (Ordem dos Advogados do Brasil) e especialista em gênero Claudia Patricia de Luna Silva, a violência empregada pela defesa de Manvailer foi considerada um “show de horrores” em uma situação em que a violência contra a mulher já era objeto do julgamento.

“Não se fazia necessário ao argumento do advogado uma espetacularização e a promoção de uma violência contra uma outra mulher para que se fosse realizada a defesa do acusado”, critica. “A gente observa que aquela encenação foi tão violenta ao ponto de deixar marcas no pescoço da colega. Aquilo foi um show de horrores”, prossegue.

Na avaliação de Claudia Luna, a simulação naturaliza e legitima a violência. “Talvez ela, pelo próprio contexto de machismo, não se reconheça vítima de uma situação de violência. Nessa sociedade cujo sistema é o patriarcado existem mulheres que não se percebem numa situação de opressão, de dominação”, explica.

De acordo com ela, uma reconstituição do crime se faz na fase de inquérito, mas se o advogado queria realizar algum tipo de simulação, poderia buscar meios que não causassem desrespeito à colega ou à memória da vítima. “Essa postura foge ao bom senso, beira à violação ética e, sobretudo, se caracteriza como um verdadeiro desrespeito à mulher que ali estava. Enquanto profissional, precisamos ficar atentos quanto aos nossos limites éticos da atuação de forma que a gente não naturalize esses comportamentos machistas”, pontua.

“A agressão à colega significou uma agressão a todas nós mulheres na sociedade como todo e como advogadas”, critica Claudia Luna.

SENTENÇA

Na decisão que condenou Manvailer, o juiz Adriano Scussiato Eyng destacou “a brutalidade e a covardia da conduta criminosa”, além da frieza de Manvailer durante todo o crime, desde as agressões até a retirada do corpo da esposa da calçada.

O magistrado também citou a Lei Maria da Penha, relembrando o caso da cearense e a “omissão do Estado”, e discorreu sobre violência de gênero.

Scussiato apontou que Manvailer “aproveitou da situação de grande vulnerabilidade emocional e psicológica” de Tatiane que, “de há muito tempo, vinha sofrendo com as atitudes agressivas e de menosprezo do condenado”.

Na sentença, o juiz cita também o histórico de buscas encontrado, em perícia, no computador de Tatiane. O documento aponta que desde 2017 a vítima buscava páginas na internet “sobre términos de relacionamento amoroso e acerca de atitudes grosseiras e abusivas do parceiro”. Em uma da buscas, Tatiane usa os termos “marido agressão verbal”.

O juiz aponta que “mulheres que sofrem violência não falam sobre o problema por um misto de sentimentos: vergonha, medo, constrangimento” e que “os agressores, por sua vez, não raro, constroem uma autoimagem de parceiros perfeitos e bons pais, dificultando a revelação da violência pela mulher” e que, por isso, “é inaceitável a ideia de que a mulher permanece na relação violenta por gostar de apanhar.”

Manvailer foi condenado por homicídio com as qualificadoras de feminicídio, motivo fútil, meio cruel e uso de asfixia. Ele também cumprirá pena por fraude processual.

O condenado também não terá o direito de recorrer em liberdade, tendo a prisão preventiva mantida pelo magistrado. Ele está preso na Penitenciária Industrial de Guarapuava (PIG) há dois anos e nove meses.

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