Redação Pragmatismo
Saúde 11/Out/2021 às 15:15 COMENTÁRIOS
Saúde

Unesco diz que denúncia sobre proxalutamida é das mais graves da história

Publicado em 11 Out, 2021 às 15h15

Teste com medicamento em pessoas com Covid-19 teve pelo menos 200 mortes confirmadas no Amazonas. O presidente Jair Bolsonaro já defendeu publicamente o uso da substância na pandemia

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Imagem: Pilar Olivares | Reuters

A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) afirmou que o estudo brasileiro sobre a proxalutamida que teve 200 mortes pode ser um dos “episódios mais graves de infração à ética em pesquisa e violação dos direitos humanos dos participantes da história da América Latina”.

A denúncia inclui graves violações dos padrões éticos de pesquisa em que os direitos dos sujeitos foram violados nas diversas etapas do estudo, bem como do sistema de revisão ética”, destacou o Rede Latino-americana e Caribenha de Bioética (Redbioética-Unesco).

O órgão publicou, nesse sábado (9), uma nota sobre a denúncia feita pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (Conep) sobre o estudo e um documento com o parecer dos pesquisadores. A proxalutamida ficou conhecida como a “nova cloroquina” e passou a ser evidenciada nos últimos meses pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e por seus apoiadores como tratamento da Covid-19.

Além das infrações no processo de pesquisa com os pacientes, os pesquisadores apontam que foram violadas normas do sistema ético, promovidas pela Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos, Declaração de Helsinque e as pautas do The Council for International Organizations of Medical Sciences (CIOMS).

Os pesquisadores da Unesco ainda criticaram a ocultação de informação sobre os locais, número de participantes, entre outros, e reforçam que mudanças de protocolo deveriam ser aprovadas pelo órgão regulador local, no caso, pela Comissão Nacional de Ética do Conselho Nacional de Saúde (Conep).

No documento é condenado o fato das equipes não terem apresentado uma análise crítica da pesquisa, apesar do crescente número de mortos, e terem optado por continuar com a implementação dos estudos. E ainda considera grave a ocultação da existência de comitês de pesquisadores independentes e que trabalhavam diretamente com os patrocinadores – o que constituiria conflito de interesses.

“É urgente que, se comprovadas as irregularidades, sejam investigados e responsabilizados ética e legalmente todos os envolvidos, incluindo equipes de pesquisa, bem como instituições responsáveis e patrocinadores, nacionais e estrangeiros”, diz o texto.
Os pesquisadores da Unesco ainda pedem que a denúncia seja difundida e acompanhada pela comunidade internacional e os meios de comunicação.

O estudo foi feito no Amazonas e hoje é investigado pelo Ministério Público Federal (MPF). A Comissão Nacional de Ética em Pesquisa pediu que a Procuradoria-Geral da República (PGR) investigasse o caso. Houve cerca de 200 mortes durante a pesquisa.

É ética e legalmente reprovável […] que os pesquisadores ocultem e alterem indevidamente informações sobre centros de pesquisa, participantes, número de voluntários e critérios de inclusão, pacientes falecidos, entre outros. Qualquer alteração em um protocolo de pesquisa deve ser aprovada pelo sistema de ética em pesquisa local”, assinalou a Unesco.

O estudo foi conduzido pelo endocrinologista Flávio Cadegiani. A comissão aponta o risco de voluntários terem morrido desnecessariamente devido ao estudo. A pesquisa foi iniciada em fevereiro deste ano.

Leia a íntegra da nota:

POSSÍVEL INFRACÇÃO ÉTICA GRAVE NO BRASIL

A Rede Latino-Americana e Caribenha de Bioética da Unesco (Redbioética Unesco) considera importante informar e expressar sua profunda preocupação sobre os fatos denunciados pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa com Seres Humanos do Brasil (Conep), que encaminhou ao Ministério Público brasileiro um pedido solicitando a investigação de irregularidades na condução de estudos clínicos e a morte de 200 pessoas no âmbito de investigações clínicas em que ocorreram violações éticas supostamente graves, bem como uma potencial violação à Internacional Lei dos direitos humanos.

A denúncia foi protocolada em 3 de setembro de 2021 pelo Conselho Nacional de Saúde do Brasil (CNS) em conjunto com a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP) e encaminhada ao Ministério Público da República do Brasil por meio do Ofício nº 829/2021 CONEP / SECNS / MS (Ofício nº 829/2021 / CONEP / SECNS / MS. (Índices de referência de irregularidades na condução do estudo de protocolo CAAE 41909121.0.0000.5553, sob o título “The Proxa-Rescue AndroCoV Trial” 1 (veja você pode acessar o texto completo no final 2).

Consideramos que este poderia ser um dos episódios mais graves e sérios de infração à ética em pesquisa e violação dos direitos humanos dos participantes da história da América Latina, envolvendo a morte suspeita de 200 pessoas, portanto é imprescindível que este tipo do evento ser investigado em profundidade.

A denúncia inclui graves violações dos padrões éticos de pesquisa em que os direitos dos sujeitos foram violados nas diversas etapas do estudo, bem como do sistema de revisão ética, ações que seriam contrárias ao marco regulatório estabelecido na Declaração Universal de Bioética e Direitos Humanos 2005, a Declaração de Helsinque e as Diretrizes do CIOMS 2016.

É ética e legalmente reprovável, conforme especificado no gabinete da Conep, que os pesquisadores ocultem e alterem indevidamente informações sobre centros de pesquisa, participantes, número de voluntários e critérios de inclusão, pacientes falecidos, entre outros. Qualquer alteração em um protocolo de pesquisa deve ser aprovada pelo sistema de ética em pesquisa local.

Quanto à denúncia, seria igualmente condenável se os pesquisadores, apesar de terem conhecimento dos óbitos sucessivos, não tivessem apresentado uma análise crítica dos mesmos, bem como dos eventos adversos graves e optassem por continuar com o recrutamento e a execução dos estudos.

Também é considerado gravíssimo, conforme mencionado no texto, que se tenha ocultado a formação de comitês científicos independentes e, muito mais, que estes sejam coordenados por pessoas vinculadas aos patrocinadores, pois isso constituiria um claro conflito de interesses.

É urgente que, se forem comprovadas irregularidades, não só eticamente mas também legalmente responsáveis ​​sejam apuradas e responsabilizadas por todos os atores, incluindo equipas de investigação, bem como instituições e patrocinadores responsáveis, nacionais e estrangeiros.

A Rede de Bioética da Unesco considera que as comunidades nacional e internacional devem se unir para acompanhar, divulgar e acompanhar esta denúncia que envolveria grave violação dos direitos dos sujeitos da pesquisa, bem como inúmeras irregularidades nos procedimentos de avaliação e implementação ética dos estudos de acordo com o atual quadro ético normativo internacional. Da mesma forma, como estabelece a denúncia, é imprescindível e urgente identificar as causas das mortes ocorridas no decorrer dos estudos. É inaceitável que esses tipos de eventos, se comprovados, estejam ocorrendo no ano de 2021.

Nenhuma emergência sanitária, ou contexto político ou econômico, justifica fatos como aqueles que, segundo o que foi divulgado e atento ao que foi denunciado, teriam ocorrido no Brasil.

Por esse motivo, acreditamos que o maior interesse deve ser colocado no acompanhamento desta pesquisa, dando suporte ao sistema de revisão ética brasileiro e, principalmente, aos participantes da pesquisa brasileira, bem como aos familiares dos falecidos. no contexto dessas irregularidades e infrações condenáveis”.

Leia aqui a íntegra da nota, em espanhol.

Com Metrópoles e G1

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