Vai sobrar pouco de Sergio Moro
Sergio Moro deve estar carregando nas costas um fardo de arrependimentos. Não deveria ter aceito o convite para ser ministro de Bolsonaro, mesmo que sua participação no governo fosse parte da compensação pelo esquema montado para encarcerar Lula
Moisés Mendes*, em seu blog
O que irá sobrar de Sergio Moro, depois da completa desintegração da sua imagem, talvez seja um advogado alquebrado. Não teremos quase mais nada do ex-juiz, ex-ministro da Justiça, ex-quase ministro do Supremo, ex-consultor da Alvarez & Marsal e ex-candidato a candidato a presidente.
Sergio Moro deve estar carregando nas costas um fardo de arrependimentos. Não deveria ter aceito o convite para ser ministro de Bolsonaro, mesmo que sua participação no governo fosse parte da compensação pelo esquema montado para encarcerar Lula.
Não deveria ter saído do governo, depois de fracassar como protetor dos filhos de Bolsonaro, para assumir a função de garoto-propaganda da consultoria.
Não deveria ter aceito como natural a candidatura a presidente, não sabendo nada da política que ele mesmo desqualificou por mais de cinco anos. É complicada a situação do ex-juiz suspeito.
Bolsonaro levou Moro para o governo porque ele e o ex-juiz não têm escrúpulos ou receios. Mas a consultoria deveria ter procurado Sergio Moro? Estava tudo acertado?
Que empáfia é essa da empresa americana que a levou a correr um risco gigantesco, ao atrair Moro logo depois de ter saído do esquema de Bolsonaro? Por que não esperou um pouco?
Há agora uma determinação do ministro Bruno Dantas, do Tribunal de Contas da União (TCU), para que a Alvarez & Marsal informe o que pagou a Moro, que deixou a empresa em outubro.
Dantas quer um levantamento dos processos de recuperação judicial em que a consultoria atuou no tempo da Lava-Jato, e em ordem cronológica, para saber o que há de conexão entre o lavajatismo e os negócios do grupo.
Moro deveria mesmo ter ido trabalhar para a empresa agora cercada pelo TCU? A soberba era tanta que, para os americanos, haveria sempre vantagem no fato de que o xerife do moralismo seria mostrado no seu portfólio como craque do primeiro time.
Por que Moro foi trabalhar descaradamente para a Alvarez & Marsal, expondo uma relação suspeita que pode configurar crime grave?
É muito difícil arranjar explicação. Não há casualidade no fato de que Moro quebrou empresas que a consultoria agora ajuda a salvar, e a Odebrecht é a principal delas.
Num mundo normal, Moro não poderia ter topado essa sequência de negócios com Bolsonaro e com a consultoria. Mas não há mais mundo normal.
O ex-juiz achou que com ele não aconteceria nada. Mas vai acontecer. A Lava-Jato já foi triturada pelo Supremo. Ele também será pulverizado por suas atitudes na Lava-Jato e pelas barbeiragens cometidas depois.
O ex-juiz tem um déficit de inteligência grave, ou não cometeria tantos erros. Os desastres comprovam que Moro e Deltan Dallagnol não eram os melhores para fazer o que fizeram.
Eles eram os mais aptos. Fizeram o que outros servidores do Ministério Público e do Judiciário se negariam a fazer por respeito ao certo e à ética.
Os dois foram os mais aptos para avançar sem freios, pisotear leis, normas e regras e seguir sempre em frente, fazendo o jogo da direita sem temer nada e ninguém.
Sergio Moro é talvez a mais perfeita aberração do Judiciário brasileiro, porque evoluiu como aberração sob os aplausos dos que deveriam rejeitá-lo como herói. Está aí, quase abandonado pela própria direita, sem votos, sem perspectivas e sem turma fixa.
A turma do Podemos é temporária e só o acolheu por achar que ele teria alguma utilidade. Como já é certo que não terá utilidade alguma, Moro é candidato a ser ex-candidato a presidente. Depois, será o quê?
Abaixo, um vídeo em que fica evidente que a cara de Moro, tensionada, com cenho franzido, não está boa e que ele se preocupa muito mais com o timbre da voz do que o com o que está dizendo. Moro está vacilante porque está assustado.
Minha pré-candidatura é à Presidência da República. O resto é boato de quem está com medo dela. pic.twitter.com/dtiNcJA7DK
— Sergio Moro (@SF_Moro) January 17, 2022
*Moisés Mendes é jornalista em Porto Alegre. Foi colunista e editor especial de Zero Hora. Escreve também para os jornais Extra Classe, Jornalistas pela Democracia e Brasil 247. É autor do livro de crônicas ‘Todos querem ser Mujica’ (Editora Diadorim).