Episódio racista como o que sofreu Seu Jorge no RS já foi retratado no filme Green Book
"Os negros que estavam no jantar eram apenas os funcionários, e eles foram proibidos de olhar para mim ou falar comigo", disse. "Quando ele saiu do palco começaram os sons de macaco, 'negro vagabundo' e as pessoas gritando 'mito, mito'". Quem ouviu o relato de Seu Jorge e já assistiu 'Green Book' (vencedor do Oscar) vai fazer essa associação imediata. A diferença é que a história retratada no filme aconteceu há exatamente 60 anos, em 1962, o que torna o episódio envolvendo o artista brasileiro ainda mais chocante. Não evoluímos nada?
“Os negros que estavam no jantar eram apenas os funcionários, e eles foram proibidos de olhar para mim ou falar comigo. Houve muito ódio gratuito e grosseria racista”.
O relato acima é de Seu Jorge, artista brasileiro de renome internacional. O cantor foi vítima de racismo na última semana enquanto fazia uma apresentação na cidade de Porto Alegre (RS).
Quem ouviu o depoimento do músico brasileiro e já assistiu ao filme ‘Green Book’ vai fazer uma associação entre a vida e a arte. A diferença é que a história retratada no filme aconteceu há exatamente 60 anos, em 1962, o que torna o episódio envolvendo Seu Jorge ainda mais grave.
Em uma cena do filme ‘Green Book’, o pianista negro Don Shirley é proibido de jantar no mesmo clube em que seu público estava. Os convidados eram todos brancos e os únicos negros eram ele e os funcionários. Na realidade dos anos sessenta nos EUA, havia racismo explícito e declarado na região Sul daquele país.
Seu Jorge divulgou um vídeo de 9 minutos em que fala sobre as ofensas racistas que sofreu. “O que eu presenciei foi muito ódio gratuito e muita grosseria racista”.
O cantor foi contratado para se apresentar no clube Grêmio Náutico União na reinauguração do Salão União, que passou por reformas este ano. Seu Jorge relatou que não viu pessoas negras entre as convidadas do evento, apenas entre funcionários do clube.
“Particularmente, não vi nenhuma pessoa negra no jantar. E as pessoas negras que eu encontrei foram somente os funcionários que, uma coisa que me causou muita espécie, eu ouvi dizer que eles estavam proibidos de olhar pra mim ou falar comigo quando eu chegasse no local do show”, falou.
O crime ocorreu quando o cantor e a banda saíram do palco e retornariam para o bis. “Começaram a gritar ‘mais um, mais um’, mas, logo em seguida, alguns sons de ‘uh, uh’. Primeiro, eu pensei que estavam vaiando. E já parecia estranho pra mim uma pessoa num show começar a vaiar. Depois, eu vi que eram movimentos de macaco. Cheguei a ouvir ‘negro vagabundo, vagabundo’ e, depois, pessoas gritando ‘mito, mito'”, relatou uma testemunha.
“Ele [Seu Jorge] não fez nada de diferente, já fui em alguns shows dele. Ele declamou uma música do Racionais MC, que chama ‘nego drama’, fazendo alusão à questão racial. Em um determinado momento, chamou um menino que toca cavaquinho, apresentou ele, disse que tinha 15 anos, falou que era um talento e, nesse momento, falou sobre a maioridade penal, quis dizer que a questão não é prender mais cedo ou mais tarde, e sim dar condições para esses jovens”, relatou.
A testemunha disse que o momento foi incrível e que muitos aplaudiram. Em seguida, aconteceu o episódio de racismo. Com a manifestação, o cantor voltou ao palco apenas para agradecer e falou sobre amor. “Ele disse ‘espero que vocês fiquem bem.’ Nesse momento, foi pior, as pessoas gritaram, vaiaram”.
A delegada Andréa Mattos, titular da Delegacia de Polícia de Combate à Intolerância, confirmou que instaurou inquérito policial pelo crime de racismo, que independe de representação por parte da vítima.
“A polícia decidiu fazer isso em virtude das inúmeras denúncias que estão chegando até nós e claro, de tudo que está nas redes sociais. Óbvio que só com desenrolar das investigações, nós teremos confirmação de que houve o delito de racismo e não de injúria”, afirmou.
Green Book
Vencedor do Oscar de Melhor Filme em 2019, Green Book conta a história real da amizade inesperada entre o pianista Don Shirley e seu motorista Tony Lip, num contexto norte-americano extremamente racista dos anos sessenta.
Don Shirley é um pianista negro brilhante que deseja fazer uma tour no sul dos Estados Unidos, uma região marcada pelo atraso, pelo preconceito e pela violência racial. Para acompanhá-lo durante esses dois meses de shows ele resolve ir a procura de um motorista/assistente.
Trailer legendado: