E se Deus estiver nos testando?
Pois Deus resolveu simplificar. Pode se dar esse direito, já que criou as praias nordestinas, os Andes e as mulheres com sorriso de covinha
Delmar Bertuol*, Pragmatismo Político
É só uma tese metafísica, platônica, talvez. Mas, dadas as circunstâncias, é muito verossímil.
Já surgiram várias teorias de fim do mundo. Pela minha idade, eu as acompanho, com o ceticismo que me é peculiar, desde o “Bug do Milênio”, em 2000. Aí, entre outras, em 2012, segundo o calendário maia, deveríamos ter deixado de existir. Depois, outras surgiram ou foram reinterpretadas de povos antigos ou de eventos astrofísicos.
Como disse, eu tendo a não acreditar nessas ideias, mas confesso que teríamos chegado ao limiar com a criação do sapatênis. Eu sei que os deuses, sejam eles quais forem, Único ou com concorrência, são misericordiosos. Mas o mau gosto tem limite. Fato é que passamos pelo sapatênis, as SUVs compactas e as “estátuas da liberdade” da Havan e nada de apocalíptico aconteceu. Mas… será mesmo?
Pode ser que desde 31 de dezembro de 99 estejamos todos falecidos e, numa teimosia coletiva e inconsciente, não aceitamos a morte e continuamos a imaginar que estamos vivos. E nesse simulacro, projetamos a vida, inclusive nos reproduzindo e “morrendo na morte”.
Deus acabou com o mundo, mas deixou nos enganarmos por piedade, que Deus é piedoso.
Mas agora Ele tá cansado. Não quer mais brincar de mundo. Não aguenta mais ouvir as preces de requerimento, sendo que essas orações sequer existem de fato, é tudo obra da nossa imaginação. Isso deve mesmo cansá-Lo.
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Por isso, Deus vai terminar o mundo de novo. Quer dizer, vai acabar com a nossa imaginação resistente. E eis que finalmente vai ser a hora do Juízo Final.
Só que, eu já disse, Ele tá cansado. Nessa sobrevida falsa que ele nos permitiu achar que tínhamos, Lhe solicitamos como nunca. Até quando mandou Seu filho de maior confiança para nos salvar, a gente o crucificou e lhe atiramos pedra. Hoje, ainda distorcemos tudo o que ele ensinou.
↗ “Deus, Pátria, Família!”: Esse slogan é uma blasfêmia
Diante de tamanha estafa, que já dura décadas, séculos ou apenas alguns anos, quem sabe?, Deus resolveu simplificar. Não vai puxar a ficha de cada um dos seus filhos. A papelada ficaria ainda mais extensa se for mesmo verdade que existe reencarnação. Aí teria Ele que comparar as vidas pregressas para efeitos de agravamento ou atenuação do veredicto.
Pois Deus resolveu simplificar. Pode se dar esse direito, já que criou as praias nordestinas, os Andes e as mulheres com sorriso de covinha.
Pra não ter muito trabalho (eita que o “Homem” tá cansado mesmo), vai fazer por partes. Resolveu iniciar pelo Brasil, sabe-se lá porquê.
No Brasil, em que beneficiou com a floresta amazônica, com um litoral belo e vasto e com a cachaça mineira, agora Deus lança o amor e o ódio. E cabe a cada um resolver seu lado.
Claro, o ódio não vai se apresentar explicitamente como tal. O ódio é ardiloso. É o Coisa Ruim quem lhe está em campanha. E ele sabe seduzir. Se quase conquistou Cristo, que falar de nós, reles vaidosos que sequer tivemos a dignidade de aceitar nosso fim?
Jesus não cedeu às tentações dele. Mas ele, agora, usa seu nome para atrair seus irmãos. É possível que, num repente de indignação com tamanha falsidade ideológica, Cristo tenha interrompido sua taça de vinho e pedido ao Pai para vir limpar sua honra. Pedido negado. Deus lhe serviu mais uma desaconselhável dose de Merlot enquanto lembrava: “livre arbítrio, meu filho.”
Mas Cristo insiste. Estão lhe sabotando nas igrejas, na Sua casa, Pai, ele protesta. E citou que defendem armas depois das preces… Jesus continuava a arrolar as heresias. Deus, com a sabedoria de quem tem milhões e anos, só lhe pedia resiliência. É possível que tenha confessado que Sua maior criação não fora perfeita. Os homens erram com consciência do erro, teria dito decepcionado. Interrompeu o assunto.
Eu, embora minha incredulidade, não duvido de mais nada depois que a Damares foi eleita e com o Pazuello como deputado federal.
As fakes news só podem ser obra do ódio a querer vencer.
Deus, se isso tudo for o derradeiro teste, saiba que escolho o amor.
*Delmar Bertuol é professor de história da rede municipal e estadual, escritor, autor de “Transbordo, Reminiscências da tua gestação, filha”
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