Fractais e caos: Arrogância e simplicidade
Aqui estamos numa fronteira dada pela prisão cartesiana da razão, a fronteira entre a racionalidade e a sensibilidade. Em Moore, ela o encarcera, em Cages (Jaulas), Mckean encarcera seus personagens, admirando sua humanidade
Eduardo Bonzatto*
Comecei a colecionar quadrinhos ainda muito novo. Primeiro foram as revistas com histórias nacionais como recreio, o clubinho, mas logo que comecei a ler precocemente os rebeldes filósofos ainda nos anos 70, cheguei aos quadrinhos europeus e o primeiro deles foi Corto Maltese. Foi uma revelação que a literatura que eu consumia pudesse ser encontrado na virtuosa aliança com as narrativas gráficas, com uma arte de encher os olhos.
Nunca gostei de super-heróis americanos, até um dia que uma namorada que era editora da Abril me deu uma revista com uma enfática recomendação, leia isso sem preconceitos. Era um encadernado do Cavaleiro das Trevas e quando terminei a leitura pensei, caramba, e não é que americanos também sabem contar histórias gráficas com talento?
Preciso dizer que a minha geração, lá na juventude, nutria um antiamericanismo nada forçado. Acreditávamos tanto na influência que tiveram na ditadura militar quanto numa vulgaridade cultural que me tornou monoglota, pois era o inglês que a escola ensinava e recusei a aprender uma língua tão chula.
Mas por conta do presente que ela me deu, passei a frequentar uma banca de jornal de dois irmãos angolanos foragidos da guerra civil em seu país de origem. Nunca me perturbou que fossem brancos nascidos em Angola. Me tornei próximo deles nas visitas.
E foi ali que comecei a ler Watchmen do Alan Moore, em fascículos ansiosamente aguardados. Não posso descrever como aquela obra me impactou, pois se com o cavaleiro das trevas tinha alterado minha forma de ver os quadrinhos, com Watchmen a literatura definitivamente se alojava nessa forma que eu sempre considerara superior pelas minhas leituras dos quadrinhos europeus.
Claro que quando meus amigos angolanos me apresentaram a obra seguinte de Moore eu não pestanejei: Big Numbers vinha no rastro da grandiloquência em que se transformara Moore com sua obra magna.
Eu que tinha tangências com os escritores rebeldes da literatura, recebi a nova obra dele como uma forma de rebeldia ainda mais ousada.
As informações sobre a saga de Big Numbers estão acessíveis.
Big Numbers é uma história em quadrinhos inacabada do escritor Alan Moore e do artista Bill Sienkiewicz. Em 1990, o selo de curta duração de Moore, Mad Love, publicou duas das doze edições planejadas. A série foi escolhida pela Tundra Publishing de Kevin Eastman, mas a terceira edição concluída não foi impressa, e as edições restantes, cuja arte seria tratada pelo assistente de Sienkiewicz, Al Columbia, nunca foram concluídas.
A obra marca um afastamento, por parte de Moore, do gênero ficção, na esteira do sucesso de Watchmen. Moore tece a matemática em uma narrativa de mudanças socioeconômicas forjadas pela construção de um shopping center por uma corporação americana em uma pequena e tradicional cidade inglesa e os efeitos das políticas econômicas da administração de Margaret Thatcher na década de 1980.
As duas primeiras edições foram produzidas pela editora independente de Alan Moore, Mad Love, com roteiro de Moore e arte de Bill Sienkiewicz. No entanto, a carga de trabalho para os quadrinhos era intensa e Sienkiewicz estagnou. No momento em que ele desistiu da série, a terceira edição ainda estava incompleta e o aumento das despesas prejudicou a produção. Kevin Eastman, criador de Teenage Mutant Ninja Turtles, interveio e tentou fazer com que sua empresa Tundra Publishing publicasse Big Numbers. Moore e Eastman pediram ao assistente de Sienkiewicz, Al Columbia, para se tornar o único artista da série e Roxanne Starr para ser a letrista. Columbia trabalhou na quarta edição, mas, por razões que permanecem obscuras, destruiu sua própria arte e abandonou o projeto também. Big Numbers #3 e #4 nunca foram publicados, e a série permanece inacabada.
Em 1999, dez páginas da arte de Sienkiewicz para Big Numbers #3 foram publicadas na primeira (e única) edição da revista Submedia. Em 2009, uma fotocópia da arte completa com letras para Big Numbers #3 apareceu no eBay. O comprador contatou Moore e, com sua permissão, publicou scans da arte no LiveJournal.
Moore anunciou a série quando sua popularidade estava no auge. O sucesso de Watchmen fez dele um escritor famoso. Moore queria se afastar do gênero ficção; Big Numbers não deveria ter gênero e lidar com temas de compras e matemática.
Mad Love enfrentou uma série de dificuldades: os rendimentos da AARGH! foram doados para a defesa dos direitos homossexuais; os custos de produção de Big Numbers eram altos; e o relacionamento poliamoroso de Moore com a esposa Phyllis e sua amante Debbie Delano se desfez. A Tundra Publishing de Kevin Eastman concordou em publicar o restante da série.
A arte detalhada de Sienkiewicz consumia muito tempo para ser produzida. Ele contratou Al Columbia, de 19 anos, como assistente, mas as pressões do projeto combinadas com questões pessoais o levaram a sair da Big Numbers após a publicação da segunda edição. Ele desenhou toda a terceira edição que nunca foi impressa. Sienkiewicz desenhou cada página e figuras para todas as três edições e também fez várias capas pintadas/multimídia para edições futuras que nunca foram impressas. Jon J Muth e Dave McKean estavam entre os nomes como substitutos.
No final das contas, o trabalho coube ao inexperiente Columbia. Tundra tentou promover Al Columbia publicando sua primeira história em quadrinhos independente, Doghead, em 1992, e lançou um pôster desenhado por Columbia para Big Numbers. A pressão acabou sendo demais para o jovem artista, que dizem ter destruído a arte da quarta edição em 1992, e não foi ouvido novamente até a publicação de The Biologic Show em 1994.
Situado na fictícia cidade inglesa de Hampton, o livro explora as mudanças socioeconômicas trazidas pela globalização em uma comunidade insular, representada pela construção de um shopping center por uma grande corporação americana. Enquanto isso, a comunidade também sofre pressão das políticas econômicas da primeira-ministra Margaret Thatcher, incluindo cortes nos cuidados de saúde e assistência social.
Cada página é disposta em uma grade rígida de doze painéis. Os balões de fala totalmente brancos são circulares, em vez da forma mais comum.
Em uma entrevista de 2001, Moore indicou que não acreditava que Big Numbers pudesse ser concluído como quadrinhos. No entanto, ele falou sobre a possibilidade do quadrinho ser adaptado para série de televisão pela Picture Palace Productions, já que tinha toda a história mapeada em uma folha A1, e cinco episódios escritos.
Um relato do desenrolar do projeto Big Numbers está incluído na história em quadrinhos de 2001 de Eddie Campbell, Alec: How to Be an Artist.
Alan Moore é um controlador absolutista. Sua racionalidade pretensamente superior, principalmente depois que Watchmen o consagrou e o afastou de uma juventude de desemprego e inutilidade em que toda uma geração que o modelo de desindustrialização neoliberal havia arremessado os moradores dos velhos bairros operários ou as cidades industriais como Northampton em que nascera. Finalmente ele estava provando a superioridade cultural de pensador operário emulando outros escritores ingleses como os socialistas HG Wells e GK Chersterton, mas também o antidemocrático e proto fascista DH Laurence para entender as motivações mais escancaradas do poder que parecia caracterizar a figura de Margareth Thatcher.
Leia aqui todos os textos de Eduardo Bonzatto
Sua autoafirmação de superioridade atingiu as alturas com Big Numbers. Vejamos o que diz o artista Bill Sienkievitz:
“Fractais é um jeito de compreendermos que existe um ritmo e uma fórmula para o Caos; que há uma ordem nele. Se você tem um padrão de onda cerebral que é rítmica e outra desconexa, qual você preferiria? Presumo que a primeira, à primeira vista. Mas se pensarmos direito, a outra, a caótica, seria a correta. Porque a mente e a memória são fractais por excelência, elas não seguem uma linha reta, uma aparente ordem, uma sequência… Por exemplo, quando você pensa na primeira vez que teve um cigarro aceso em seus dedos, que foi num jogo de futebol que assistiu, aí você se lembra de um dia chuvoso, depois num acidente que você presenciou quando tinha 13 anos…e por aí vai, de associação em associação, de forma lógica ou ao acaso. A coisa não funciona digamos, sob controle, cronologicamente, ordenadamente. É aos saltos e, para isto, para a nossa mente trabalhar assim, é preciso que exista o Caos e, simultaneamente, alguma espécie de ordem. O coração e os pulmões são rítmicos, mas a mente é caótica. E quando você toma alguma coisa, como cocaína, ela faz a mente ficar rítmica e o cardiorrespiratório virar um caos…Tudo se espalha em volta. E é disto que estamos tentando tratar em Big Numbers”.
“É baseado numa narrativa dentro da história, que mostra que, por mais que as coisas se modifiquem, elas permanecem as mesmas. Temos 45 personagens, cada um com sua história pessoal e quero que as pessoas realmente se importem com elas, mas que, ao mesmo tempo, a estória seja o foco maior de suas atenções. Depois de ter feito minha própria graphic-novel Stray Toasters, agora eu quero que os leitores abracem a vida como algo afirmativo e não como uma coisa que está se esgarçando irremediavelmente. Que se inteirem que tudo é uma questão de conexão, de ligação entre todos nós…Eu realmente amo as pessoas ”.
Mas vamos às próprias explicações de Alan Moore sobre os Fractais, bem mais pretensiosas que as de Bill.
“A melhor maneira de descreve-los é através de exemplos palpáveis. Se você tem uma folha de papel e risca uma linha nela, em termos matemáticos esta linha tem só uma dimensão, é unidimensional. Ignora-se a sua largura e consideramos somente seu comprimento. Agora, se você começa a ziguezaguear esta linha pela folha de papel, você cobrirá mais superfície do papel, podendo chegar até mesmo a cobri-la inteiramente. Chegaremos então ao ponto em que a linha continua unidimensional, mas não totalmente. E se ao mesmo tempo não é bidimensional, ou seja, continua não tendo uma largura, podemos dizer que ela é de uma dimensão-e- meia. O mesmo se aplica a uma folha de papel, esta sim, bidimensional – tem largura e comprimento. Se a embolamos na mão até formar uma bola – e bolas são sólidos tridimensionais, com largura, comprimento – teremos na verdade um objeto de duas dimensões que foi forçado a quase ser tridimensional. Portanto podemos dizer que aquela bola de papel é de duas-dimensões-e-meia. Assim que você consegue entender este conceito de meias dimensões, de frações de dimensões, isto nos abre toda uma nova área de Geometria possível. As pessoas que começaram a explora-la, estão concluindo que as equações que abordam essas dimensões fracionadas, geram estas novas formas peculiares chamadas Fractais. E daí a perceberem que muitas das formas encontradas na natureza, ao acaso, são perfeitamente idênticas àquelas geradas em seus computadores, foi um pulo. E tudo isto nos indicando que aquilo que considerávamos até então casual, caótico e turbulento, é de fato expressão perfeita de uma forma mais elevada de Geometria que não tínhamos condição de perceber antes”.
“Veja as nuvens, por exemplo. Suas formas parecem ser completamente caóticas, imprevisíveis, mas quando observadas sob a ótica da Matemática Fractal, o Caos assume um diferente significado, mostrando que há diferentes caminhos para se observar matéria e acontecimentos. E isto está contribuindo até mesmo para reverter a nefasta tendência contemporânea à especialização máxima. Cada vez mais e mais gente sabe mais e mais sobre menos e menos. Até que todos saberão tudo sobre nada…”
“Com os Fractais todos percebem que tudo está conectado, Meteorologia, Economia, Biologia…tudo tem muito em comum. Cessa o desejo da especialização. O melhor a fazer é estudar quanto mais campos for possível”.
“Foi o que o próprio Mandelbrot fez. E é o que pretendemos fazer com Big Numbers, mostrar um novo jeito de perceber o nosso derredor”.
Alan Moore acredita que fomos apanhados num estágio tal de caos e turbulência que não acontecia desde que a Era Industrial suplantou à Agricultural. E afirma que Big Numbers não é uma obra niilista, mas sim até mesmo otimista, “pois ela tornará claro que é possível lidar com tudo isto se temos os métodos corretos”.
E continua: “A sociedade se encontra meio aflita porque as coisas estão acontecendo cada vez mais rápido, levando o Caos aos nossos sistemas políticos, econômicos, vidas emocionais e nas nossas relações interpessoais. Estamos agora no olho do turbilhão entre a Era Industrial e o “Por Vir”. Na Matemática fractal é um conceito bem aplicável aí, o chamado Período de Fase de Transição. Por exemplo: se você fosse um alienígena, olhando para um lago, nunca conseguiria prever as propriedades do vapor. Isto se dá porque o que acontece entre a água e o vapor é um ponto de Fase de Transição. Um ponto de intensa e incrível turbulência, quando uma coisa deixa de ser ela própria, mas ainda não é a outra. Com a água obviamente isto acontece quando ela começa a ferver. Com Big Numbers o que pretendo é captar uma fração de todo este vapor, calor e água em ebulição, uma fração da sociedade quando ela atinge este ponto de fervura, e tentar fazer um juízo disto”.
Big Numbers não tem uma estória usual, não é um “suspense”, mas sim uma colcha de retalhos das estórias de cada personagem, de uma comunidade tipicamente interiorana da Inglaterra (sob a ditadura da dama-de-ferro, Margareth Thatcher) afetada em seu dia a dia pela construção de um leviatanesco Shopping, ícone maior do capitalismo turbinado, justo em seu cerne. Se isto não é acessibilidade, me diga então o que é.
E Alan continua: “O Shopping nos permite tratar de uma comunidade em crise”. Nada impactante e dramático somente pelo dramático, mas paulatino e sutil. Se você ver uma comunidade sendo erodida, isto te conscientiza de como ela está mudando e nós precisamos de um agente de mudança na história. E com a atual predominância da chamada “geração-Shopping”, acho que fizemos uma boa escolha. Tanto que, naquela enigmática forma com que a vida imita a arte, justamente a área de Northampton que escolhemos como cenário para a nossa estória, já está toda tomada por cadeias de lojas a la Toys R Us.
“O Shopping é o verdadeiro emblema do pico da era industrial. É a representação do que uma sociedade comercial só poderia terminar: um bando de zumbis andando para lá e para cá, hipnotizados pelos anúncios luminosos, visual clean de inox-polido- neon-e-vidro, consumindo compulsivamente”.
“Mas, não penso que este será o fim da Civilização. Certas correntes, seja na Tecnologia, Ciência, Arte, e mesmo na vida, corações e mentes das pessoas, reverterão esta tendência. Como eu disse antes, o mundo está mudando de forma incrivelmente acelerada e ninguém é capaz de prever ao certo no que isto irá dar. Mas em Big Numbers eu tento ao menos mostrar esta fase de transição, o momento da fervura”.
“É muito engraçada, risível até”- enfatiza Moore – ” uma verdadeira comédia, que não deixa de ser trágica em certos pontos, como a vida. A nossa inspiração provém de autores como Alan Bleasdale e Alan Bennett, que podem dizer coisas de partir o coração de uma forma realmente açambarcadora e engraçada. Eles conseguem expor incomensuráveis e pungentes dramas humanos de forma simples e direta. E é neste território que eu pretendo que Big Numbers se desenvolva, no qual você tem simultaneamente toda a riqueza da comédia e da tragédia da nossa mundana existência”.
“Por uma certa ótica também, Big Numbers tentará fazer com que os leitores de Quadrinhos se conscientizem de que não é preciso ser mordido por uma aranha radiativa ou nascer com um gene mutante, para ser interessante. De que cada pessoa a sua volta é tão ou muito mais instigante do que qualquer super-humano de collant. Super Heróis são personagens planos, unidimensionais, tigres de papel. Vigilantes psicóticos demandam quase nenhuma motivação, não têm a riqueza e a complexidade de uma pessoa que você encontra num ponto de ônibus”.
“Mesmo a ideia de escapismo per si – motivação maior dos Quadrinhos, Cinema, etc. – eu já abominava quando escrevia O Monstro do Pântano. E agora, mais do que nunca, é tempo de ser perguntar: Por que Super Heróis em primeiro plano? Por que não ir direto ao ponto? Estou completamente fora dos gêneros Fantasia & Ficção Científica, pois atingi aquele estágio no qual o Mundo real parece ser tão fabuloso, fascinante, intrincado e maravilhoso que é até um insulto à realidade tentarmos inventar qualquer coisa…”
Por essas palavras podemos medir a auto importância que Moore se colocou no desafio de criar Big Numbers. Certamente essa foi uma das razões do fracasso e da incompletude da obra.
Dez anos depois desses eventos, Dave Mackean que havia sido cogitado para desenham Big Numbers e que certamente ficou incomodado de ser preterido, resolveu assumir a tarefa com construir despretensiosamente seu próprio universo do caos e dos fractais. Sua obra maior nesse sentido foi CAGES.
Oito anos em construção. McKean é um artista com algo importante a dizer. Em Cages, ele criou um microcosmo totalmente realizado, um mundo que consiste em uma rua, uma boate e um prédio de apartamentos. Com isso, McKean tem um meio de comentar sobre mitologia, arte, Deus, criação, sexo, amor e ódio. Para McKean, Cages é “o mais próximo que cheguei de descrever meu mundo”. E Cages é um mundo lindo.
Cages é uma história em quadrinhos escrita e desenhada por ele, publicada originalmente em dez capítulos entre 1990 e 96. A série ganhou dois Harvey Awards nos Estados Unidos e um Fauve d’or de melhor história em quadrinhos estrangeira no Festival Internacional de la bande dessinée d’Angoulême na França. Cages foi publicado na Itália pela Edizioni Macchia Nera em 1998 e posteriormente coletado em volume único pela Edizioni Magic Press.
A história parte de um enredo nu e essencial, o entrelaçamento das vidas de um pintor, um escritor e um músico. A partir desse ponto de partida, a história se transforma gradualmente em uma alegoria que McKean usa para abordar vários temas, incluindo arte, inspiração e vida de artistas, fé, criatividade e gatos. Aplica com facilidade a teoria dos fractais e a teoria do caos para indicar as aspirações de Moore, em que “a Teoria do Caos é um padrão de organização dentro de um fenômeno desorganizado, ou seja, dentro de uma aparente casualidade”.
“O estudo da desordem organizada (teoria do caos) foi proposto pelo meteorologista Edward Lorentz. Ele desenvolveu um modelo que simulava no computador a evolução das condições climáticas. Indicando os valores iniciais de ventos e temperaturas, o computador se encarregava de fazer uma simulação da previsão do tempo. Em suas simulações, Lorenz imaginava que pequenas modificações nas condições iniciais acarretariam alterações também pequenas na evolução do quadro como um todo. Mas o que ele obteve de resultado foi o contrário, as pequenas modificações nas condições iniciais provocaram efeitos desproporcionais”. E aqui ocorre a fusão da teoria do caos com a teoria dos fractais, em que pequenos movimentos geram grandes transformações (efeito borboleta).
Grande parte do cartum é feito em desenho a caneta, inspirado na arte de Egon Schiele; com base nisso, porém, McKean enxerta variações com diferentes estilos e técnicas, como aquarela, aerógrafo, xilogravura, com referências ao estilo de Bill Sienkievicz, José Muñoz e Lorenzo Mattotti.
A finalização da obra consiste numa aplicação das teorias que tanto encantaram Moore, mas com as quais ele não conseguiu prosseguir, demonstrando bem a diferença entre um artista pleno de suas possibilidades e a arrogância intelectual árida que marca os pretenciosos.
Afinal, podemos ler Cages, mas não podemos ler Big Numbers.
Aqui estamos numa fronteira dada pela prisão cartesiana da razão, a fronteira entre a racionalidade e a sensibilidade. Em Moore, ela o encarcera, em Cages (Jaulas), Mckean encarcera seus personagens, admirando sua humanidade.
*Eduardo Bonzatto é professor da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB) escritor e compositor
➥ Quer receber as notícias do Pragmatismo pelo WhatsApp? Clique aqui!