Coronel Mauro Cid, não se esqueça dos que podem voltar a tocar o apito de cachorro
A cachorrada do 8 de janeiro não é o grande perigo para a democracia. Os que continuam nos ameaçando são os que se encolheram mas estão, ainda impunes, com o apito na gaveta
Um mané do 8 de janeiro, inconformado com o uso de tornozeleira, já ficou famoso com o vídeo em que ataca o Supremo e se queixa da falta de libido e até de forças para rezar. Considera-se um perseguido.
“Podem vir pra cima de mim”, avisa o sujeito. O que o pequeno golpista diz sem volteios e sutilezas é o que muitos grandes golpistas disseram depois da eleição e antes do 8 de janeiro às vezes com alguns cuidados.
O mané chorão do vídeo é apenas um dos ouvintes do apito de cachorro. Os golpistas que faziam malabarismos para atiçar a turba eram os que tocavam o apito.
Generais, empresários e até um ministro do TCU tocaram o apito para a cachorrada. Esses não vão produzir vídeos, como o mané da tornozeleira, porque nem tornozeleira usam. Ainda não.
Um tocador do apito do golpe pediu aos fiéis que mantivessem a fé. Outro foi para um restaurante de beira de estrada para dizer que não desistissem porque ainda dava. O apito informava apenas que ainda dava.
Tudo acontecia depois da eleição de Lula. Um tocador de apito mais descarado avisava que havia forte movimento na caserna, com desenlace imprevisível para a nação. Mas Bolsonaro tinha o controle da situação. Acovardado no Alvorada, mas com o controle.
Um famoso líder empresarial do agro é pop, do tempo da ditadura, chamou a manezada em vídeo para que acampasse na frente dos quartéis.
Esse foi explícito, direto, por confiar em quem havia dado a ordem para a convocação e ter certeza do golpe. Todos os tocadores de apito atacavam o STF, as urnas e a eleição e diziam temer o comunismo.
Mas muitos bom de bico não tocaram o apito, apesar de convocados pelos militares e por Bolsonaro. Esse podem contar um dia detalhes da ordem que receberam.
Mauro Cid conhece os que tocaram e financiaram apitos e os que se negaram a tocar. Os que se recusaram a chamar a turba serão convidados, quando a democracia for restabelecida por completo, a falar do que sabem. Por que não tocaram o apito do cachorro?
Por que não mandaram mensagens de zap aos tios golpistas? Por que não foram para churrascarias de beira de estrada, fantasiados de verde e amarelo, para dizer que ainda dava?
O país merece ter acesso às revelações dos que foram convocados, negaram-se a tocar o apito, mas continuam por aí, podendo ir para um lado ou outro, dependendo do que acontecer mais adiante.
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Muitos dos que não apitaram para a cachorrada continuam, mesmo que ainda vacilantes, abertos à possibilidade de um dia apitar. Outros não apitaram e nunca apitarão.
O sujeito com tornozeleira, que não reza e nem transa mais, é o mané sequelado e revoltado, talvez de uma maioria que não se submete à resignação. Mas é um mané. Ele quer ouvir o apito de novo.
Os que tocavam o apito, principalmente os que têm poder econômico, estão quietos. Alguns terceirizavam suas missões com apitadores-laranjas.
Outros já disseram, depois de derrotados, que estão no mesmo avião com Lula. Tenha a coragem de delatá-los, Mauro Cid. Diga quem são e como integravam a copa e a cozinha de Bolsonaro.
A cachorrada do 8 de janeiro não é o grande perigo para a democracia. Os que continuam nos ameaçando são os que se encolheram mas estão, ainda impunes, com o apito na gaveta.
São grandes empresários fascistas, jornalistas, blogueiros, influencers e picaretas em geral misturados a civis e fardados do Planalto.
Os que tocaram o apito continuam orando e transando numa boa, enquanto os manés-banzés mais sensíveis se desesperam. Vá em frente, Mauro Cid.
*Moisés Mendes é jornalista em Porto Alegre. É autor do livro de crônicas Todos querem ser Mujica (Editora Diadorim).
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